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O que pode acontecer com bolsonaristas após trama para assassinar Lula vir à tona

Crédito: Mateus Bonomi/AGIF; Jose Cruz/Agência Brasil

Braga Netto discutiu pormenores do plano diabólico de assassinar as principais autoridades do País com Jair Bolsonaro, que recebeu, no Alvorada, o documento sobre o golpe, levado pelo general Mário Fernandes e pelo ajudante de ordens do presidente: ele sabia de tudo (Crédito: Mateus Bonomi/AGIF; Jose Cruz/Agência Brasil)

Por Vasconcelo Quadros

RESUMO

●ISTOÉ detalha bastidores da mais louca e irresponsável tentativa de golpe jamais gestada no País, que incluiu plano de assassinato do presidente Lula, do vice Alckmin e do ministro Alexandre de Moraes
● Na quinta, 21, a PF indiciou 37 golpistas
● Jair Bolsonaro, os generais Braga Netto e Augusto Heleno, Alexandre Ramagem (ex-Abin) e Valdemar Costa Neto (presidente do PL) estão entre eles

A Polícia Federal (PF) quebrou sigilos e jogou luzes sobre os horrores planejados pelo bolsonarismo. O que veio à tona com a Operação Contragolpe, deflagrada na terça-feira 19, revela que generais e militares de confiança de Jair Bolsonaro, num misto de autoritarismo e loucura, planejaram e deram curso, entre novembro e dezembro de 2022 a um plano golpista macabro, uma trama diabólica que incluía os assassinatos do ministro Alexandre de Moraes, do STF, do presidente Lula e de seu vice, Geraldo Alckmin, com uso de armamento pesado, granadas, veneno e táticas de terrorismo.

Um projeto irresponsável, doidivanas, desajuizado, gestado para manter o ex-presidente e sua tropa no poder ao custo de mergulhar o País em um conflito ainda mais sangrento e violento do que o dos dias que culminaram com o golpe de Estado de 1964.

O documento com filigranas sobre a pavorosa tentativa da ação criminosa foi impresso pelo general Mário Fernandes e pelo tenente-coronel Mauro Cid, ajudante de ordens do presidente, em impressoras do Planalto e depois levado a Bolsonaro no Alvorada (Crédito:Divulgação)

Na quinta 21, a PF finalizou o inquérito sobre os atos golpistas de 8 de janeiro e encaminhou o relatório, com 884 páginas, a Moraes, relator de todos os processos envolvendo Bolsonaro, e à PGR. As terríveis ações reveladas na terça, 19, foram incluídas no documento. O ex-presidente e vários aliados foram indiciados por tentativa de golpe, organização criminosa e abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Se desrespeitarem qualquer medida determinada pela Justiça ou tentarem dificultar obtenção de provas e o andamento dos processos, poderão ir para o xilindró antes mesmo do julgamento final.

● Moraes, então presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), diplomou Lula e Alckmin, em 12 de dezembro de 2022, com certo atraso porque as sessões do STF se estenderam.
● Nesse mesmo dia houve conflitos em Brasília, incêndio de carros e ônibus, tentativa de invasão da sede da PF e marcha de extremistas rumo ao hotel onde Lula estava hospedado.
● O assassinato de Lula, Alckmin e Moraes também estava marcado para o dia 12, mas os golpistas adiaram a trama, planejada às minúcias, para o dia 15, por causa da demora na cerimônia no TSE.

A ação teria como ponto de partida o arrebatamento do ministro do STF em sua casa ou num restaurante no Parque da Cidade, Zona Central de Brasília, seguida da publicação de um ato autoritário em que Bolsonaro anularia a eleição, mandaria prender ou matar seus adversários e permaneceria no poder, gerindo o governo a partir da instalação de um gabinete de crise para controlar o País.

A autoridade responsável pelo plano seria o general Walter Braga Netto, ex-chefe da Casa Civil e ex-candidato a vice, em cuja casa, em Brasília, no dia 12 de novembro de 2022, os golpistas tramaram os crimes e deram início ao monitoramento das autoridades, num planejamento sem precedentes no longo histórico de quarteladas.

