Comportamento

Ensino médio: saiba o que muda no projeto do governo

Após críticas, manifestações, pedido de revogação e, por fim, consulta pública, o Governo Federal encaminha ao Congresso projeto de lei que muda o Novo Ensino Médio. Entre estudantes, a sensação é de vitória e preocupação: como serão os próximos anos?

Crédito: Rafael Lasci

Política Nacional do Ensino Médio: aumento da carga horária mínima e retomada de todas as disciplinas obrigatórias (Crédito: Rafael Lasci)

Por Elba Kriss

Alvo de protestos e consulta pública, o Novo Ensino Médio segue em reestruturação. Às vésperas do fim do ano letivo, o Governo Federal enviou ao Congresso um projeto de lei com mudanças em suas regras. O texto atual substitui o formato anterior, tão criticado por estudantes, educadores e especialistas por desigualdades e precarização do ensino nas escolas públicas. Ajustes de deficiências são celebrados, mas paira no ar a preocupação de como serão os próximos anos em sala de aula.

O Ensino Médio foi reformado em 2017 e começou a vigorar na gestão de Jair Bolsonaro. A ideia era de uma organização curricular, com diferentes alternativas aos estudantes, os denominados itinerários formativos, com foco nas áreas de conhecimento e na formação técnica e profissional.

O que se viu na prática foi a redução de disciplinas clássicas, como História, Física e Química, por exemplo. Brasil afora, instituições flexibilizaram suas grades curriculares.

Na rede pública, surgiram cursos desconexos da realidade e aulas, acredite, de RPG, de Como Fazer Brigadeiro Caseiro e Cimento — sim, cimento. Jovens foram às ruas para pedir a revogação do sistema, e o problema caiu no colo de Luiz Inácio Lula da Silva.

Há duas semanas, o Ministério da Educação, enfim, formulou documento com as novas diretrizes.

“Na busca pelo consenso, o que nos une é a certeza de que nossa juventude merece mais oportunidades, com ensino médio atrativo e de qualidade”, disse o ministro Camilo Santana.

Jade Beatriz, presidente da Ubes: “A proposta é justamente fazer com que as diferenças entre a escola pública e privada sejam eliminadas” (Crédito:Rafael Kibaiasse)

Entre as principais mudanças: a Formação Geral Básica (FGB) volta a ter carga de 2.400 horas obrigatórias e disciplinas como Língua Portuguesa, Inglês e Espanhol, Artes, Educação Física, Matemática, História, Geografia, Sociologia, Filosofia, Física, Química e Biologia.

“Saem os itinerários formativos e entram os Percursos, que serão matérias profissionalizantes. E não aulas sobre brigadeiro caseiro ou bolo no pote.”
Jade Beatriz, presidente da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas

O que será ministrado nos tais Percursos de Aprofundamento e Integração de Estudos caberá ao Conselho Nacional de Secretários de Educação decidir.

“Isso será bom, pois haverá um alinhamento. Na reforma atual, um problema foi que cada escola teve um entendimento das diretrizes e fez um itinerário do que achava melhor”, avalia Ana Gardennya Linard, gerente de Políticas Educacionais do Todos Pela Educação. “Com esses Percursos discutidos pelos conselhos, teremos uma justa base para os estudantes. O aluno que sair de São Paulo para estudar em Manaus, por exemplo, terá a mesma oferta”, exemplifica ela.

Há outras alterações:
• cursos profissionalizantes deverão ter carga horária de 2.100 horas, com exigência de 800 apenas para formação técnica.
O PL também revoga a permissão de profissionais não licenciados, aqueles com reconhecimento de notório saber, do magistério.
• Além disso, o texto avança para a retirada da Educação a Distância.

Esses são pontos principais que dão base para a reforma da reforma. “Com ajustes e novas nomenclaturas, a essência da reforma original ficaria mantida: aumento da carga horária diária, diversificação curricular e maior integração com a educação profissional”, diz Olavo Nogueira Filho, diretor-executivo do Todos Pela Educação.

Para a organização, o Congresso tem agora a missão de melhorar a proposta. Há preocupações relevantes, como a ausência de um mínimo obrigatório de horas para a “parte diversificada” e a diferença de carga horária da FGB entre instituições regulares e técnicas. “Não é justo para um momento crucial de formação dos estudantes”, aponta Ana Gardennya.

“Na busca pelo consenso, o que nos une é a certeza de que nossa juventude merece mais oportunidades, com ensino médio atrativo e de qualidade.”
Camilo Santana, ministro da Educação

Enem prejudicado

O Sindicato dos Estabelecimentos de Educação Básica do Município do Rio de Janeiro questiona o retorno das antigas disciplinas — já que isso pode ser visto como retrocesso. A explicação é de que o repertório de muitas delas é datado dos anos 1970.

“Desde então, o mundo deu voltas, a internet se difundiu e trouxe novas demandas e desafios. Largos blocos de conteúdo perderam sentido. Tiveram o seu prazo de validade vencido na Educação Básica, devem ser endereçados para as graduações. Antes de se cogitar estabelecê-los, seria necessário atualizar ementas de cada uma dessas disciplinas”, defende a entidade, em nota.

De um modo geral, o PL é a bem recebido pelo Conselho Nacional de Educação, Fórum Nacional de Educação e Fórum Nacional dos Conselho Estaduais e Distrital de Educação.

Agora segue em tramitação, pois a depender dos próximos passos as mudanças podem estar em sala de aula somente em 2026.

“Pedimos que o PL seja votado em medida de urgência. Se isso acontecer até dezembro, no ano que vem já pode ser implementado”, informa Jade. A celeridade é em nome da atual geração, que enfrentou limitações nos últimos anos.

Os 3,9 milhões de brasileiros do Enem que o digam. “Esse ano o Enem foi, irremediavelmente, injusto. Diversas matérias foram retiradas da grade e muitos alunos, prejudicados”, lamenta Jade. Ela se une aos colegas, pois presta vestibular para Direito.