Comportamento

A delicada reforma do aeroporto de Congonhas

Sob nova direção, aeroporto paulistano que atende 23 milhões terá que dobrar sua estrutura até 2028 com obrigação de preservar história e arquitetura

Crédito: Eduardo Knapp

Art déco: fachada e todo o terminal atual são tombados e deverão manter as características durante o trabalho de melhorias (Crédito: Eduardo Knapp)

Por Luiz Cesar Pimentel

Nos próximos cinco anos, o segundo aeroporto mais movimentado do País e que se tornou símbolo de São Paulo, Congonhas, passará por reformulação completa. A tarefa da vencedora da concessão por 30 anos, a espanhola Aena, vai além do projeto que contempla um novo terminal de passageiros, dobrando a área construída atualmente.

São três áreas essenciais do destino tombadas em 2011 pelo Conpresp (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio) que deverão ser preservadas: o atual Terminal de embarque e desembarque, que inclui saguão e fachada; o Pavilhão das Autoridades e um hangar de madeira dos anos 1950. Neles, além de estruturas, são listados no documento de tombamento 40 obras e elementos artísticos. Conservação, porém, não tem sido praxe nas concessões recentes na cidade.

“”O Pavilhão do Anhembi, concedido a empresa estrangeira [a francesa GL Events], está em demolição. No Pacaembu e no Ibirapuera, ambos sob concessão, identificamos conflitos entre projetos e preservação de valores relacionados à cidade e à cultura arquitetônica”, diz Raquel Schenkman, presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) e servidora do Departamento do Patrimônio Histórico (DPH).

No documento de tombamento de Congonhas, são especificados os valores urbanístico, histórico, arquitetônico e afetivo do local, apontando-o como “marco referencial na paisagem urbana” da cidade.

É atribuído ao aeroporto o desenvolvimento da região Sul paulistana, já que antes de sua operação a área pertencia a Santo Amaro, que não era anexada à capital. Além disso, estipula a arquitetura art déco da época que coincide com o período de ícones da cidade, como a fundação do MASP, antes da sede na avenida Paulista, do MAM e faculdades de arquitetura, nos anos 1940, e o Parque do Ibirapuera (1954). “Congonhas é do mesmo período de integração das artes. É seu símbolo”, diz Schenkman.

Por outro lado, o aeroporto carrega o crescimento descontrolado da cidade nas costas em 87 anos de operação. São Paulo tinha um milhão de habitantes quando foi fundado em área descampada e considerada distante (fica a 10km do centro da cidade).

Atualmente, é considerado perigoso justamente pela localização em área densamente povoada. Vale apontar dois acidentes nos últimos 20 anos – um em 1996, que vitimou 96 pessoas, e o segundo em 2007, o maior da história da aviação nacional, com morte de 187 passageiros e 12 pessoas em terra.

O desafio de consolidar reforma e preservação está com a Aena, que administra 80 aeroportos pelo mundo (46 na Espanha) e que venceu concessão para operar 11 no País, pela qual pagou R$ 2,4 bilhões. Até dezembro terá que entregar à Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) o projeto completo.

Raquel Schenkman, arquiteta, presidente do IAB e servidora do DPH (Crédito:Divulgação)

“As concessionárias precisam incorporar o valor cultural e das arquiteturas preexistentes como prática.”
Raquel Schenkman, presidente do IAB

“É nosso maior desafio no Brasil, uma operação complexa e de impacto em toda a malha aérea nacional. Vamos dar a Congonhas padrão de qualidade compatível com a relevância que tem”, diz Santiago Yus, diretor-presidente da Aena Brasil.

A sala de embarque, por exemplo, tornou-se insuficiente para a demanda – a estimativa é de que este ano receba 23 milhões de passageiros; Cumbica, em Guarulhos, atende 44 milhões anuais – e deverá ser ampliada em cerca de 70%, principalmente para melhorar o espaçamento entre os portões.

Banheiros terão que passar por melhorias. “São muito antigos”, afirma Marcelo Bento, diretor da Aena.

Outro planejamento para acontecer na primeira fase é um redesenho do acesso, dado o grande fluxo de carros na região, com atenção especial aos veículos de aplicativos.

Um dos ítens fora do projeto é o acesso de metrô ao local. Desde 2014, estava previsto um ponto da linha 17-ouro do transporte paulistano. As obras só recomeçaram no mês passado e a previsão mais otimista é de inauguração em 2026. A parte mais pesada vem na sequência, quando até 2028 Congonhas por contrato deverá ter um novo terminal de passageiros, que amplie a capacidade e ofereça mais conforto aos viajantes.

A missão é aumentar os atuais 12 pontos de embarque para 20, em construção paralela ao atual terminal que tende a dobrar a área construída. Também é obrigatória revitalização do sistema de decolagens e aterrissagens, já que a pista de taxiamento é mais próxima à de pouso do que permitem as normas internacionais.

Com as mudanças obrigatórias, Congonhas ganhará capacidade para atender estimados 30 milhões de passageiros por ano. Retomada de voos internacionais está no plano.

Carioca Santos Dumont viverá de pontes aéreas a partir do ano que vem

Com a nova resolução do Governo Federal, o aeroporto carioca Santos Dumont, contemporâneo a Congonhas e igualmente localizado em região central da cidade, passará a operar quase que exclusivamente para pontes aéreas com São Paulo (380km aéreos).

A norma definiu que somente serão autorizados voos em raio de 400 km e para aeroportos não internacionais. Assim, o local atenderá voos no estado e até Vitória, no Espírito Santo, para a qual foi dado um jeitinho, já que fica a 418km de distância.

Pousos no aeroporto carioca são famosos pela beleza; em 2024, quase todos virão de São Paulo (Crédito:Luiz Souza)

O objetivo é aumentar a utilização do Aeroporto Internacional Tom Jobim, conhecido como Galeão, na Ilha do Governador. Com o trajeto do centro que passa por pontos perigosos da cidade, a frequência do espaço permanece baixa.

Há ainda um movimento de políticos fluminenses que reivindicam a permanência de voos para Brasília. O Santos Dumont realiza em média 350 voos por dia e atende 15 milhões de passageiros anualmente. Congonhas tem um pouso ou decolagem a cada dois minutos e soma 530 voos diários.