O grande sabotador do Brasil

Crédito: Evaristo Sá/AFP

Carlos José Marques: "A folha corrida de processos contra o ex-mandatário só aumenta. À mesma medida que a desfaçatez para espalhar lorotas" (Crédito: Evaristo Sá/AFP)

Por Carlos José Marques

Bolsonaro não deve ficar apenas inelegível. Seria pouco! Ele precisa ir à prisão por todos os seus crimes de responsabilidade mais do que evidentes e por sua natural compulsão e predisposição para sabotar avanços civilizatórios com uma onda de fake news sem fim.

Não são apenas os 600 processos que lhe pesam sobre as costas — de toda ordem, por falsificação da carteira de vacinação à articulação da trama golpista do 8 de janeiro, do tráfico de muamba de joias ao espetáculo de propaganda mentirosa contra as eleições, em uma encenação absurda junto a embaixadores internacionais.

Bolsonaro teve a pachorra, dias atrás, mesmo já sendo notoriamente conhecido por suas aleivosias e estar sendo processado por muitas delas, de promover novas desinformações contra as vacinas para a Covid.

Alegou, sem qualquer comprovação (dizendo ter lido na bula de uma delas, o que também não se confirma), o perigo da existência de uma substância chamada grafeno, capaz de se alojar nos testículos e ovários com prejuízos sérios à saúde. Era mais uma de suas tentativas de descredenciar a imunização dos brasileiros, o que fez em seguidas ocasiões, mesmo quando presidente da República.

Voltou atrás dessa vez, mas o estrago das insinuações infundadas já estava feito.

O seu desserviço à população nesse aspecto tem sido de tal ordem que ele, enquanto chefe da Nação, não apenas atrasou propositalmente a compra e importação do imunizante, como alardeou falsos efeitos milagrosos de uma cloroquina sem eficácia, levando a milhares de mortes a mais que poderiam ter sido evitadas no Brasil.

O descaso e a negligência que adotou influíram diretamente no tamanho do desastre por aqui. É consenso hoje que o então mandatário deve, sim, ser responsabilizado por crimes contra à humanidade, tal qual um psicopata que age premeditadamente.

Da mesma forma, Bolsonaro encarnou o retrato mais abominável do atraso e do negacionismo destruidor da sociedade. Com suas motociatas e rotineiros passeios de jet ski deixou de governar para montar esquemas os mais diversos em proveito próprio e até de saque ao erário.

Agora se sabe, inclusive, da existência de um cofre no Palácio do Planalto para pagar contas pessoais da primeira-dama. Toda família tinha um verdadeiro laranjal de desvios de recursos públicos e recebiam por fora em muitas ocasiões.

Compraram ao menos 300 imóveis, boa parte em dinheiro vivo. Pagaram pastores com lingotes de ouro em um carnaval de barbaridades.

O presidente em pessoa deixou, sabidamente, que um esquema de superfaturamento na compra de imunizantes tivesse andamento, prevaricando assim de maneira escancarada, já que tomou conhecimento de tudo no próprio gabinete e sequer encaminhou a devida denúncia.

Bolsonaro segue agora para o quarto depoimento à Polícia Federal desde que retornou de suas idílicas férias de meses na Disney.

A folha corrida de processos contra o ex-mandatário só aumenta. À mesma medida que a desfaçatez para espalhar lorotas. De uma forma ou de outra ele começa a pagar por seu passivo.

Com a inelegibilidade no horizonte, já adotou até um discurso de derrotado, tentando se vitimizar. Será difícil a tática surtir efeito.

A sobrevida política de Bolsonaro, caso ainda seja possível, se dará muito mais como a de um influenciador nas indicações partidárias – afinal o público de simpatizantes extremistas continua alto – do que como protagonista do jogo.

A ação do TSE é apenas uma das 16 que questionam sua conduta no processo eleitoral. No atual contexto de investigações, com as evidências que vieram a público, surpreende saber que o ex-mandatário foi capaz de mobilizar praticamente todos os seus assessores mais próximos no devaneio da construção de um golpe.

A defesa do ex-capitão, tentando lhe livrar de maiores condenações, alega risivelmente que ele não teve nada a ver com isso.

Mas o seu ministro da Justiça Anderson Torres e o ajudante de ordens (como o cargo bem aponta, cumprindo as deliberações diretas do chefe) foram pilhados em flagrante com minutas de golpes e em diálogos bastante comprometedores que demonstram o seguinte: ou o presidente era um completo alienado sobre o que se passava na coxia do próprio governo ou, como é praxe e provável, tenta transferir a culpa e as penas para os subordinados.

O “mito” Messias, por qualquer ângulo que se enxergue, mesmo que se tente ser condescendente com tantos desmandos, figura na condição de um abominável sabotador da República. Alguém execrável, com extenso plantel de prejuízos legados ao País e que merece pagar pelo que fez.

* Carlos José Marques é diretor editorial da Editora Três