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Especialistas comentam o futuro de Pablo Marçal

Ex-coach quer fazer política pelos próximos 12 anos, mas perda da elegibilidade por oito anos pelos golpes baixos e crimes na campanha, dada como certa por especialistas, deverá frustrar seus planos

Crédito: Miguel Schincariol/AFP

"Conservadorismo é maior do que o Bolsonaro e o Marçal, 2026 é daqui a semanas”, disse Pablo Marçal (PRTB), após saber que ficou de fora do segundo turno em São Paulo (Crédito: Miguel Schincariol/AFP)

Por Eduardo Marini

Após a votação de 6 de outubro, o ex-coach e empresário Pablo Marçal (PRTB), terceiro colocado no primeiro turno da eleição para a prefeitura de São Paulo, disparou: “2026 será daqui a algumas semanas”. Era uma referência ao seu desejo de concorrer à presidência. Lançou no ar uma promessa curiosa. “Vou me envolver com política nos próximos 12 anos”. Mas a descarga de golpes baixos, transgressões legais, ataques com notícias falsas e ações com indícios fortes de crimes civis e penais, promovida por ele na campanha, deverá resultar em drástica redução do período. Para a quase totalidade dos especialistas, os oito anos de inelegibilidade são certos. Condenações em outros tribunais também são prováveis.

Os absurdos de Marçal surpreenderam até os acostumados a lidar com baixarias do tipo. “Fiquei chocado. Jamais vi algo assim. Ele foi eticamente irresponsável, fora de qualquer padrão. Há também crimes civis e penais. Se ficarem provados, não tenho dúvida de que será condenado”, afirma a ISTOÉ o advogado Alberto Rollo, especialista em Direito Eleitoral.

“Marçal exibiu o que há de pior na política. Violou dolosamente a legislação. Estou certo de que as ações o levarão à inelegibilidade e poderá haver desdobramentos civis e penais”, acrescenta Fernando Neisser, advogado, doutor pela USP e integrante da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (ABRADEP).


“A liberdade sofreu novo ataque. Não vão nos calar. A causa agora é muito maior.”
Fernando Francischini, ex-deputado estadual (União Brasil-PR), sobre sua cassação por difusão de fake news

Precedentes

Os precedentes são as perdas de inelegibilidade do deputado estadual paranaense Fernando Francischini (então PSL) e do ex-presidente Jair Bolsonaro.

O primeiro teve mandato cassado e foi declarado inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em outubro de 2021, por divulgar notícias falsas contra o sistema eletrônico de votação.
O segundo perdeu a elegibilidade em junho de 2023, por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação, em reunião no Alvorada com embaixadores, em julho de 2022.

“A liberdade sofreu novo ataque. Não vão nos calar. A causa agora é muito maior”, esperneou Francischini ao saber do resultado do julgamento.

Os dois foram julgados por Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE), recurso a ser usado contra Marçal. As perícias do laudo foram passadas ao TRE-SP. “São processos eleitorais normais, com denúncia, direito de defesa, contraditório e testemunha. Poderá atingir três níveis — zona e tribunais regionais e superior — e até questionamento constitucional no Supremo Tribunal Federal (STF)”, detalha Rollo.

Alvo de mais de 160 processos eleitorais, Marçal precisará superar barreiras aparentemente intransponíveis.
A mais recente e cabeluda é a acusação de divulgar laudo médico falsificado sobre um surto psicótico de Boulos por uso de cocaína. O prontuário, grotescamente adulterado, segundo peritos das polícias Federal (PF) e Civil, é farto em buracos. Traz agressões primitivas ao português, número errado de identidade do psolista e traços de assinatura distantes da original do médico José Roberto de Souza, morto em 2022 sem jamais ter trabalhado na capital paulista, onde o trambique foi cometido.

“A divulgação do laudo abriga vários crimes. Fatos inverídicos, difamação, injúria e falsidade eleitorais, abuso de meios de comunicação e, ao que tudo indica, associação criminosa. O MPE poderá propor também ação penal. Ele ficaria inelegível e sofreria penas criminais”, explica Neisser.

“Marçal disse não ter feito, mas apenas publicado o laudo. Ainda que seja verdade, a lei é cristalina: divulgar também é crime. Esse caso poderia até se tornar marco para mudar a legislação, permitindo retirada imediata do candidato da disputa por atitudes desse porte”, acrescenta Rollo.

O ex-coach responde por outras broncas pesadas.
No campo eleitoral, uma avançada é a acusação de pagar seguidores para compartilhar vídeos de campanha.
Em outra, a polícia investiga suspeita de tentativa de homicídio e omissão de socorro em 2022, ao conduzir seguidores à Serra da Mantiqueira sem preparo. Os bombeiros precisaram de nove horas para socorrer o grupo.
Marçal também foi convocado pelo ministro do STF Alexandre de Moraes, no sábado 5, a explicar porque usou VPNs para entrar na rede social X, que ficou suspensa no País de 30 agosto a terça 8.

“O conservadorismo é maior do que o Bolsonaro e o Marçal”, filosofou o ex-coach no mesmo pronunciamento, repisando o costume cafona da autorreferência na terceira pessoa. Se a capivara extensa levá-lo às condenações, o cenário conservador ficará ainda maior diante de dois banidos.