Os “Kids Pretos” usariam fuzis, metralhadoras e granadas para atingir seus alvos, destruir a democracia e manter Bolsonaro no poder (Crédito:Isac Nóbrega/PR)

O braço direito de Braga Netto era o “zero dois” da Secretaria Geral da Presidência da República, o general de brigada Mário Fernandes, que coordenou o plano denominado de Punhal Verde Amarelo, através do qual um grupo de seis militares das Forças Especiais do Exército, os chamados Kids Pretos, prenderia e mataria Lula, Alckmin e Moraes. O documento foi impresso no Palácio do Planalto.

O plano foi abortado na data combinada, o 12 de dezembro, mas não abandonado.
● Como era o alvo prioritário para controlar todo o STF, Moraes foi monitorado até às vésperas da posse de Lula, uma semana antes dos ataques dos mesmos grupos aos prédios dos Três Poderes no 8 de janeiro, quando Bolsonaro, com medo da prisão, já havia fugido do País a bordo do avião presidencial.
● O general Estevam Cals Theophilo, outro golpista quatro estrelas, comandante da força terrestre, só não ocupou Brasília porque o ex-presidente vacilou e, na última hora, não quis assinar o ato que promoveria a ruptura democrática e poderia desencadear tanto numa nova ditadura quanto uma guerra civil no País. Ele também foi indiciado.

A ação militar que objetivava matar Lula, Alckmin e Moraes para que não tomassem posse em janeiro de 2023 tinha o nome sugestivo: “Operação Punhal Verde e Amarelo” (Crédito:Isac Nóbrega/PR)

Militares presos

Fernandes, três oficiais do Exército, o tenente-coronel Hélio Lima e os majores Rodrigo Azevedo e Rafael Martins de Oliveira foram presos em Brasília e Rio de Janeiro na terça 19.

A PF precisou cortar na própria carne, engaiolando também o agente federal Wladimir Soares que, escalado para dar proteção a Lula no intervalo entre a eleição e posse, colaborou com os criminosos fornecendo detalhes sobre nomes, armamento e capacidade dos homens que faziam a segurança do então presidente eleito.

Outras hipóteses para a execução de Lula e de seu vice seriam por envenenamento, tiros de pistola ou explosão de granadas.

A PF afirma que o objetivo do grupo criminoso não era apenas “‘neutralizar’ o ministro Alexandre de Moraes”, mas também cassar a chapa presidencial vencedora para consumar o golpe, conforme consta do plano de Fernandes que a PF recuperou ao devassar o celular do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid. Ele fez delação mas omitiu os detalhes escabrosos do plano e agora corre o risco de voltar para a cadeia. Peça chave na trama, Cid prestou um novo depoimento na terça-feira. Voltou a ser ouvido no dia seguinte, sob condução do próprio Moraes.

Na mira de fuzis

O conteúdo será analisado por Moraes, mas nele há a descrição detalhada sobre uma série de omissões que caracterizam seletividade nos relatos, entre elas todo o plano, recuperado em um aparelho usado pelo serviço secreto israelense, e o fato de o próprio ministro do STF ter ficado sob mira de fuzis na sua casa em São Paulo, cujos detalhes deixaram seus filhos em choque esta semana.

Essas omissões são proibidas no contrato de delação e podem, sim, motivar anulação dos benefícios que Cid havia conquistado ao decidir colaborar e devolvê-lo à cadeia. O tenente coronel está em prisão domiciliar com tornozeleira. No final do mandato, Bolsonaro o promoveu a general e deu-lhe o comando dos Kids Pretos em Goiânia, mas Lula revogou as duas decisões ao assumir. Os dois são provas acabadas do ditado da máxima de que passarinho que decide voar com morcego acaba por amanhecer de cabeça para baixo.

O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho do ex-presidente, tentou minimizar a gravidade do plano afirmando que “pensar em matar alguém não é crime”, como se o assassinato de autoridades da República não tenha partido de uma conspiração envolvendo várias pessoas organizadas numa trama bárbara.

A resposta partiu do decano do STF, Gilmar Mendes. “Foi plano de execução e não uma mera cogitação.”

No delírio dos golpistas, a tomada de poder estava associada à elaboração de um “arcabouço jurídico” a ser executado com a participação do Superior Tribunal Militar (STM), citação rechaçada pelo presidente da Corte, brigadeiro Francisco Joseli Camelo.

