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Entenda por que Collor pode se tornar inelegível pela 2ª vez

O ex-presidente escapou das investigações que se seguiram ao seu impeachment, mas foi condenado por desviar R$ 20 milhões em uma operação derivada da Lava Jato. Apesar da pena de reclusão em regime fechado, ele pode escapar da prisão

Crédito: Jefferson Rudy

CONDENADO Fernado Collor é o único ex-presidente a se tornar inelegível duas vezes, por situações distintas (Crédito: Jefferson Rudy)

Por Samuel Nunes

Na última quarta-feira, 24, o ex-presidente Fernando Collor de Mello conquistou, oficialmente, uma proeza difícil. Ele passou a ser o primeiro ex-chefe do Executivo a ficar inelegível em duas situações distintas, durante o período democrático. Novamente, o processo contra ele se refere a atos de corrupção. A nova inelegibilidade, após condenação no STF, está relacionada à sentença que recebeu por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Ele e outros dois réus foram acusados de desviar cerca de R$ 20 milhões da BR Distribuidora, antiga subsidiária da Petrobras, privatizada no governo Bolsonaro.

33 anos é apena de prisão pedida pelo relator, Edson Fachin

O processo foi baseado em depoimentos de delação premiada. O ex-presidente foi citado em depoimentos do doleiro Alberto Youssef, do dono da UTC, Ricardo Pessoa, e do ex-diretor financeiro da BR Distribuidora e ex-diretor da área internacional da Petrobras Nestor Cerveró.

Aos investigadores da Operação Lava Jato, foi relatado como funcionava o esquema de pagamento de propinas na estatal, que teria beneficiado Collor.

A condenação também representa outra situação atípica para o ex-mandatário. Enquanto vários políticos condenados na Lava Jato têm conseguido reverter as sentenças em favor próprio, Collor é um dos poucos que serão condenados e podem de fato cumprir pena.

Ferrari do ex-presidente é apreendida pela Polícia Federal em 2015 (Foto: Pedro Ladeira) (Crédito:Pedro Ladeira)

Na última quinta-feira, o STF ainda faltava o voto da presidente do STF, ministra Rosa Weber, mas sem a possibilidade de mudar o placar. Ainda era necessário definir a dosimetria das penas.

Apenas os ministros Kassio Nunes Marques e Gilmar Mendes defenderam a absolvição de Collor. Mendes aproveitou para criticar novamente a Lava Jato, o ex-juiz Sergio Moro e ex-coordenador da operação, Deltan Dallagnol, além do instituto da delação premiada. No dia 18, a Corte já havia formado maioria pela condenação.

O relator, ministro Edson Fachin, entendeu que Collor e os outros dois réus são culpados pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Fachin defendeu pena de 33 anos de prisão ao ex-presidente, inicialmente em regime fechado, além da inelegibilidade imediata.

R$ 20 milhões é quanto foi desviado da BR Distribuidora, segundo os ministros do STF

Apesar de condenado, Collor, que nega todas as acusações, e os demais réus ainda não serão presos. Isso porque todos podem recorrer da sentença, com os chamados embargos de declaração. Nessa modalidade de recurso, os réus podem pedir que os ministros expliquem detalhadamente pontos que não ficaram claros durante o julgamento.

A Procuradoria-Geral da República também tem direito a esse pedido de esclarecimento, caso considere as penas insuficientes. O recurso não tem prazo para ser julgado, mas é uma manobra arriscada. Dependendo do entendimento dos ministros na próxima avaliação do processo, as penas podem ser revisadas para cima ou para baixo.

O ex-governador Paulo Maluf usou o argumento da idade avançada para pedir a suspensão de penas (Foto: Pedro Ladeira) (Crédito:Pedro Ladeira)

Mesmo assim, aos 73 anos de idade, é pouco provável que Collor fique muito tempo preso – isso se chegar a ir para a cadeia. Dependendo do tempo que o STF leve para analisar o recurso, ele poderá se enquadrar em algum benefício de indulto presidencial, por exemplo.

A idade também o beneficia, pois poderá pedir para cumprir a pena em prisão domiciliar.

Esse expediente foi usado recentemente pelo ex-governador paulista Paulo Maluf, que conseguiu no STF a suspensão das penas que cumpria, também por corrupção. ISTOÉ tentou contato com o advogado Marcelo Bessa, que cuida da defesa de Collor, mas ele não quis se pronunciar.

“Os acusados integravam grupo organizado destinado à prática de crimes na BR Distribuidora”
Edson Fachin, ministro e relator do caso no STF

Edson Fachin, ministro e relator do caso no STF (Foto: Pedro Ladeira) (Crédito:Pedro Ladeira)

Histórico

A condenação no STF acontece 29 anos após Collor ser absolvido da acusação de corrupção passiva pelo envolvimento no caso PC Farias.

Apesar da queda na Presidência, Collor acabou inocentado do processo criminal que foi aberto contra ele, depois de perder o mandato.

Ele era acusado de peculato, falsidade ideológica e corrupção passiva. Os ministros alegaram que não havia provas suficientes contra o ex-presidente.

Em 2006, ele foi eleito senador por Alagoas, cargo que manteve até o começo deste ano. Em vez de tentar a reeleição no ano passado, candidatou-se para o governo do estado, mas não chegou nem a passar para o segundo turno.

Collor se livrou do processo sobre o seu mandato, mas não escapou da Lava Jato. Ainda no Senado, foi alvo de uma das fases da operação, a que gerou o processo em que foi condenado.

Na ocasião, policiais apreenderam carros de luxo que estavam na sua garagem. Entre os exemplares, havia uma Ferrari e um Lamborghini. Diferentemente de outros políticos, não chegou a ser detido. Com a decisão do STF, isso pode mudar.