Exposição no MuBE propõe um futuro possível para a Amazônia
Mostra aborda os impactos da ação humana na região Norte e sugere, por meio da arte e da história, reflexões sobre o futuro da maior floresta do planeta
Por Ana Mosquera
Mupotyra significa florescer em Nheengatu, língua indígena. O nome escolhido para a nova exposição do MuBE – Museu Brasileiro da Escultura e Ecologia, em São Paulo, confirma sua intenção do início ao fim. Iniciada com um retrospecto sobre a construção da Transamazônica e a falácia do projeto desenvolvimentista da ditadura militar, a mostra evolui para um retrato de resistência e de um futuro possível, a partir da arte indígena. São acessórios históricos, como coroas, cocares, cestas, vestimentas e peças de cerâmicas, do acervo do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP, o MAE, que dividem espaço com trabalhos de artistas contemporâneos, como Thiago Guarani, Keyla Palikur, Jaider Esbell, Gê Viana, Frederico Filippi, Denilson Baniwa e Lilly Baniwa.
Com curadoria de Carla Gibertoni, Naine Terena, Eduardo Góes Neves, Ricardo Cardim e Guilherme Wisnik, e expografia de Marcelo Rosenbaum, Mupotyra: arqueologia amazônica tem como base os estudos indicadores de que a ação de povos originários teria sido determinante para a formação da floresta equatorial. “Sempre se considerou que havia povos mais civilizados e construtores de cidades na região andina. Só que os indígenas considerados primitivos tinham organizações, mas optaram por não desenvolvê-las para viver com menos exploração e em simbiose com a natureza”, diz Guilherme Wisnik, curador e vice-diretor da FAUUSP.
Ele se refere aos geoglifos encontrados na região – à semelhança das Linhas de Nazca, no Peru –, representativos de plantas urbanas, além de evidências sobre o plantio de árvores na região. “Se você pensar que a maior floresta do mundo foi arquitetada pelos povos originários, você inverte o ponto de vista, além de trazer uma ideia de construção por harmonia com a natureza, e não por contraste e oposição”, diz Wisnik.
A cartografia contribui para o debate atual. “Entre uma floresta e uma pirâmide inca, qual monumento é mais monumento? Teríamos que repensar a própria ideia de patrimônio, assim como a discussão sobre o Marco Temporal, o pertencimento e a posse do território”.
A mostra, que se inicia com a propaganda do regime militar em prol da destruição das matas, suas lendas e habitantes, termina com cartazes atuais que clamam pelo fim de queimadas, desmatamento e dizimação da população originária.
“Ela é um grito de alerta para entendermos que há menos de 50 anos queriam que acreditássemos que, ao tratar a Amazônia como um supermercado de matérias-primas, conseguiríamos a felicidade geral da Nação e a redenção do Brasil, que se tornaria o País desenvolvido que todos almejavam”, diz Ricardo Cardim, curador, botânico e detentor da coleção sobre o período.
A consciência sobre a invasão orquestrada da floresta, no passado, é fundamental para entender o caos ambiental que o bioma enfrenta e projetar um futuro sustentável. “A herança da visão utilitarista e predatória da natureza reflete na educação, e essa exposição cria insumos para a necessidade de uma coleção pública que conte aos brasileiros sobre o que são os biomas”. Mupotyra: arqueologia amazônica fica em cartaz até o início do próximo ano no MuBE, na capital paulista, e tem entrada gratuita.