Comportamento

Arte para vestir: como estilistas e artistas plásticos trazem mais significado a moda

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Inspirada em Rubem Valentim, coleção da Dane-se respeita a originalidade do pintor e escultor baiano (Crédito: Divulgação )

Por Ana Mosquera

A relação entre arte e moda é histórica. Se em 1956, na França, o designer Yves Saint Laurent criava a Mondrian Collection com base nas obras do pintor modernista de mesmo nome, no Brasil da década de 1960 Lygia Clark e Hélio Oiticica convidavam os espectadores a vestirem suas criações, levando-os às mais diferentes sensações. Ao longo das décadas, a interação entre artistas e estilistas, escultores e grifes – de pequeno ou grande porte – prosseguiu. Os próprios designers passaram a se unir às marcas de decoração para, de tempos em tempos, transportar a moda para dentro das casas. Serve de exemplo Alexandre Herchcovitch, que, após dez anos, volta à Tok&Stok com a famosa série “Caveira” estampada em objetos variados. Expressões do comportamento humano, moda e arte transcendem a questão estética quando estão unidas, refletindo ainda mais os aspectos sociais, políticos e econômicos da sociedade.

O artista Rubem Valentim: expoente do construtivismo usou geometria para reproduzir cultura afro-brasileira (Crédito:Divulgação )

Tempo e espaço

“A cada coleção promovemos não só mais uma peça de roupa, mas propagamos história e cultura. Nós espalhamos um legado”, diz Daniel Moreira, sócio-fundador da Dane-se. A marca brasiliense – que já fez parcerias com nomes como J. Borges e Athos Bulcão – foi pioneira ao criar uma coleção que homenageia o pintor e escultor Rubem Valentim, expoente do construtivismo e da arte brasileira, falecido em 1991.

Dos mais de dois mil trabalhos disponibilizados com exclusividade pelo instituto dedicado ao artista baiano, quinze foram escolhidos como referência: o resultado são trinta peças com reproduções fiéis e outras vinte tendo suas cores e características como base. A presença da geometria de Valentim nas roupas, de maneira concreta ou abstrata, não só atravessa décadas como gerações. “Quando um adolescente vê os modelos de um estilista no TikTok, ele observa também seus ideais e inspirações. A conexão se dá não só por texturas e cores, mas pelo que aquela pessoa representa”, diz Lucius Vilar, designer e professor da Faculdade Santa Marcelina e do Istituto Europeo di Design (IED) São Paulo.

Acima, “Os Parangolés”, de Hélio Oiticica, convidam o espectador a vesti-los. Abaixo, “O Eu e o Tu”, da série Roupa-Corpo-Roupa, de Lygia Clark, promove discussões de gênero e troca de sensações entre homens e mulheres. (Crédito:Divulgação )
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Influenciado pelos relacionamentos humanos – tendo o amor em tempos difíceis como mote –, o ilustrador Yuval Robichek criou desenhos exclusivos para dez itens da grife brasileira UMA X, linha agênero e sustentável da UMA. “Cada peça conta uma história de forma inesperada e as ilustrações saem de bolsos, da abertura de zíperes ou da manga de camisetas, provocando o espectador”, diz Vanessa Dawidowicz, idealizadora da marca.

A distância de países não impediu o alinhamento entre os parceiros. “Trabalhamos em estreita colaboração para que houvesse um equilíbrio, que cada peça carregasse uma história e que as ilustrações ocupassem os tecidos de forma harmônica, mantendo a integridade da arte”, disse Robichek à ISTOÉ.

Pouco afeito às aparições públicas, o criador israelense ocupa espaços além dos tradicionais, tendo suas obras em revistas, livros e murais de Veneza, Cremona, Xangai, Tel Aviv e Bruxelas.

Não são só as marcas pequenas que se beneficiam com as parcerias. “No último ano, a coleção da Louis Vuitton com a artista japonesa Yayoi Kusama ficou praticamente esgotada, e as pessoas andavam nas ruas carregando seu universo lúdico”, diz Vilar. Como afirmou Oscar Wilde, “a vida imita a arte” — e parece que também o faz com a moda.

Após dez anos, o estilista Alexandre Herchcovitch volta à Tok & Stok com a linha “Caveira” (Crédito:Divulgação )