Comportamento

Encontrado o vinho mais antigo do mundo

Líquido vermelho acondicionado em urna mortuária foi descoberto em túmulo romano no sul da Espanha e atestado como vinho de dois mil anos

Crédito: Divulgação

A entrada do espaço onde foram encontrados objetos funerários em oito nichos (Crédito: Divulgação )

Por Denise Mirás

Um estudo arqueoquímico determinou que o líquido encontrado em um mausoléu romano da cidade de Carmona, no sul da Espanha, é um vinho de dois mil anos — o mais antigo de que se tem notícia. A descoberta se deu quando um túmulo coletivo foi desenterrado em 2019 e dele se coletaram objetos de oito nichos de um cômodo com cerca de seis metros quadrados. Eram vasos contendo cinzas e restos de ossos, contas de âmbar e um unguentário, além de uma caixa de chumbo vedada, acondicionando urna crematória com o que seria vinho e restos de ossos queimados, de acordo com biomarcadores.

De fato, no mundo romano antigo o vinho tinha significado religioso altamente simbólico e relacionado a ritos funerários, ao lado de alimentos com mel, que “acompanhavam” o morto em uma nova jornada.

O tal líquido avermelhado foi divulgado como o vinho mais antigo do mundo, de acordo com estudo publicado no Journal of Archeological Science agora em 2024. E, pelos vinhos produzidos na chamada Baetica Romana, que foram descritos pelo escritor e poeta Columela no século IV, os especialistas acreditam que o tal vinho de dois mil anos seja semelhante ao Jerez que conhecemos hoje (elaborado com uvas brancas e alto teor alcoólico).

Vinho passou por estudo arquioquímico (Crédito:Divulgação )

Bem envelhecido

O maior tempo de envelhecimento do vinho é condicionado à sua carga fenólica (os compostos presentes nas uvas que inibem doenças cardiovasculares), como explica Ricardo Morari, presidente da Associação Brasileira de Enologia (ABE). Esse é um dos elementos que propiciam a conservação por mais tempo.

Outro ponto determinante para isso é o teor de álcool, que também teria de ser maior, como nos casos do Jerez e do Porto. “Para envelhecer bem, provavelmente o vinho de dois mil anos seja mais licoroso. Mas também depende da uva, que precisaria ter mais tanino”, observa, em referência às substâncias que fazem as ligações de hidrogênio e oxigênio e também atuam na parte externa da uva contra pragas e predadores.

(Divulgação)

Morari ainda menciona a elaboração do vinho, que deve ter sido com cascas e sementes bem maceradas para se extrair mais os polifenóis, como se faz com o Barolo, do noroeste da Itália, que passa por 20 a 30 dias nesse processo. No caso do vinho encontrado, o local ainda deveria ter temperatura alta, com “tampa” vedando bem a entrada de ar, “o que é importante para o bom envelhecimento porque evita a evaporação do álcool e detém a oxidação, que prejudicaria a qualidade do produto”.

Você gostaria de experimentar um vinho embalado há dois mil anos? Ricardo Morari diz que sim: “Se não estivesse com ossinhos misturados… com certeza. Por curiosidade. Afinal, todo enólogo sempre quer provar algo diferente”.