Comportamento

“Deus fala com todos, mas poucos têm coragem para ouvi-Lo”, diz autor Neale Walsch

Crédito: Divulgação

Walsch diz que a melhor mensagem que recebeu foi “Neale, sua vida não é sobre você. É sobre aqueles cuja vida você toca e a maneira como você as toca” (Crédito: Divulgação)

Por Luiz Cesar Pimentel e Fabio César dos Santos

Neale Donald Walsch tinha 49 anos, estava desempregado, recolhia latas na rua para vender e sobreviver quando colocou no papel, em forma de carta, sua indignação divina. Perguntou a Deus o que precisaria fazer para que sua vida desse certo. Isso aconteceu em 1992, e segundo ele, começou a escutar respostas e comunicações diretamente do Criador. Transformou as mensagens na série, que conta com 10 volumes, Conversando com Deus. Foi traduzido para 37 idiomas e vendeu milhões de exemplares, tendo 7 de seus quase 40 livros lançados ainda na lista dos mais vendidos do The New York Times. Aos 81 anos, Walsch resolveu contar as histórias de outras pessoas que garantem se comunicar com Deus – são parte de Como conversar com Deus, lançado recentemente no Brasil. Em conversa com ISTOÉ, o autor afirma que Ele conversaria conosco o tempo todo, de diversas maneiras. E que basta prestar atenção para ouvi-lo ou receber as mensagens divinas.

Com base no seu relacionamento com Deus nos últimos 33 anos, o senhor poderia descrever Ele ou Ela de uma forma humanamente compreensível?
Deus não é uma pessoa na forma em que pensamos. Penso que Deus é o que chamo de energia primária ou essencial, que pode tomar qualquer forma que desejar para que o receptor possa receber sua mensagem. Acredito que não há nada que não seja Deus. É a essência presente em todos os seres, no cosmos e em todas as coisas vivas no universo, em cada árvore, em cada folha de grama, em cada flor, em cada animal e em cada pessoa. Portanto, Deus é tudo em todos.

Antes dos anos 1990, quando o senhor começou a ter suas conversas com Deus, teve alguma experiência mística?
Não, nada antes da minha experiência de conversas. Não posso dizer que tive alguma.

Por que você decidiu incluir as histórias de outras pessoas no seu livro Como Conversar com Deus?
Queria que os leitores soubessem que não é apenas um fenômeno isolado que eu experimentei, mas que pessoas em torno do mundo todo passam exatamente pelos mesmos tipos de encontros.

Como você vê a presença de Deus incluída em nossas decisões diárias?
Não acho que tenha um plano para todos nós. Acredito que nos dá livre arbítrio. O maior presente é que todos os seres sencientes podem criar a realidade que desejam experimentar. Então, não acho que tenha qualquer influência em nossas ações e escolhas diárias – estas são nossas decisões. Não o vejo como algo fora de nós, bem lá no alto tentando te alcançar – está dentro de nós. Quando trazemos sabedoria e clareza, estamos trazendo isso de dentro.

Nós temos muitas maneiras de nos relacionar com Deus. Quais são as diferenças importantes entre religião organizada e espiritualidade?
Penso que as religiões organizadas têm uma série de dogmas estabelecidos há centenas ou milhares de anos e incompletos. Nós precisamos perguntar a nós mesmos: “Isto é plausível?”. Somente se for, devemos seguir. Pois muitos dogmas estão fora do contexto plausível dos seres humanos no século 21. Já a espiritualidade é a experiência vivenciada a cada momento ao enfrentarmos a vida. E quando enfrentamos este lado, clamamos pela força divina.

Muitas pessoas só buscam Deus em tempos de crises. Você acha que isso é justo?
Justo para quem? Deus não se importa. Ele não diz: “Você está sendo injusto comigo”. Então a resposta é: “É justo você ter um relacionamento com Deus? Ou nenhum tipo de relacionamento?”.

Norman Vincent Peale (foto) escreveu O Poder do Pensamento Positivo e deixou clara a ligação entre os pensamentos e a experiência física e mental (Crédito:AP Photo)

Como a espiritualidade impacta na saúde física e emocional das pessoas, na sua opinião?
Norman Vincent Peale escreveu um livro incrível, chamado O Poder do Pensamento Positivo. Este livro vendeu milhões de cópias em todo o mundo, e deixou muito claro que há uma ligação direta entre os nossos pensamentos e a nossa experiência física e mental. Penso que essa é a resposta para a sua questão. Infelizmente tendemos a criar um mundo cheio de experiências negativas, crises econômicas, ambientais e até guerras. Só não tivemos conflitos armados durante 5% da história registrada. Então somos uma espécie bem primitiva, mas se pudéssemos alinhar os pensamentos com a compreensão de quem realmente somos, nos tornaremos bem mais evoluídos.

O que o senhor chama de evolução, no caso?
Não somos apenas corpos e mentes, mas entidades espirituais. Somos seres espirituais que usam o corpo e a mente como ferramentas para o propósito da alma. Se o maior número de pessoas puder abraçar essa realidade, o mundo mudaria do dia para a noite.

Qual é a relação entre longevidade e espiritualidade?
Sou o principal exemplo disso. Tenho doença arterial coronária (DAC) durante toda a vida e meu cardiologista disse quando eu tinha 47 anos que provavelmente não teria uma existência longa. Mas em razão da minha conexão com o divino, hoje tenho oitenta e um anos de idade. Não é um milagre? Tive uma vida incrível e longa. Não tenho nenhuma dúvida de que a razão é por levar como missão e propósito a mudança do pensamento do mundo a respeito de Deus. Estava em um programa de televisão há alguns anos e o apresentador Matt Lauer me perguntou: “Qual é a mensagem de Deus para o mundo? Mas tem que ser rápida, porque só temos trinta segundos”. Respondi com apenas seis palavras. “Vocês me entenderam da maneira errada”.

