Comportamento

Astronautas vão plantar batatas – na Lua

Brasil investe em plantação de batata-doce e grão-de-bico na Lua. Embrapa e Agência Espacial Brasileira lideram iniciativa que prevê cultivo de alimentos na colonização do espaço

Crédito: Nasa/Divulgação

Simulação do Programa Artemis: Nasa retornará ao satélite natural da Terra com agricultura espacial entre os objetivos (Crédito: Nasa/Divulgação)

Por Elba Kriss

A famosa comida de astronauta pode evoluir de alimentos desidratados para porções nutritivas de batata-doce e grão-de-bico de origem nacional e — incrivelmente, diga-se — cultivados no espaço. Isso porque a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) investe em projeto para levar plantações da raiz tuberculosa e da leguminosa para a Lua.

A iniciativa conta com o apoio da Agência Espacial Brasileira, uma vez que o Brasil é um dos 27 países signatários do Acordo Artemis, tratado de colaboração internacional para o programa de mesmo nome, da Nasa.

A meta da agência norte-americana é realizar uma missão tripulada à Lua e, a partir dos estudos efetuados, estabelecer uma base permanente lá. A proposta é que seja uma espécie de ponto intermediário para a conquista de outros planetas, como Marte.

“Dentro dos objetivos do Artemis existe a possibilidade de estudos de plantas a serem cultivadas na Lua. Dado que o Brasil é reconhecido internacionalmente pela pesquisa agrícola, vimos essa oportunidade de contribuir com o programa”, diz a pesquisadora Alessandra Pereira Fávero, da Embrapa Pecuária Sudeste.

À frente do projeto, a agrônoma com doutorado em Genética e Melhoramento de Plantas visualizou o óbvio: a exploração do espaço requer que tripulantes possam plantar o que irão comer, ou seja, uma alimentação sustentável. Isso em fartura para nutrir equipes em missões que podem levar meses.

“É importante que astronautas tenham itens frescos para o próprio bem-estar físico e psicológico.”
Alessandra Pereira Fávero, da Embrapa Pecuária Sudeste

Alessandra prossegue: “Não se pensa em colonização sem pensar no alimento. Não se pode ficar mandando comida o tempo todo, como acontece hoje na Estação Espacial Internacional [ISS, na sigla em inglês]. É preciso pensar na sustentabilidade do sistema.”

Assim, os eleitos foram definidos: batata-doce e grão-de-bico. “Discutimos em grupo e identificamos que essas duas opções têm características interessantes. Pensamos em fontes de carboidrato e proteína, plantas nutritivas, de fácil preparo e baixo resíduo”, detalha a pesquisadora.

A agrônoma Alessandra Pereira Fávero, da Embrapa Pecuária Sudeste: estudo para plantio e alimentação sustentável no desconhecido (Crédito:Gisele Rosso)

Há anos, norte-americanos testam o cultivo no espaço. Atualmente, a agricultura espacial tem a Veggie, uma horta que rendeu:
* alface,
* repolho,
* couve,
* pimentão.

Tudo em pequenas quantidades, que astronautas da ISS já comeram. No entanto, parte da produção foi enviada à Terra para análises.

Por isso, o que técnico- científicos do Brasil vislumbram é que as futuras plantações rendam, literalmente, mais frutos.

“Existem possibilidades em relação ao plantio. Há equipes que trabalham com o solo lunar, que se chama regolito — verificam como as plantas se comportam nele. Outras alternativas são a aeroponia e a hidroponia [plantios suspensos no ar e que usam água como base, respectivamente], diz Alessandra.

A concepção da Embrapa é de longo prazo, pois há diversas fases de estudos complexos sobre a produção de alimentos dentro de uma estação em órbita.

“Todas as simulações do que pode acontecer no espaço serão feitas na Terra. Faremos isso em laboratórios e câmaras de crescimento fechadas para avaliar aquele tipo de luz e temperatura. Uma vez com as melhores plantas adaptadas a essas condições simuladas, aí, sim, pensaremos numa segunda fase: o teste no espaço”, adianta a agrônoma.

A ideia é ter tudo consolidado para a Artemis 4, missão prevista para 2028 com quatro viajantes rumo à Lua. Até lá, a empresa nacional pretende sair do que hoje é uma proposta embrionária.

“Esperamos que no fim deste ano o projeto esteja escrito para submetermos a fontes de financiamento públicas e privadas”, diz a pesquisadora. No conceito, espera-se também unir forças com outras instituições e universidades.

Mesa de jantar: enlatados e comida desidratada no menu da Expedição 32, em 2012 (Crédito:Divulgação)

Assim, o Brasil investe no “grande salto para a humanidade”, recorrendo à célebre frase dita em 1969 pelo astronauta Neil Armstrong ao dar o primeiro passo de um ser humano na Lua.

Miriam Rezende Gonçalves, especialista em Tecnologia, Defesa e Espaço, frisa a importância da exploração espacial para a sociedade. “Comparo este momento atual com as caravelas quando cruzaram o oceano, desbravaram o desconhecido e descobriram o Brasil. É isso que vivemos hoje: a última fronteira da humanidade é o espaço.”