Logo depois da Anistia (em 1979), militares inconformados com a “abertura lenta e gradual” imposta por Geisel começaram a promover atentados em todo o País (sobretudo SP e RJ) para atribuí-los à esquerda. A tentativa de explodir o Riocentro em 1981 virou “acidente de trabalho”: as bombas explodiram no colo dos militares golpistas (Crédito:Tânia Rêgo/Agência Brasil)

Alvo mais visado da República, Alexandre de Moraes foi alertado pela PF que o atentado a bomba na Praça dos Três Poderes, toscamente executado na quarta 13 pelo chaveiro catarinense Francisco Luiz, o Tio França, que se explodiu na rampa numa ação delirante contra o ministro, tem origem numa das franjas do extremismo insuflado pelos militares que cercavam Bolsonaro.

França esteve nos mesmos acampamentos montados em frente aos quartéis geridos, agora se sabe, pelo general Mário Fernandes, o grande elo entre os fanáticos e o Planalto. Conforme disse a ISTOÉ o psicanalista Sylvaim Levy, da Sociedade Brasiliense de Psicanálise, ao se explodir, ele só teve mais coragem do que os militares que o insuflaram mas se alimentam da mesma loucura. “Eles acreditam que estão certos e seguem o líder Bolsonaro. Não há racionalidade.”

Fanáticos e perigosos

O documento enviado ao STF diz que a série de ações violentas executadas depois que Bolsonaro perdeu a eleição criou ambiente para o “florescimento de um radicalismo que culminou nos atos do dia 08 de janeiro de 2023, mas que ainda se encontra em estado de latência em parcela da sociedade, exemplificada no atentado a bomba” da quarta 13 em Brasília.

Tiro pela culatra O chaveiro Francisco Wanderlei Luiz quis explodir rojões no STF na última quarta-feira, mas não conseguiu matar Alexandre de Moraes como desejava e se suicidou deitando a cabeça sobre os explosivos (Crédito:Evaristo Sa)

No relatório em que pede os indiciamentos, a PF afirma tratar-se de:
● um grupo articulado,
● perigoso,
● e que justifica a restrição de liberdade aos militares que radicalizaram os grupos da extrema-direita como necessária para “interromper a atuação de organização criminosa e o risco concreto de reiteração delitiva”.

Em resumo: além dos radicais fardados, há muitos fanáticos perigosos soltos.

A escabrosidade da trama golpista não tem limites, mas aproxima Bolsonaro e os generais que o cercavam da tranca. O inquérito sobre a tentativa de golpe, a ser concluído ainda nesta semana pela promesa da PF, deverá definir o futuro do ex-presidente, dos generais Augusto Heleno, Braga Netto e Estevam Theóphilo, do ex-comandante da Marinha, Almir Garnier, e de dezenas de oficiais que também conspiraram ou participaram diretamente das tratativas para o golpe.

A Operação Contragolpe mostra que, enquanto analisava a minuta do ato que respaldaria a aventura — em cujo texto fez alterações para tentar, sem sucesso, atrair o ex-comandante do Exército, general Freire Gomes, o comandante da FAB, Carlos Almeida Batista Júnior e o Alto Comando das Forças Armadas —, Bolsonaro era informado por Cid e o coronel Marcelo Câmara sobre o andamento do plano delegado por Braga Netto ao general Mário Fernandes.

Sinal verde

Numa troca de mensagens com Mauro Cid após sair de uma reunião com o então presidente, o general comemora um suposto sinal verde de Bolsonaro sobre o plano.
● Fernandes diz que Bolsonaro “aceitou nosso assessoramento”, ou seja, o golpe.
● A PF sustenta que o ex-presidente alterou o texto da minuta golpista, articulou-se através de seus assessores com grupos do agro e reuniu-se com Theophilo, comandante do Comando Terrestre, seis dias antes do prazo estabelecido para prender Moraes.

As investigações mostram que os principais assessores palacianos, Cid e o coronel Marcelo Câmara, supostamente para informar Bolsonaro, acompanhavam todo o monitoramento feito pelos Kids Pretos. Nas mensagens recuperadas do celular de Mauro Cid, a PF cita um diálogo que Mário Fernandes diz ter tido com o ex-presidente no dia 9 de dezembro. “Durante a conversa que tive com o presidente, ele citou que o dia 12, pela diplomação do vagabundo (referência chula a Lula), não seria uma restrição, que isso pode, que qualquer ação nossa, pode acontecer até 31 de dezembro e tudo.”

