Comportamento

Abelhas no campo

Cientistas da Bahia estudam eficiência da polinização de morangos por espécies nativas — presença dos insetos reduz deformação dos frutos

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MELHORIAS Ideia gera mais produtividade: após um ano de imersão, Priscila Miranda comemora o fim da primeira fase da pesquisa no Sítio Muritiba, na Bahia (Crédito: Divulgação)

O Brasil é líder na produção de morango na América Latina, com 33% do total de frutas. São cinco mil campos de futebol ao ano, o que representa cerca de 175 milhões de mudas de plantas. A plantação nas regiões mais altas da Bahia é recente, mas a importância econômica da atividade no estado chamou a atenção de pesquisadoras. Foram coletadas cinco mil toneladas em 2019, ano em que Sorlange Moreira Gomes Soares começou a cultivar no Sítio Muritiba, em Barra do Choça, a 27 km de Vitória da Conquista. Dois anos depois, as engenheiras agrônomas Priscila Miranda e Zilda Cristina Malheiros Lima, da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), aportaram por lá para analisar o comportamento das abelhas sem ferrão na cultura da fruta vermelha. “Elas chegavam às 6h30 da manhã, quando eu começava a abrir os túneis de morangos, e ficavam observando o trajeto das abelhas nas flores”, lembra Sorlange. Após um ano de imersão minuciosa, o resultado da pesquisa ainda está sendo concluído, mas já há benefícios evidentes: menos frutos deformados e maior produtividade. Um dos motivos é que o uso reduzido de defensivos, pelo bem-estar das abelhas, ajudou também a preservar as flores.

Além de suplementar a polinização em locais de déficit, a jataí e a iraí são espécies que exigem pouco manejo. Apesar de excelente fecundadora, a abelha africanizada Apis Mellifera não é inofensiva como as brasileiras: “As nativas são mais fáceis de domesticar, porque não têm ferrão e se dão muito bem diante da presença do ser humano”, afirma a agricultora. Ainda que o processo natural tenha seu papel, colocar as caixas perto dos pés de morango facilita a etapa fundamental para o desenvolvimento do fruto: quando o morango não é polinizado por completo, nasce deformado e só pode ser aproveitado como polpa ou na indústria de cosméticos.

O próximo passo no estudo pretende definir quantas caixas são necessárias por hectare para que haja aumento de produção, e realizar a análise econômica dos custos e os benefícios do modelo de pesquisa. Segundo Priscila, os resultados serão compartilhados com produtores, pesquisadores e técnicos, para auxiliar no melhoramento genético do fruto no futuro. Além do Sítio Muritiba, o projeto tem o apoio da UESB, do Programa de Pós-Graduação em Agronomia, e da Casa do Mel e Meliponário da UESB, sob responsabilidade de Generosa Souza Ribeiro. A orientação da pesquisa é das professoras Raquel Pérez Maluf e Aldenise Moreira.

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TÉCNICA Caixas de abelhas nativas próximas da plantação: ausência de ferrão facilita manejo (Crédito:Divulgação)

Os insetos produtores de mel são tão importantes para a agricultura que a ONU decretou o 20 de maio como o Dia Mundial das Abelhas. Segundo a FAO, os animais são responsáveis por 85% da polinização da natureza e 70% das culturas agrícolas, o que inclui os morangos. A ação dos pequenos insetos garante variação genética, bom desenvolvimento e reprodução das plantas, além do equilíbrio dos ecossistemas. “É de suma importância preservá-los, pois eles garantem a alimentação do planeta”, recorda Priscila. Ela ainda comenta sobre a relação direta entre abelhas e morangos: “O fruto faz a autofertilização, mas não consegue fecundar todos seus estigmas e muitas vezes apresenta deformação. As abelhas vêm para ajudar nessa disseminação”. Segundo a Embrapa, a polinização diminui a deformação em 76%, aumenta a doçura em 16% e o peso em 13%. Traz ainda uma coloração intensa e maior prazo de prateleira.

A pesquisadora lembra que os resultados do estudo também podem contribuir para a cadeia do subproduto mais importante dos animais: “O mel das nativas vem adquirindo um valor agregado no mercado. Além de beneficiar a polinização, a pesquisa permite lucros maiores para o produto nacional”. Sorlange está curiosa para conhecer o mel de morango. E quem não estaria? “A flor do morango é branca, então necessariamente vai gerar um mel mais claro. É ela que define a cor”, explica. Ela gostou tanto da experiência que já está atrás de construir as próprias caixas para a próxima temporada: “É gratificante ver que a ideia deu certo e trabalhar sabendo que você realmente está colocando produto de qualidade na mesa das pessoas”.

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