Qual seria a correta?
Pensamos que Deus é condenador, punitivo, julgador. Só que Ele não condena, não julga e não pune ninguém. Deus simplesmente nos ama incondicionalmente. Mas por pensarmos dessa forma nos permitimos sermos julgadores, condenadores e punitivos uns com os outros. E se entendemos tudo errado? Isso mudaria todo o sistema da humanidade sobre o que chamamos de Justiça.

Você acredita que a falta de conexão espiritual está relacionada ao aumento das doenças e do estresse?
Não há dúvidas. Gosto de colocar dessa forma: “Meu amigo, tem mais acontecendo do que parece”. Quando trazemos a metafísica, quando trazemos um propósito maior para a nossa vida diária, tudo pode mudar para melhor e começamos a pensar de forma mais positiva, a agir de forma mais positiva e a tomar decisões que nunca feririam ou prejudicariam ninguém. Assim, toda a nossa maneira de sermos no mundo muda. A maior mensagem dos insights espirituais que nos chegam é simplesmente que nós todos somos um.

Qual foi a principal mensagem que você recebeu em suas conversas?
Foi: “Neale, sua vida não é sobre você. É sobre aqueles cuja vida você toca e a maneira como você as toca”. Se a humanidade abraçasse essa ideia, mudaríamos o mundo para melhor. Se eu me vejo como uma alma espiritual, que veio ao reino físico para demonstrar minha verdadeira identidade, tudo pode mudar.

Você já foi acusado de ter um transtorno mental por dizer que conversa com Deus?
Sim, e isso é interessante porque a maioria das pessoas que creem em Deus, acreditam que Ele falou com os seres humanos. Irão dizer que Deus falou com Moisés, com Jesus, com Maomé. Ou seja, nós não negamos o fato de que fala diretamente com humanos. A questão é: Deus iria falar diretamente com uma pessoa comum? Ou é preciso ser o Papa ou o Arcebispo de Cantuária? Ou pode ser como o resto de nós? A resposta é que Deus fala com todos o tempo todo. A maioria das pessoas chama isso por diferentes nomes. Elas dizem: “Eu tive uma epifania” ou “tive uma visão reveladora” ou “intuição feminina”, qualquer termo para descrever a mesma experiência que chamo de conversas com Deus. Então, se você fala com Deus, você não é louco.

Como as pessoas podem saber de fato?
Deus se comunica não apenas com palavras, mas com sentimentos, sons e até mesmo fragrâncias que, de certa forma, podemos perceber. Deus nos fala de centenas de maneiras diferentes em todos os momentos. Então, não é loucura pensar que estamos recebendo informações sobre a vida, sobre o processo da própria existência, em uma comunicação direta da fonte, que eu chamo de Deus.

Matt Lauer (foto) me perguntou: “Qual é a mensagem de Deus para o mundo?”. Respondi com seis palavras. “Vocês me entenderam da maneira errada” (Crédito:foto: AP Photo/Richard Drew)

Que conselho você daria para ajudar os profissionais que buscam integrar a espiritualidade à medicina sem enfrentar dogmas religiosos?
Você vai enfrentar os obstáculos religiosos. Então, o conselho que daria é que você tem que dizer às pessoas: Entendo que a maioria das religiões e a maior parte da cultura humana diz que não é possível ter uma comunicação direta com o Criador, mas acredito que o oposto é verdadeiro. O que digo aos médicos e às pessoas da área da saúde que têm fé é: “Compartilhem com as pessoas como vocês se sentem, e irão se surpreender com quantos ficarão aliviados ao ouvir isso.” Irão dizer: “Fico feliz que você tenha dito isso, doutor, porque sempre acreditei nisso, mas agora que ouço de você, posso saber que é verdade.”

Qual é a base lógica para isso?
Acredito que existe algo chamado intuição. Acredito que existe algo chamado comunicação direta. Acredito que todas as pessoas podem ser inspiradas. Acredito que Deus fala conosco de uma maneira que Ele sabe que seremos capazes de compreender. As pessoas não precisam concordar comigo, mas podemos encontrar uma maneira de discordar de forma amigável. E se for assim, apenas amemos uns aos outros. Não precisamos ser inimigos. As diferenças não precisam criar divisões. Os contrastes não precisam criar conflitos. Os proponentes não precisam ser oponentes. Não precisamos estar constantemente lutando uns com os outros ou discutindo ou sendo verbal ou fisicamente violentos, isso não é necessário.

Quais novas abordagens ou conceitos o senhor gostaria de explorar em futuros livros ou projetos?
Gostaria de avançar no que seria necessário para criarmos o que os sociólogos chamam de massa crítica. O que faz o primeiro dominó cair? O que causa uma ideia que é claramente benéfica para todos ser abraçada pelo maior número de pessoas? Qual é esse fenômeno? Isso é o que eu gostaria de explorar no futuro. Gostaria de me envolver com outras pessoas nesse processo e ver se conseguimos criar uma massa crítica e produzirmos uma nova ideia sobre quem e o que é Deus, quem e o que somos e o propósito de toda a experiência que chamamos de vida humana. Quando eu era criança, me disseram que eu deveria ter prioridades’: conseguir um emprego, depois, um emprego melhor, um carro melhor, uma esposa, ter filhos, ficar com cabelo grisalho, depois com cabelo branco, ficar doente, comprar bilhetes para um cruzeiro, fazer o último cruzeiro e finalmente ir para casa e morrer. E essa era a minha ideia de vida. Agora, percebo aos 81 anos que a vida não é uma jornada física – é uma jornada espiritual, que nunca termina.