Internacional

Londres: cada vez menos espaço para carros poluentes

O prefeito Sadiq Khan amplia o cerco aos veículos poluidores na cidade e enfrenta uma oposição cada vez maior. O apoio vem de colegas que ensaiam adotar as mesmas medidas restritivas em outras metrópoles

Crédito: Rasid Necati Aslim

Sadik Khan determinou taxas diárias para circulação de veículos mais antigos a gasolina e diesel, por toda a Grande Londres (Crédito: Rasid Necati Aslim)

Por Denise Mirás

Sadiq Khan, em seu segundo mandato como prefeito de Londres, abraçou a causa da emergência climática como desafio. Comprometeu-se com a transformação energética, instaurando um Conselho de Recuperação de Londres. E foi ainda mais ambicioso: além de moldar a capital inglesa como território “poluição zero” até 2030, quer o crescimento pós-pandemia ajustado à duplicação dos setores verdes da economia londrina, principalmente na criação de mais empregos. Em seu cerco aos carros poluentes, enfrenta resistências crescentes de motoristas, mas recebe cada vez mais elogios de prefeitos de grandes metrópoles como Oslo (Noruega), Montreal (Canadá) e Milão (Itália).

O prefeito trabalhista precisa lidar com manifestações populares contrárias à taxa diária para circulação de veículos mais poluidores na Zona de Emissões Ultra Baixas. Delimitada em 2019, a ULEZ (na sigla em inglês) agora foi expandida para toda a Grande Londres.

O projeto, aprovado pela Suprema Corte do Reino Unido em 28 de julho, deve ser implantado no dia 29 deste mês.

Os londrinos, que já reclamam do custo de vida em geral (particularmente dos altíssimos aluguéis), corte de benefícios sociais e desemprego, estão furiosos com a taxa de circulação na ULEZ, de 12,50 libras por dia (perto de R$ 80), que atingirá carros a gasolina fabricados até 2006 e a diesel, após 2016, os mais poluidores e mais usados por trabalhadores que transportam produtos para o comércio ou mesmo pessoas.

Enquanto isso, carros de luxo, mais novos e menos poluidores, circularão gratuitamente.

Prefeito trabalhista Sadiq Khan: manifestações populares contrárias à taxa diária sobre veículos poluidores (Crédito:Ray Tang)

Contraponto

Os manifestantes dizem que o prefeito quer “fazer caixa” à custa da população. Há membros do Partido Trabalhista, como o próprio líder Keir Starme, que estão contra essa medida do correligionário.

As críticas menos contundentes contra o prefeito mencionam a falta de explicações sobre as iniciativas restritivas, enquanto os carros elétricos passam a ser mais atrativos.

O contraponto vem de prefeitos de outras importantes cidades. Oslo, por exemplo, a capital da Noruega, era tida como a cidade europeia mais poluída no inverno, e Raymond Johansen, seu prefeito desde 2015, foi radical: proibiu diesel em determinadas épocas e o pedágio para qualquer carro que entre na cidade aumenta na medida em que o ar esteja pior.

Para ele, é importante reduzir congestionamentos, pela aglomeração de partículas poluentes. Nos piores dias de inverno também há redução de velocidade nas estradas e sobem os valores de pedágio. Agora quer implantar transporte público gratuito quando a poluição se fizer maior. A Noruega pretende proibir a totalidade de combustíveis fósseis até 2025.

Montreal, que sofre com a fumaça preta dos incêndios florestais, preocupa Valérie Plante, sua prefeita desde 2017. Para atenuar problemas de saúde e mesmo mortes, criou “zonas de ar limpo” em bibliotecas e edifícios públicos, pede que se faça home office ou se use transporte público.

Ela já foi a Londres analisar a iniciativa de Khan, que elogia pela coragem e determinação, para também implantar uma “zona de emissão zero” em sua cidade.

Em Milão, onde ciclovias já não aliviam o trânsito, o prefeito Giuseppe Sala declarou apoio a Khan e analisa seu sistema de zona restrita e cobrada, anunciando mais investimentos em transporte coletivo.

Manifestantes contra taxas que atingem carros de serviço por serem mais velhos, enquanto mais novos e luxuosos ficam isentos (Crédito:Henry Nicholls)

O prefeito britânico pode não administrar uma cidade tão sufocada como Pequim e Delhi, na China e na Índia, mas 4 mil londrinos morrem por ano devido a problemas respiratórios. E a Londres dos guarda-chuvas e da tradicional neblina pode desaparecer se não forem tomadas medidas drásticas.

Sucessor do histriônico Boris Johnson, que governou por dois mandatos, Sadik Khan, de 52 anos, foi eleito em 2016 e reeleito em 2019. Sua iniciativa busca imprimir uma marca moderna à gestão com o selo “verde”.

A aposta pode se pagar, mas também tem a chance de mostrar as dificuldades dos gestores quando abraçam a ousadia ambiental.

Na França, o presidente Emmanuel Macron acabou marcado por criar um imposto verde aos combustíveis, o que aumentou sua impopularidade e gerou o movimento dos “coletes amarelos”. Precisou recuar. Até hoje deve calcular se fez bem em abraçar a causa reconhecida por todos, mas impopular entre aqueles que precisam pagar o preço da mudança.