Casa própria: financiar imóvel fica mais difícil
Com a redução nos recursos para financiamento de imóveis, a Caixa passou a exigir que o valor de entrada suba de 20% para 30%, dificultando o sonho da moradia própria
Por Maria Ligia Pagenotto
Quando tomou conhecimento das novas regras para o financiamento de imóveis pela Caixa Econômica Federal (CEF), em vigor desde o último dia 1º, a empreendedora Marina Harriz passou a considerar outras alternativas de crédito para atender às suas necessidades na aquisição de moradia própria. Até então, ela estava apostando no financiamento pela Caixa de um apartamento que pudesse chamar de seu, atraída pelas taxas de juros mais baixas. Movida pelo desejo de deixar a casa da mãe e morar sozinha, Marina, de 26 anos, deu entrada no início do ano em um imóvel novo, no bairro de Mirandópolis, em São Paulo. O valor dado inicialmente, segundo ela, foi de menos de 20%. Sua meta agora é financiar o imóvel tão logo saia o “habite-se”, previsto para março de 2025, mas ela se diz apreensiva se conseguirá arcar com as prestações, que podem aumentar.
Com as mudanças anunciadas pela Caixa, o percentual de entrada do imóvel financiado pelo Sistema de Amortização Constante (SAC), em que o valor diminui com o passar do tempo, tem de ser de no mínimo 30%, quando, anteriormente, era de 20% do valor do imóvel. Pelo sistema de parcelas fixas (Price), a entrada ficou ainda mais alta: subiu de 30% para 50%, o que preocupa não apenas Marina, mas uma ampla gama de clientes.
A grande procura por crédito habitacional da CEF, bancado com recursos do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), é que levou às novas regras.
● A Caixa detém 70% do financiamento imobiliário brasileiro, e quase 50% das contratações do SBPE.
● Além disso, o banco anunciou um limite para a liberação de financiamento, válido para imóveis avaliados em até R$ 1,5 milhão pelo SBPE.
● As alterações que atingem novos financiamentos, chegam num momento em que a carteira de crédito habitacional está prestes a superar o orçamento da Caixa para 2024.
● Até setembro, foram concedidos mais de R$ 175 bilhões de crédito imobiliário – o que corresponde a uma alta de cerca de 30% em relação ao mesmo período do ano passado.
“Ter meu próprio imóvel é uma conquista. Estou na fase de estudar as possibilidades de financiamento para realizar meu sonho.”
Marina Harriz, empreendedora
Atenção redobrada
“Muitas variáveis estão em jogo para explicar a queda da poupança e a redução dos recursos para os financiamentos imobiliários”, diz a economista Flávia Moraes, do Ibemec-RJ. O aquecimento da economia, que favorece o consumo, é responsável pela queda no saldo líquido da poupança. As novas regras, segundo ela, já eram esperadas. “O acesso ao crédito está mais caro e mais escasso de forma geral, e era preciso rever normas”.
Para Alberto Handfas, professor da Escola Paulista de Política, Economia e Negócios da Universidade Federal de São Paulo, a redução da poupança está atrelada ainda ao pagamento de dívidas por parte das famílias. “Se não houvesse essa limitação de crédito agora, a Caixa teria de aumentar os juros”, explica.
O anúncio da Caixa implica em um melhor planejamento das pessoas que pretendem comprar imóvel em um mercado extremamente aquecido, segundo o presidente da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), Sandro Gamba. Ele vê o cenário imobiliário atual com otimismo e, para que as pessoas possam aproveitar a onda, orienta: antes da aquisição de qualquer imóvel é preciso “uma avaliação dos recursos e das condições de financiamento”. E é exatamente o que Marina Harriz tem feito para conseguir realizar seu sonho de morar sozinha. “Esse apartamento para mim representa uma grande conquista”. Seu projeto sempre foi o de sair de casa sem ter que pagar aluguel, “mas honrando as parcelas do financiamento no meu apartamento próprio”.
Mirtes Bórgea, relações públicas, também está à espera da liberação do dinheiro para o financiamento do seu imóvel em Osasco e preocupa-se quanto ao andamento do processo. “Dei início à negociação em julho. Já tive aprovação do crédito, mas não tenho ideia de quando sairá o dinheiro, pois a informação que tenho é de que a Caixa está descapitalizada”. Essa é outra situação com a qual é preciso lidar.
“A demanda de financiamento está muito grande e as regras foram alteradas para buscar atender a todos”, diz Jonata Tribioli, especialista em investimentos imobiliários e diretor de operações da Neoin Construtora e Incorporadora. Ele lembra que as regras para imóveis de habitação social permanecem inalteradas. “A preocupação maior agora é por parte da classe média”, diz.
Novas regras da Caixa
● Aumento do valor de entrada no Sistema de Amortização Constante (SAC): percentual de entrada subiu de 20% para 30% do valor do imóvel
● Exemplo um imóvel avaliado em R$ 500 mil exigia uma entrada de R$ 100 mil, agora esse valor passa a ser de R$ 150 mil
● Alteração no sistema Price (parcelas fixas): percentual de entrada aumentou de 30% para 50%
● Exemplo para o mesmo imóvel de R$ 500 mil, a entrada que antes era de R$ 150 mil agora subirá para R$ 250 mil.
● Limitação de valor para imóveis financiados: A Caixa agora financia a compra ou construção de imóveis avaliados em até R$ 1,5 milhão pelo SBPE. Essa regra se aplica apenas a imóveis adquiridos ou construídos individualmente.
● Antes, a linha de crédito do SFH já tinha essa limitação, mas as opções do SFI não apresentavam um teto de valor.