A PEC de Lewandowski e o difícil pacto pela segurança
Por Vasconcelo Quadros
RESUMO
● Lula alerta para o poder das facções e pede apoio dos governadores para a PEC da segurança
● Presidente enfrenta forte resistência da bancada da bala para aprovar mudanças
● Caiado enxerga tentativa de minar poder dos Estados
● Na Câmara, deputados já se apressam para apresentar uma proposta concorrente
O pacto com governadores e prefeitos proposto pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em torno da segurança é essencial para o controle da criminalidade organizada e o reordenamento da máquina policial, hoje contaminada pela corrupção e por uma cultura brutal de repressão, baseada no conflito armado e uso desproporcional de força. O problema é que a proposta chega tarde e em meio a um turbilhão de conflitos políticos que tornam improvável sua aprovação a dois anos da sucessão presidencial.
A PEC elaborada pelo ministro da Justiça Ricardo Lewandowski:
● integra os órgãos de segurança,
● dá status constitucional ao sistema único de segurança (SUSP),
● amplia os poderes do governo federal sobre temas de segurança e penitenciário,
● e reforça as estruturas da Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal, esta num novo formato ostensivo.
A maioria dos governadores, porém, enxerga como uma intromissão de prerrogativas e, para travá-la, conta com um Congresso conservador, dominado pela bancada da bala, que faz muito barulho, mas tem poucas propostas. Lula tem dados e análises que justificam a proposta. E vai no ponto: “Logo, logo, o crime organizado vai estar participando de concurso, indicando juiz, procurador, político, candidato. É uma coisa quase incontrolável se a gente não montar um pacto federativo”.
Na reunião estavam os governadores ou vices de 20 estados, entre eles o do Rio de Janeiro, Cláudio de Castro (PL) e de Goiás (União Brasil), que não se comoveram. Os governadores enxergam manobra política com vistas às eleições de 2026 e uma tentativa de usurpar poderes, como afirma Caiado à ISTOÉ.
“O governo demora dois anos para ‘copiar’ uma lei que já existe (SUSP) e que depois a transforma numa PEC e diz que todas as alterações, as diretrizes e as regras gerais definidas pelo Ministério da Justiça serão vinculantes, ou seja, que prevalecerão sobre qualquer legislação estadual”, diz.
Caiado também critica a ausência de iniciativas do Palácio do Planalto na área de segurança pública durante os dois primeiros anos do governo Lula 3 e questiona o fato de o presidente apresentar uma PEC somente agora, quando o tema necessita de um longo debate no Congresso. Ele afirma que em Goiás já há integração entre as polícias, mas diz que os investimentos são desproporcionais: o Estado gastou nos últimos cinco anos R$ 17 bilhões, enquanto o governo federal colocou R$ 940 milhões nas ações estaduais. “É um valor insignificante”.
Lewandowski alerta que a PEC da Segurança é necessária porque depois de 36 anos de promulgação da Constituição Federal, a natureza da criminalidade mudou radicalmente enquanto os métodos de combate estacionaram, sem acompanhar a dinâmica das facções, que controlam o País, se internacionalizaram e hoje são organizações tão poderosas que superam os poderes institucionais. “É preciso repensar o Pacto Federativo”.
Críticas da oposição
A PEC da Segurança nasce enfrentando a concorrência do projeto (PL 4120/2024) protocolado no Congresso Nacional quase ao mesmo tempo em que era apresentada aos governadores. Contrário à PEC, o deputado Alberto Fraga (PL-DF), um dos autores do PL e presidente da Comissão de Segurança Pública da Câmara, responsável também pela lei que criou o SUSP, jura que a proposta foi protocolada agora “por coincidência”.
O foco do projeto é o enfrentamento ao crime organizado transnacional, uma nova legislação, reforço na Inteligência, tipificação dos crimes modernos, atuação das polícias estaduais no exterior — que hoje é prerrogativa da PF com base nos programas de cooperação internacional — e a criação de uma recompensa para o denunciante de crime.
Fraga diz que discutiu a proposta com o governador Tarcísio de Freitas e com o presidente da Câmara, Arthur Lira. Será um contraponto ao pacto proposto por Lula, que ele critica, apontando vícios de intervenção em prerrogativas estaduais: “A PEC não tem nada de inovação. Hoje os operadores da segurança pública não têm instrumentos para perseguir ou colocar na cadeia uma quadrilha que, por exemplo, mora no Paraguai, mas que atua no Brasil”.