Quem paga essa conta?
Por Lia Calder e Thais Françoso
John e Jennifer tinham exatamente o mesmo currículo: experiências e qualificações idênticas, o que os diferenciava era apenas o nome que evidenciava o gênero de cada candidato à vaga. O estudo, que leva o nome dos personagens, realizado por Corinne Moss-Racusin, com 127 professores da Universidade de Yale, mostrou que mulheres com as mesmas qualificações curriculares que homens são vistas como menos competentes o que afeta, entre outros pontos, a oferta salarial.
Um dos fatores que contribui para esta leitura da competência é a carga do trabalho doméstico que pesa, consciente ou inconscientemente, no momento da contratação e da promoção de mulheres. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do IBGE, as mulheres gastam, em comparação com os homens, o dobro de horas semanais no trabalho doméstico e do cuidado com os familiares. O custo deste “trabalho invisível” é de 8,6% do PIB do nosso País.
Embora a discriminação em razão de gênero seja ilegal, é comum que mulheres sejam indagadas em entrevistas de emprego sobre filhos (existentes ou desejados) e seus cuidados, enquanto o mesmo não acontece com os homens.
No Brasil, desde 2023, as empresas estão obrigadas a apresentar o Relatório de Transparência Salarial. O último levantamento apontou que apenas 32,6% das organizações possuem políticas de incentivo à contratação de mulheres e que a diferença salarial entre homens e mulheres que ocupam a mesma posição ultrapassa 20%.
Como as empresas podem contribuir para mudar este cenário que impede a permanência e ascensão das mulheres no mundo do trabalho?
Letramento sobre a parentalidade e a divisão dos cuidados domésticos e familiares é o primeiro passo para atingir esses vieses inconscientes de preconceito e discriminação.
Muitas pessoas jamais tiveram qualquer contato com este tema e partem de uma ideia normalizada de que o trabalho doméstico deve, necessariamente, recair sobre as mulheres.
Representatividade feminina em cargos de liderança e práticas de apoio à parentalidade, como a concessão de uma licença paternidade ampliada e remunerada, também são um bom caminho para diminuir os impactos negativos que a maternidade tem na carreira das mulheres.
No final de 2023, o Supremo Tribunal Federal estabeleceu prazo de 18 meses para que o Congresso Nacional regulamentasse a licença paternidade, já que os 5 dias concedidos desde 1988 deveriam ser provisórios, até nova regulamentação do Congresso, o que até hoje não aconteceu.
Mesmo sem uma regulamentação, é crucial que as empresas repensem estes modelos de apoio à parentalidade, bem como que tragam a discussão para dentro das organizações, o que beneficia não só o ambiente corporativo, mas toda a sociedade.