Para a PF, a fala é mais uma das tantas evidências que devem constar no relatório final e que colocam o ex-presidente no centro da trama operada por Braga Netto e Fernandes. Os federais buscam também detalhes sobre as visitas que Bolsonaro fez à sede do Comando de Operações Especiais, em Goiânia, ao qual os “Forças Especiais” estão vinculados. Fontes ouvidas por ISTOÉ para reportagem publicada no final de 2023 informaram que o ex-presidente fez várias visitas ao local em 2022, a última no início do segundo semestre.

Numa delas, foi ciceroneado pelo general Mário Fernandes, que se orgulha de ter sido Kid Preto. Ele ainda trabalha como assessor do deputado e general Eduardo Pazuello (PL-RJ), ex-ministro da Saúde, o desastrado gestor da pandemia.

Os golpistas estão caindo em desgraça. Numa busca à casa de Heleno, um dos investigados, em fevereiro, contou a ISTOÉ uma fonte da PF, os agentes encontraram um general apático, um tanto alheio à gravidade da trama em que se envolveu, mas perceberam que ele guardava um objeto na cueca. Era dinheiro, algo em torno de R$ 1 mil, que ele não precisaria esconder. O cerco ao grupo delirante que acreditava poder derrubar um governo eleito em plena democracia se fechou. O presidente do STF, Luiz Roberto Barroso afirmou que “o Brasil esteve muito próximo do inimaginável”.

As tratativas de arrecadar R$ 100 mil para monitorar Moraes começaram na casa de Braga Neto no fatídico 12 de novembro de 2022.
● A partir do dia seguinte, o ministro passa a ser monitorado, prática que segue até as vésperas da posse do presidente Lula.
● Na reunião estavam os tenentes-coronéis Mauro Cid e Ferreira Lima, além do major Rafael Martins de Oliveira, que seriam os responsáveis pela retaguarda das ações.
● Dias depois se incorporariam outros Kids, cujas despesas teriam de ser bancadas.
● Rafael detalharia esses gastos no documento Copa 2022.
● A senha seria usada em toda a ação que poderia terminar no assassinato de Moraes por seis kids pretos, todos disfarçados, se comunicando por linhas telefônicas compradas em nome de pessoas que desconheciam a trama.

Vigiando Moraes

Os agentes se tratavam por codinomes relacionados a países (Alemanha, Áustria, Brasil, Argentina, Japão e Gana) participantes da Copa, usando técnica avançada de disfarce conhecida na linguagem militar de inteligência como anonimização.

Os alvos eram tratados por apelido.
● Moraes era “professora”,
● Lula e Alckmin, “Jeca” e “Joca”.
● Rafael Martins de Oliveira era o “Japão”, coordenador do monitoramento.

Os agentes chegaram a se posicionar nas imediações da residência do ministro, em Brasília, supostamente preparados para agir, quando então “Áustria” avisa que está “perto da posição” e pergunta se “vai cancelar o jogo?”, ouvindo do major, dois minutos depois, a ordem de “abortar…volta para o local de desembarque (ponto de encontro)”.

O major Rodrigo Azevedo, que usava o codinome de Brasil, teria participado intensamente do monitoramento.

A PF reconstituiu, inclusive, o trajeto usado pelos agentes, entre Brasília e Goiânia, base dos Kids, vinculados ao Batalhão de Ações e Comando (BAC). No dia escolhido para “prender” Moraes houve intensa movimentação, com o uso ilegal de automóveis que pertencem à frota das Forças Especiais. Ao que tudo indica, o destino dos golpistas agora, dentro das “quatro linhas da Constituição”, será o banco dos réus e a prisão.

O plano

O gesto de Bolsonaro deixando a cabeça cair depressivamente para o peito logo que o resultado da eleição de 2022 foi apurado marcou o que viria pela frente: seus assessores palacianos passaram a estimular nos instantes seguintes os acampamentos que reuniram milhares de apoiadores em frente aos quartéis. O que era área de segurança nacional virou, por mais de dois meses, o endereço de malucos que batiam continência a pneu, promoviam sessão mediúnica para atrair ETs e insistiam num golpe imaginário com o uso do artigo 142 da Constituição.

