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Brasil e China celebram meio século de bons negócios – apesar de Bolsonaro

Crédito: Divulgação/ministerio Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços

Alckmin (com o presidente chinês Xi Jinping) fechou R$ 24,6 bi em várias linhas de financiamento (Crédito: Divulgação/ministerio Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços)

Por Eduardo Marini

RESUMO

• No aniversário de 50 anos, relações do Brasil com o maior parceiro de negócios, a China, estão no ápice
• As trocas comerciais são marcadas por recordes favoráveis ao País
• Pequim é responsável por três a cada dez dólares pagos em todo mundo aos exportadores brasileiros
• Sem contar que a China responde por mais da metade do saldo positivo total da balança comercial

 

A nada saudosa, estreita e equivocada política internacional do ex-presidente Jair Bolsonaro, abraçada com impulso de ares quase religiosos por seu ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, por muito pouco não abalou seriamente as relações do Brasil com seu maior parceiro comercial: a China. Foram anos de ataques gratuitos, embalados por uma série de conceitos ideológicos ultrapassados.

O País esteve a curtos passos de inviabilizar negócios lucrativos e fundamentais para sua economia, com um cliente que:
paga três a cada dez dólares de tudo vendido para fora por brasileiros (30,7% das exportações),
proporciona sozinho mais da metade do superávit total da balança (52% em 2023, com US$ 98,8 bilhões, ou R$ 538,7 bilhões),
e comprou por aqui, nos últimos dois anos, mais do que Estados Unidos e União Europeia juntos.

Essa visão indigente felizmente foi superada a partir do ano passado. E, neste 2024, ano das comemorações de meio século da retomada das relações diplomáticas entre Brasília e Pequim, as trocas comerciais e negócios entre os dois países estão em alta como nunca — e com recorde de dados e índices benéficos para o Brasil (leia quadro).

“Em 2023, o comércio entre os dois países atingiu patamar histórico de US$ 157,5 bilhões”, contabiliza o diretor-presidente do Instituto Sociocultural Brasil-China (Ibrachina), o advogado Thomas Law, doutor em Direito Comercial Internacional. “O recorde demonstra não apenas o potencial de crescimento, mas também a confiança mútua e a interdependência estabelecidas ao longo dos anos”, acrescenta.

“China e Brasil são parceiros e irmãos que avançam com a mesma vontade e aspiração.”
Xi Jinping, presidente da China

Exemplos robustos do bom momento foram sacramentados em junho último na missão oficial à China, com 200 empresários, liderada pelo vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) Geraldo Alckmin. O saldo foi generoso para o Brasil: R$ 24,6 bilhões recebidos em créditos.

“China e Brasil são parceiros e irmãos que avançam juntos com a mesma vontade e aspiração”, afirmou o presidente chinês, Xi Jinping, ao receber Alckmin no Grande Salão do Povo, na capital chinesa. “Concluímos a missão com resultados satisfatórios. Garantimos mais de R$ 24,6 bilhões em financiamentos para projetos no Brasil, com foco na reconstrução do Rio Grande do Sul”, reforçou o vice-presidente.

Law, do Ibrachina, vai organizar uma série de eventos sobre Brasil-China a partir de agosto próximo (Crédito:Marcelo Mug)

Entre as linhas de crédito decididas na missão está um memorando de entendimento, firmado entre o Ministério da Fazenda e o Banco Asiático de Investimentos e Infraestrutura (AIIB), de R$ 5 bilhões em investimentos na recuperação do Rio Grande do Sul. O Banco de Desenvolvimento da China (CDB) concedeu R$ 4 bilhões em créditos ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a serem colocados em projetos de infraestrutura, mudanças climáticas e economia verde no Brasil, e outros R$ 3,6 bilhões, para projetos no Brasil a serem decididos pela instituição brasileira. O Banco de Exportação e Importação da China (Eximbank) repassou ao Banco do Brasil mais R$ 2,5 bilhões, destinados a ações de ampliação do comércio e cooperação bilateral entre os dois países.

