Conheça o Smart Eating, o jeito de comer que vai além da alimentação saudável
Smart Eating, a filosofia que não abre mão do sabor e prazer junto à nutrição, consolida-se como tendência no Brasil, um mercado em que a alimentação saudável não para de crescer
Por Luiz Cesar Pimentel
A convenção nos ensina que alimentação saudável significa ter uma base quase torturante de refeições entre escassas e insossas. Mas uma nova pesquisa apresenta um retrato muito mais otimista no País — para o brasileiro, se alimentar de maneira salutar é, resumidamente, não comer errado. Na prática, significa que a maioria dos conterrâneos não acredita que a dieta inteligente foca apenas em alimentos fitness e se priva dos prazeres na mesa. Segundo a Trends and Data for Food, feita pela consultoria Box 1824 em parceria com o Google, o regime alimentar tem que focar em alimentos que não façam mal, se integrem de forma prática à rotina e, principalmente, que sejam saborosos. Essa é a base da tendência chamada de Smart Eating, um apelido ironicamente em inglês para designar um padrão tipicamente nacional.
72% das pessoas não se contentam com um cardápio que esqueça do prazer nas refeições
Se você frequenta lojas de produtos naturais ou especializadas em alimentos para atividades físicas, notou que, após a onda dos suplementos, elas foram invadidas por substâncias que antes eram consideradas guloseimas ou sobremesas, como pastas de amendoim e açaí em todas as variedades. Pois esse é o retrato mais fiel de que o Smart Eating já rompeu a última barreira alimentícia, a restrita aos hard users de academias.
“A saúde não está apenas nos alimentos, mas na relação que temos com eles.”
Giovana Capito, psiquiatra nutricional
“Outros exemplos incluem o chocolate amargo, a tapioca e até mesmo o doce de leite. Esses alimentos equilibram densidade nutricional e versatilidade. O chocolate amargo é rico em antioxidantes e pode ser um aliado na recuperação muscular. A tapioca fornece energia rapidamente. Já o doce de leite vem sendo usado em pequenas quantidades por atletas como fonte rápida de energia e elemento de satisfação”, diz Giovana Capito, nutricionista comportamental e psiquiatra nutricional.
“A tendência é a união do saudável e hedônico, onde para que uma alimentação seja considerada válida e funcional, deve apresentar muito mais benefícios do que só ser chamada de ‘fit’. Além dos prós que ela carrega sobre nutrientes, ainda deve ser agradável e gostosa”, completa o nutrólogo Lucas Luquetti.
Se tratada como filosofia nutricional, a tendência segue quatro preceitos:
● comer sem abandonar a nutrição e prazer;
● garantir a presença de nutrientes que sejam preventivos de doenças;
● usar alimentos para melhora de humor;
● e praticar o que chamam de indulgência saudável, com recompensas psicológicas.
Esses componentes ficam claros na pesquisa que norteou o estudo. Tomemos como exemplo uma pergunta que dizia respeito à alimentação voltada para prevenção de enfermidades. Do total de votantes, 44% apontaram que buscam na comida um reforço protetivo contra enfermidades como gripes e resfriados, 33% pensam em prisão de ventre e 8% tem preocupação de que os alimentos evitem ou não deflagram ansiedade.
Mood food
Já entre os que não abrem mão do prazer nas refeições, 72% não se satisfazem com um cardápio tão somente nutritivo. Em um viés semelhante, mas mais funcional, sobre alimentos com propriedades específicas, o resultado é parecido. A minoria, 30%, não faz uso do que é chamado mood food (comida de humor), como alimentos que fornecem mais energia, para dormir melhor, para acalmar ou antiestresse.
Por fim, a praticidade também é um componente importante na equação da alimentação sábia brasileira. Pouco mais de um quarto das pessoas (27%) não está nem aí para a conveniência da comida incorporada à rotina. “A flexibilidade do Smart Eating surgiu como uma resposta ao ciclo das dietas restritivas, que levam muitas vezes à frustração e ao efeito rebote, algo comum nas dietas extremamente restritivas, que tendem a ser insustentáveis a longo prazo”, diz Capito. “O corpo, ao sentir a privação, pode desencadear episódios de compulsão alimentar como uma forma de compensação. Isso gera um ciclo prejudicial, em que as pessoas alternam entre períodos de restrição rígida e episódios de excessos, o que compromete tanto a saúde física e hormonal quanto a mental.”
O crescimento desse tipo de demanda pelos consumidores é uma tendência que já vem sendo percebida pela indústria. O exemplo da pasta de amendoim não é por acaso. A marca líder no segmento no País, Dr.Peanut, nasceu em 2017 pela percepção de que esse cenário estava se formando. “Vimos uma lacuna no mercado: agregar sabor em um produto tradicional e conhecido pela saudabilidade. As pastas não contém açúcares adicionados, não têm glúten e nem lactose. Buscamos trazer todos os benefícios do amendoim como um alimento rico em nutrientes, combinados com o fato de que é possível comer sem culpa e agregando o que antes não existia no mercado: o sabor indulgente”, diz Lucas Castro, fundador e CMO da empresa. No ano passado, a empresa cresceu 116% e a expectativa para este ano é de ampliação de mais 70%.
27%
é o crescimento esperado até 2025 para o mercado de alimentação saudável no Brasil
Outro segmento que enxerga essa popularidade crescente e se desdobra para atender a demanda é a de açaí. A maior rede de produtos da fruta, The Best Açaí, identificou a busca entre sabor e saúde como estratégia e lançou neste mês o Açaí Paraense, um sabor que traz mais de 60% de polpa do fruto e 30% a menos de açúcar, e já colocou em testes o produto mais característico dos frequentadores de academias. “Era um pedido constante ter whey protein para agregar ao açaí. Já implementamos em algumas unidades e estamos sentindo a demanda”, diz Sérgio Kendy, sócio-fundador e CEO da marca.
Outro estudo com viés de mercado, da Euromonitor International, indica que o mercado de alimentação saudável tende a crescer ainda mais nos próximos meses, chegando ao patamar de 27% até 2025. Isso faz com que redes abram empreendimentos com foco mais específico para atender a essa procura.
O maior grupo de comida japonesa delivery do Sul do País, MTG Foods, fundou a marca Mok The Poke, apostando nos chamados bowls (tigelas) de pokes havaianos compostos por alimentos frescos e saudáveis. A decisão veio quando o termo poke atingiu o 10º lugar entre os mais buscados nos aplicativos de entrega.
“Se antes as pessoas queriam consumir junk food, agora a tendência é buscar opções que unem sabor e saúde. Nossas vendas dispararam à medida que mais consumidores optam por pratos que combinam ingredientes frescos e de qualidade”, diz Maria Clara Rocha, fundadora da marca.
“Smart Eating é uma evolução necessária na forma como enxergamos a alimentação saudável, pois combina o que há de melhor na ciência da nutrição com a compreensão das necessidades emocionais e práticas das pessoas. Não é você quem deve se adaptar à dieta, mas sim a dieta que precisa se ajustar a você e às suas individualidades. A saúde não está apenas nos alimentos, mas na relação que temos com eles”, finaliza Giovana Capito.