Comportamento

Gastronomia: festival de Tiradentes projeta o melhor da culinária mineira

Em meio à natureza e à arquitetura barroca, o primeiro festival gastronômico do Brasil evidencia a culinária tradicional mineira, mas se atualiza ao fazer intercâmbio com chefs do País e do mundo

Crédito: Divulgação

Paisagem local: 70 mil pessoas circulam pelas barracas, jantares, aulas e shows musicais, nos dez dias do evento que movimenta R$70 milhões (Crédito: Divulgação )

Por Ana Mosquera, de Tiradentes

Cercada pela imponente Serra de São José, a 500 km de São Paulo e 400 km do Rio de Janeiro, a cidade mineira de Tiradentes, com pouco mais de 10 mil habitantes, está longe de ser pequena e isolada. Há 27 anos, ela abriga o Festival Cultura e Gastronomia de Tiradentes, que recebe cerca de 70 mil pessoas. Conhecido pela produção de ouro, prata e estanho no período colonial, o local vem ampliando seu leque de riquezas por meio da gastronomia. Doce de leite, jiló, quiabo, milho e muita carne de porco, mas também bacalhau português e pescado amazônico estão entre elas. Isso porque o evento, primeiro do Brasil da área, tem a função de elevar a culinária do estado, mas também de transportar a ele o que o País e o mundo tem de valioso.

“É como um artista que está começando e tem a oportunidade de contracenar com a Fernanda Montenegro. Além da troca de conhecimento, há a visibilidade de estar junto a alguém estrelado”, diz Rodrigo Ferraz, diretor do Fartura, plataforma gastronômica responsável pela produção do evento, que também acontece em outros estados e, agora, chega a Portugal.

Este ano, inclusive, Tiradentes homenageia a conexão entre os dois países, recebendo chefs com estrelas Michelin, como Vitor Matos e Arnaldo Azevedo. “Nos encontramos nos ingredientes, nos modos de fazer, mas também tomamos caminhos diferentes, que definem cada povo com suas singularidades”, disse Carolina Daher, curadora gastronômica da plataforma.

Para compartilhar: o chef carioca Rafa Gomes divide conhecimento e serve prato com ingredientes típicos, em uma das aulas ao vivo (Crédito:Divulgação )
Regado a bom gosto: Orquestra de Câmara Sesc toca, entre outras canções, obras de Milton Nascimento (Crédito:Divulgação )

Se hoje os chefs convidados somam juntos três estrelas Michelin, quando o festival nasceu, em 1998, era esse o número de estabelecimentos gastronômicos na cidade. Em dez anos, o setor de restaurantes, bares, pousadas e lojas já havia crescido mais de 300%, passando a representar metade do PIB, segundo a Associação Empresarial de Tiradentes.

Para chegar a números expressivos, contudo, a causa maior precisa se manter: o fortalecimento da culinária local. “Quando falamos do queijo e do café de Minas, como se fala do bacalhau e da sardinha de Portugal, estamos cumprindo o objetivo de fortalecer a autoestima do mineiro”, disse o diretor, no lançamento do Fartura & Essência — Minas em Portugal.

Longe dos mitos: a chef paulistana Priscila Deus prepara carne de segunda na brasa, remetendo às tradições culinárias da região (Crédito:Divulgação )

“O intercâmbio com outras regiões fortalece não só Minas Gerais, mas a gastronomia brasileira, que é composta de diferentes atores.”
Rodrigo Ferraz, diretor do Fartura

Conexão Brasil

Para chegar, uma vez ao ano, à região central de Minas, os participantes encaram avião, carro, ônibus, van, trânsito. A jornada dos chefs é ainda maior: além de se aventurarem a bordo com caixas de isopor para ingredientes específicos, há a missão de cozinhar em outro local, explorando novos sabores. “Não dá para mascarar a cultura em nome da sofisticação, ao mesmo tempo em que para refinar um prato não é preciso tirar sua personalidade”, diz o chef Rafa Gomes.

O uso de determinadas técnicas e cortes também valoriza a localidade. “A minha intenção é quebrar o paradigma de que uma carne na brasa, para ser boa, tem que ser picanha. A brasa remete às tradições culinárias da região, enquanto o acém é um prato que representa a simplicidade da cozinha mineira”, diz a chef Priscila Deus.

(Divulgação)

Amparada pelas raízes fincadas no sítio, na casa da avó, a gastronomia mineira vem ganhando novos ares e não é raro encontrar preparos como risoto de taioba e pipoca de quiabo no evento e em restaurantes da região. Do mesmo modo, estabelecimentos que se dedicam aos tradicionais salgados conhecidos como cigarretes e ao pão de queijo recheado, de linguiça ou pernil, têm lugar na festa da gastronomia que ganha o mundo. Em outubro, o Fartura acontece em Belo Horizonte, além de chegar ao Porto, a Fortaleza e a Uberlândia até o final do ano.