Mostra com obras de Tarsila na França celebra o impacto sobre o modernismo
Pintora brasileira ganha uma retrospectiva no Musée du Luxembourg, em Paris, cidade onde ela aprendeu a combinar a influência das vanguardas europeias e os símbolos brasileiros
Por Felipe Machado
Embora seja reconhecida em todo o mundo como uma figura icônica do modernismo brasileiro, Tarsila do Amaral não participou do evento que, ao menos simbolicamente, deu origem ao movimento no Brasil: a Semana de Arte Moderna de 1922, realizada no Theatro Municipal, em São Paulo. Mas por que a pintora, já um nome consolidado nas artes, não estava presente em uma data tão importante? Nascida e criada por uma família de fazendeiros abastados, Tarsila estava em Paris, estudando e absorvendo as vanguardas artísticas europeias, especialmente o cubismo e o primitivismo. Pois Tarsila, mais de um século depois, está de volta à capital francesa.
No início de outubro, foi inaugurada uma mostra dedicada à brasileira no Musée du Luxembourg, onde uma grande retrospectiva com mais de 150 obras traça a jornada da artista e revela aspectos pouco conhecidos do seu legado. Por meio de trabalhos produzidos entre os anos 1940 e 1960, além de rascunhos e registros de viagens, o público é convidado a fazer uma imersão no imaginário de Tarsila, guiado por seu olhar inovador e contestador.
A exposição, que demandou três anos de preparação, celebra a pintora que não apenas explorou as tradições e o misticismo do Brasil, mas também aprendeu com as influências europeias até criar uma identidade estética própria. “Quero ser a pintora da minha terra”, escreveu para a mãe, quando ainda estava em Paris.
A exposição celebra o impacto de Tarsila sobre o modernismo e sua importância para a identidade cultural brasileira. Seus traços, embora de aparência ingênua, escondem uma crítica sutil e uma força que celebra o “País do Futuro” sem ignorar as contradições que sempre exisitiram por aqui. As dimensões da mostra confirmam a relevância internacional da sua carreira. Na exposição, suas pinturas dialogam com as linguagens que marcaram a época ao mesmo tempo que projeta um Brasil poético, confirmando seu nome como uma de nossas maiores embaixadoras artísticas.
Vida em Paris
● Natural de Capivari, interior paulista, Tarsila teve acesso a uma educação refinada.
● Aos 16 anos, realizou sua primeira viagem à Europa.
● Em 1920, já casada, começou a estudar pintura em São Paulo e logo depois partiu para Paris, onde se matriculou na Académie Julian.
● Lá, conviveu com intelectuais e artistas que seriam cruciais para sua trajetória, como Fernand Léger e André Lhote.
● Na efervescente capital francesa, epicentro cultural do mundo à época, Tarsila e seu então companheiro, o escritor Oswald de Andrade, conviveram com artistas como Pablo Picasso e Igor Stravinsky, participando de um ambiente vibrante de intercâmbio cultural.
Após voltar ao Brasil, Tarsila e outros modernistas, como Mário e Oswald de Andrade, começaram a moldar uma visão original de Brasil. Queriam elaborar uma arte que abraçasse suas raízes tropicais, indígenas e afro-brasileiras, tudo ao mesmo tempo. Tarsila combinou como poucos essas identidades e as integrou aos valores estéticos da época, criando obras com cores vibrantes que se tornariam sua assinatura.
Presente na mostra em Paris, seu famoso autorretrato é um bom exemplo da sua capacidade de transformar a escola europeia em algo pessoal. A ideia de adaptar culturas estrangeiras à realidade nacional moldou sua estética e a firmou como uma artista que teve coragem para revisitar símbolos e mitos brasileiros de forma autoral. Tarsila contribuiu para a criação de uma linguagem visual que redefiniu o Brasil, revelando um país multifacetado e, à sua maneira, moderno.