Leniência ou pouca vergonha?

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Bolívar Lamounier: "Amigos, cidadãos, brasileiros: que País é este?" (Crédito: Divulgação)

Por Bolívar Lamounier

Se for assaltado na rua, a última coisa que você deve fazer é tentar reagir; um menino de 16 anos não hesitará em lhe dar um tiro. É uma cena diária. Sabemos que muita gente anda com medo de sair à noite, mesmo de automóvel. Mesmo com amigos. Mas e um povo assaltado, que paga impostos escorchantes em troca de serviços de péssima qualidade, que assiste diariamente ao festival de troca-trocas de Brasília, que vê um presidente prometer em janeiro que governará com os “grupos identitários” e em julho se entrega de braços abertos ao Centrão? Esse povo deve fazer o quê? Não, não prego violência.

Uma família da baixa classe média que faz das tripas coração para custear os estudos dos filhos assiste passivamente às universidades públicas proporcionarem ensino gratuito aos filhos das elites mais endinheiradas do país. Por que não se manifesta sobre o assunto? Por que não troca vinte minutos do futebol ou da cerveja no bar da esquina por uma reunião com famílias em situação semelhante? Isso é um eco distante do “homem cordial” cantado em prosa e verso por nossos letrados cerca de oitenta anos atrás? Ou será medo, preguiça, sentimento de impotência?

Sempre fomos assim ou nos tornamos assim nas últimas décadas, subjugados pela plausível impressão de que vivemos sob uma democracia estiolada, na verdade uma quase ditadura estruturada para servir a juízes, tecnocratas e congressistas que desfilam pelo planalto com seu séquito de assessores e secretários?

Os pichadores vivem num paraíso. Podem dedicar-se em tempo integral a não fazer nada. Cidadãos: que País é este?

Se não temos respostas para estas indagações, façamos o seguinte. Tentemos pelo menos arranjar um juiz que obrigue os moleques que picham casas e edifícios a apagar a sujeira que aprontam, bem como os marmanjos e marmanjas que espalham garrafas de plástico em torno dos pontos de ônibus, e os faça prestar serviços comunitários pelo menos uma vez por semana, varrendo as ruas, por exemplo?

Não sei como anda a coisa do serviço militar. Talvez tenham adotado procedimentos mais razoáveis. Mas tempo houve em que jovens arrimos de família, de cujo de trabalho os pais e irmãos mais novos dependiam vitalmente, não podiam se empregar enquanto não servissem à Pátria amada, salve, salve. Muitos que vinham do interior na esperança de melhorar as condições de família eram submetidos a ficar dois ou três anos sem trabalho em razão daquela esdrúxula imposição. Comparados àqueles, os pichadores vivem num paraíso. Podem dedicar-se em tempo integral a não fazer nada. Nem trabalham nem estudam. Amigos, cidadãos, brasileiros: que País é este?