Meu pirão primeiro
Por Lia Calder e Thais Françoso
Salvo raras exceções, dificilmente posicionamentos contrários à luta pela igualdade ou ao combate de preconceitos e discriminações são bradados aos quatro ventos. Mas bastam que surjam as primeiras iniciativas que buscam a inclusão de mulheres, negros, pessoas com deficiência, integrantes da comunidade LGBTI+ ou outros grupos minorizados para estas manifestações emergirem.
Há um abismo profundo entre as falas que demonstram a consciência acerca das desigualdades e discriminações presentes no nosso País e o efetivo apoio aos mecanismos que dão conta desta disfunção. Por exemplo, no Brasil, nove anos após a adoção da Lei de Cotas Raciais no Ensino Superior, tivemos pela primeira vez na história uma composição equilibrada entre negros e não negros neste nível educacional. Apesar da inequívoca aceleração da igualdade por meio das ações afirmativas, 41% dos brasileiros, segundo o Datafolha, criticam o critério racial da lei.
O apoio aos temas de desigualdade de raça e gênero, como o inconformismo aos relatos de assédio que as mulheres vivenciam no mercado de trabalho ou à discriminação que ceifa o acesso de pessoas negras aos postos de liderança, muitas vezes não se converte em apoio efetivo às iniciativas que buscam corrigir essas desigualdades e preconceitos, inclusive, contrariando a nossa Carta Constitucional. É “o meu pirão primeiro”.
A garantia de oportunidades universais e representatividade nos espaços de poder enfrentam uma enorme barreira: a concentração de privilégios dos quais goza um grupo demográfico, social e economicamente muito pequeno.
Não há avanço social sem tensionamento. E o mesmo acontece nas empresas. Mudanças no ambiente organizacional tradicionalmente geram resistências em todos os níveis hierárquicos. Segundo recente artigo de Joana Story, Tatiana Iwai e Gustavo Tavares, publicado no periódico Organizational Dynamics, a implementação de planos para a redistribuição de espaços de poder é um dos principais fatores de resistência de empregados em relação às ações e programas de Diversidade e Inclusão (D&I).
Segundo o artigo, três são as ameaças centrais que despertam nos grupos dominantes uma aversão à promoção da igualdade e ao combate a discriminações explícitas ou implícitas:
● o medo em perder recursos e oportunidades;
● o receio sobre os impactos de novas normas e expectativas organizacionais
● e a percepção de um “ambiente injusto” para pessoas que pertencem ao grupo dominante.
Reconhecer e manejar essas resistências dos grupos dominantes é o ponto central para avançar na eficiência dos programas de D&I, atingindo maior equilíbrio dos espaços organizacionais e garantindo geração de valor e oportunidades para as empresas e pessoas.