A diplomação de Lula

No dia 12 de dezembro, enquanto Lula e Alckmin eram diplomados, eclodiram os atos antidemocráticos, com a invasão do prédio da Polícia Federal na região central de Brasília. Os mesmos grupos atearam fogo em carros, ônibus e seguiram pela Esplanada em direção ao hotel onde Lula estava hospedado, mas não ousaram se aproximar. Nos dias seguintes a PF descobriu que os protestos seguiam a lógica de vandalismo que resultaria na derrubada de torres de transmissão de energia e na grave tentativa de explosão, por uma bomba caseira, de um caminhão carregado de querosene estacionado no Aeroporto Internacional de Brasília, um dos mais movimentados do país.

O dia D dos crimes

Dia 15 de dezembro era a data escolhida para prender ou matar o ministro Alexandre de Moraes, Lula e Alckmin, mas a ação acabou abortada. Novembro e Dezembro marcariam, no entanto, os preparativos intensos para o golpe através de ações clandestinas que seriam executadas por agentes do grupo de elite do Exército, os Kids Pretos.

Medo da prisão

Sem apoio e com medo de ser preso, Bolsonaro fingiu que não queria passar a faixa e fugiu para os Estados Unidos no dia 30 de dezembro, deixando uma legião de fanáticos órfã de seu líder, mas dispostos a insistir no golpe.

Dia da Infâmia

Dia 8 de janeiro, uma semana depois da posse de Lula, que a ex-presidente do STF, Rosa Weber, denominou de “dia da infâmia”, hordas de fanáticos tomaram de assalto os prédios do Judiciário, Congresso e Palácio do Planalto assustando o país pela ousadia tosca e tentar criar um caos que atraísse os militares para o golpe.

A ação

Em qualquer instituição armada do mundo, agentes das chamadas Forças Especiais levam uma vida invisível, são convocados para grandes missões em defesa do país e mantidos à distância das disputas políticas ou ideológicas. Eles passam a vida profissional inteira treinando todos os tipos de ação, seja na terra, no ar ou na água, e se especializam também em inteligência e táticas para eventuais ações complexas. Levam vida discreta e atuam em sigilo. Na estranha era Bolsonaro, esses homens que integram a elite militar, conhecidos como “Kids Pretos”, foram convocados a deixar a caserna e, usando todo o aparato institucional e a formação bancada com dinheiro público, mergulharam na aventura por um golpe de Estado. Atenderam o chamamento de militares que assessoravam o ex-presidente, todos ligados ao general Mário Fernandes, sub de Braga Netto no Planalto, e ao ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, ambos ex-Kids Pretos.

DNA golpista continua
Militares formados nas forças especiais sempre foram suspeitos em ações violentas contra o regime democrático

Terrorismo com atentados a bomba fazem parte do DNA da ultradireita militar, que sempre esteve associada ao fanatismo que trafega numa “zona cinzenta”, entre a lucidez e a demência, ambas as condições absorvidas pelas sutilezas da política.

● O pioneiro do último período ditatorial foi Aladino Félix, conhecido como “Sábado Dinotos”, um místico carismático que, entre dezembro de 1967 e agosto de 1968, liderou um grupo formado por um general do Exército, Paulo Trajano da Silva, e 14 militares da antiga Força Pública de São Paulo (hoje PM), responsável por 17 atentados à bomba em órgãos públicos da capital, entre eles a que explodiu na sede do III Exército. Atribuídos à época pelos militares à esquerda armada, os atentados ajudaram a fomentar a instituição do famigerado AI-5, o golpe dentro do golpe, editado em dezembro de 1968 e que deu nos anos de chumbo.

● Em 1980, na tentativa de alongar a ditadura, o mesmo extremismo promoveu atentados contra a OAB e, em 1981, colocaria uma bomba no Riocentro, que terminou num “acidente de trabalho”, vitimando seus autores, todos militares do Exército.

● A fatal autoimolação do catarinense Francisco Luiz, o Tiü França que, não conseguindo chegar perto de seu alvo, o ministro Alexandre de Moraes, explodiu uma bomba contra a própria cabeça, conecta o passado com o presente na triste balada do bolsonarismo, que nasceu em 1987, quando o próprio ex-presidente “pediu pra sair” do Exército, encerrando o caso em que foi acusado no STM de planejar atentados à bomba no Rio de Janeiro.