Em outros ramais do conjunto de acordos, o BB recebeu do CDB chinês uma linha de crédito de R$ 2,5 bilhões direcionada ao reforço das ações de cooperação pragmática entre Pequim e Brasília. Uma carta de intenções foi assinada entre BNDES e AIIB para negociar uma linha de crédito de R$ 1,3 bilhão.

Na mesma viagem, Alckmin fechou outro financiamento para o Rio Grande do Sul, de R$ 5,7 bilhões, com o New Development Bank (NDB), nome oficial do Banco do Brics, presidido atualmente pela ex-presidente Dilma Rousseff. Fechando o pacote, A ApexBrasil garantiu a venda de 120 mil toneladas de café brasileiro, por US$ 500 milhões (R$ 2,7 bilhões) à rede de cafés chinesa Luckin Coffee. O negócio dobrou o valor total de exportações brasileiras do produto para a China em relação a 2023.

• A retomada do relacionamento diplomático e comercial entre Brasil e China foi selada em 15 de agosto de 1974, no Itamaraty, em Brasília, numa reunião entre o então comandante da diplomacia brasileira, Azeredo da Silveira, e o vice-ministro do Comércio chinês à época, Chen Chien. Treze anos antes, em agosto de 1961, João Goulart tinha se tornado o primeiro chefe de governo brasileiro a fazer uma visita oficial ao país.

• A cerimônia foi econômica, marcada apenas pela leitura, em português e chinês, de um breve comunicado conjunto. “Os dois governos concordam em desenvolver relações amistosas entre os dois países com base nos princípios de respeito recíproco à soberania e à integridade territorial, não-agressão, não-intervenção em assuntos internos de um dos países por parte do outro e vantagens mútuas e coexistência pacífica. O governo da República Federativa do Brasil e o da República Popular da China concordam em trocar embaixadores dentro do mais breve prazo possível, e em prestar, um ao outro, toda a assistência necessária para a instalação e funcionamento das embaixadas em suas respectivas capitais”.

• Os contatos entre os dois países são, no entanto, bem mais antigos: a primeira missão diplomática brasileira à China ocorreu em 1880.

Alckmin afirma que Jinping confirmou a vinda ao Brasil, em novembro próximo, para a Cúpula dos Chefes de Estado do Grupo dos 20, e o encontro com o presidente Lula. “Planejamos, para a comemoração dos 50 anos, eventos que vão de seminários econômicos e empresariais a exposições culturais sobre os dois países. Em agosto promoveremos a temporada cultural da China no Brasil, com apresentações do Ibrachina Musical Project, danças étnicas, teatro e explorações em São Paulo, Campinas e Brasília”, detalha Law.

Há, de fato, motivo para comemorar.

PARCERIA EM NÚMEROS

A maior relação comercial do Brasil é com a China. Ano de 2023 foi de recordes. Confira:

US$ 157,5 bilhões (R$ 858,8 bilhões)
em comércio entre os dois países em 2023

US$ 104,3 bilhões (R$ 568,7 bilhões)
em exportações do Brasil para a China. Pela primeira vez na história, um país comprou mais de
U$$ 100 bilhões (R$ 545,2 bilhões) em produtos brasileiros em um ano. No mesmo período, os chineses venderam US$ 53,2 bilhões (R$ 290 bilhões) ao País

US$ 98,8 bilhões (R$ 538,7 bilhões)
foi o superávit do Brasil nessa balança comercial, o maior da história do País em todas as suas relações comerciais. Representou 52% do saldo positivo brasileiro em 2023

30,7%
das exportações brasileiras são para a China

22,1%
dos produtos manufaturados importados pelo Brasil são chineses

75,1%
das exportações brasileiras para a China envolvem soja, petróleo e minério de ferro