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Bolsonaro será indiciado ou tudo vai acabar em pizza?

Relatório da CPMI dos Atos do 8 de Janeiro pede o indiciamento de Bolsonaro e de outras 60 pessoas, inclusive nove generais. Mas documento apenas faz alusões a eventuais crimes — e pode ser arquivado

Crédito: Edilson Rodrigues

Presidente da CPMI dos Ataques Golpistas, Arthur Maia atuou para barrar diligências propostas pela relatora, Eliziane Gama (PSD) (Crédito: Edilson Rodrigues)

Por Gabriela Rölke

Embora tenha pedido o indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e de mais 60 pessoas por responsabilidade na depredação das sedes dos Três Poderes, no dia 8 de janeiro, o relatório final da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos Ataques Golpistas, aprovado na quarta-feira 18, tem tudo para dar em nada, como já aconteceu com o da CPI da Covid, arquivado em fevereiro de 2022.

Ocorre que o documento elaborado pela relatora da comissão, a senadora Eliziane Gama (PSD-MA), não apresenta comprovações dos eventuais crimes imputados aos denunciados, parte dos investigados calou-se ao prestar depoimento e os principais fatos foram relatados com base em apurações feitas pela Polícia Federal, cujos dados foram repassados ao colegiado, que, por seu lado, nada apurou de novo.

O ex-presidente nem sequer foi chamado a depor ou teve seus sigilos quebrados pela comissão. Além disso, o relatório será agora encaminhado à PF e à Procuradoria-Geral da República (PGR), a quem compete decidir se os denunciados responderão ou não pelos supostos crimes. A própria relatora diz que os investigadores “farão naturalmente o aprofundamento da investigação” e que “a denúncia caberá ao Ministério Público”. Trata-se, portanto, de mera sugestão.

Esperança

Mesmo assim, a relatora se diz “otimista” e aponta um “novo momento” na PGR — o mandato de Augusto Aras se encerrou em setembro, e o presidente Lula deve indicar um nome de sua confiança para o posto.

Além de Bolsonaro, a CPMI sugeriu o indiciamento de nada menos do que oito generais do Exército e do almirante Almir Garnier, ex-comandante da Marinha, que tiveram posições de destaque durante o governo Bolsonaro, quase todos hoje na reserva e que, segundo os parlamentares, tiveram participação na tentativa de golpe.

Além dos ex-ministros palacianos Walter Braga Netto, Augusto Heleno e Luiz Eduardo Ramos, o relatório também traz os nomes do ex-comandante do Exército Marco Antônio Freire Gomes e de Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa; além do ex-chefe do Comando Militar do Planalto Gustavo Henrique Dutra de Menezes, o único dos generais implicados na comissão que segue na ativa.

A CPMI pediu o indiciamento ainda de Carlos José Russo Assumpção Penteado e Carlos Feitosa, que eram do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), e do general Ridauto Fernandes, flagrado dando instruções a golpistas no dia da invasão dos palácios em 8 de janeiro.

O andamento dos trabalhos da CPMI foi marcado pela disputa entre os aliados do Palácio do Planalto e os da oposição, e o relatório final foi aprovado por 20 votos a 11. Ligada ao ministro da Justiça, Flávio Dino, a relatora Eliziane antagonizou em inúmeras situações com o presidente da comissão, o bolsonarista Arthur Maia (União), e viu frustradas suas tentativas de convocar o ex-presidente e de ter acesso a seus dados financeiros.

A partir de agora, o resultado da CPMI dificilmente terá desdobramentos, já que o governo Lula evita a todo custo entrar em conflito com as Forças Armadas e a cúpula militar procurou o ministro da Defesa, José Múcio, para reclamar que o Exército estaria sendo alvo de perseguição e vingança com a investigação.

Politicamente, contudo, o objetivo da comissão parece ter sido atingido. Afinal, parlamentares acabaram transformando o colegiado em palco para suas pretensões políticas no futuro.