Comportamento

China vive mais uma epidemia: crianças são as vítimas principais; confira

Surto de doenças respiratórias acende alerta da Organização Mundial de Saúde. Em Pequim, hospitais pediátricos estão sobrecarregados com casos de pneumonia misteriosa. No Brasil, médicos explicam que situação é isolada

Crédito: Jade Gao

Novembro de 2023: crianças lotam hospitais diante do aumento de infecções bacterianas (Crédito: Jade Gao)

Por Elba Kriss

O surto que teve início em outubro último culminou em hospitais lotados na China. Pequim e a região norte do país enfrentam atualmente um aumento de casos de doenças respiratórias, principalmente em crianças.

Os relatos são de:
• febre,
• inflamação pulmonar sem tosse,
• e, o mais grave, nódulos pulmonares.

Na província de Liaoning, a televisão local exibiu filas de doentes recebendo soro intravenoso. Em Zhejiang, o Hangzhou First People’s Hospital atendeu a uma multidão no pronto-socorro. O drama se repete em outras regiões e, em algumas delas, os ambulatórios não comportam novos pacientes.

A questão alarma autoridades locais e a comunidade internacional com o temor de que a elevação de enfermos esteja atrelada a algum novo vírus — em 2019, a cidade de Wuhan foi o epicentro da Covid-19.

A crise fez a Organização Mundial de Saúde (OMS) pedir mais informações ao governo chinês sobre o que foi chamado de “surto de pneumonia”. Em resposta, o Ministério da Saúde da China afirmou que não há “registro de nenhum patógeno novo ou incomum”.

Especialistas explicaram os contágios como consequências de agentes já conhecidos, como:
influenza,
pneumonia por Mycoplasma pneumoniae — infecção bacteriana comum que afeta tipicamente crianças —,
vírus sincicial respiratório (VSR),
e Sars-CoV-2, o responsável pelo coronavírus.

A OMS, por sua vez, emitiu comunicado de que não é preciso pânico. “A razão pela qual estamos vendo esse fenômeno é a suspensão das restrições da Covid-19 há aproximadamente um ano. Esta é a primeira época de outono e inverno na região. A China vive nesse momento o que muitas nações viveram há um ou dois anos. Portanto, não há relatos de doenças não diagnosticadas em crianças”, declarou Maria Van Kerkhove, epidemiologista da OMS. “Essa situação não é maior do que o que se viu antes da pandemia, nos anos de 2018 e 2019. É o que se espera no início desses meses mais frios.”

Maria Van Kerhove, da OMS (Crédito:Divulgação)

“A China vive nesse momento o que muitas nações viveram há um ou dois anos. É o que se espera no início dos meses mais frios.”
Maria Van Kerhove, epidemiologista da OMS

É o que afirmam especialistas ao redor do mundo de olho nos índices epidemiológicos no populoso continente. Há uma explicação coerente para o que acontece no país asiático: os três anos de medidas de restrição baixaram os níveis de imunidade da população contra os vírus sazonais.

“Em anos de menor exposição alguns aumentos de infecções podem estar associados, sim, ao fato de as crianças terem circulado minimamente, tido pouco contato com diversos vírus e desenvolverem menos imunidade no período da pandemia”, explica o infectologista João Prats, da Beneficência Portuguesa de São Paulo. “No Brasil, tivemos um surto de escarlatina, por exemplo”, lembra. A doença contagiosa citada por ele costuma ocorrer nos pequenos em idade escolar.

Província chinesa registra novas internações: autoridades afirmam que não há “vírus incomum” (Crédito:CFOTO / NurPhoto)

Apesar do aviso para evitar o pânico generalizado, o governo chinês impôs a volta do uso de máscaras e o isolamento social. A vacinação em crianças e idosos também foi reforçada.

A OMS, igualmente, fez recomendações aos cidadãos: a orientação é para “ficar longe de pessoas doentes, permanecer em casa quando estiverem enfermos, fazer testes, receber cuidados médicos necessários, usar máscara quando apropriado, manter boa ventilação e lavar as mãos regularmente”.

“O hemisfério norte entrará no inverno, época em que temos maior circulação de vírus e bactérias em ambientes fechados. Precisamos ter atenção especial, como a OMS pede”, considera o infectologista Silvio Bertini, coordenador do Hospital Regional Santa Cruz.

A indicação de cautela não é sinônimo de preocupação por uma contaminação em escala mundial, como no tempo de isolamento. “É uma situação ainda concentrada na China. No Brasil, tivemos aumento de infecções por vírus sincicial respiratório, que geralmente provoca sintomas leves e semelhantes ao resfriado, e o Metapneumovírus, semelhante ao sincicial, que causaram crescimento significativo das alterações respiratórias nos meses de maio e junho”, aponta Bertini.

Segundo boletim da Fiocruz, o VSR é a principal causa de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) no País em 2023: foram 62.406 casos.

Simone Fernandes, médica da rede dr.consulta, comenta o que vê nos consultórios. “O que explica essa elevação por aqui é o descaso com os cuidados recomendados de prevenção, como vacinação e higiene, e o não isolamento de pessoas sintomáticas, somado ao período de sazonalidade dessas infecções”, alerta.