O incansável Vini Jr. promete mais ativismo: “Sou algoz de racistas”
Ponta-esquerda do Real Madrid e da Seleção Brasileira segue na luta contra o racismo enquanto aguarda como favorito o prêmio de maior craque do futebol em 2024
Por Denise Mirás
Basta percorrer o Instagram de Vini Jr., com mais de 48 milhões de seguidores, para se ter ideia do tamanho da luta que o jogador brasileiro assumiu contra o racismo. Na mesma primeira semana de junho, quando levou o Real Madrid ao 15º título da Champions League e foi escolhido como o melhor do campeonato pela UEFA, sua rede social mostrava milhares de parabéns a ele — mas também fileiras de memes com macacos postados pelos haters. Em meio às denúncias do ponta-esquerda e cobranças de punição contra os ataques de ódio em uma Europa cada vez mais extrema, a mais bela resposta que ele dá é em campo, com uma trajetória fabulosa.
Perto de completar 24 anos em 12 de julho, já é apontado como favorito à Bola de Ouro — tradicional prêmio da revista France Football ao melhor do mundo na temporada, com cerimônia marcada para o Théâtre du Châtelet, em Paris, em 28 de outubro.
O sorriso aberto é marca registrada de Vinicius José Paixão de Oliveira Junior, nascido e criado em São Gonçalo, no Rio de Janeiro, revelado como fenômeno já nas categorias de base do Flamengo e projetado como estrela do Real Madrid assim que pôde estrear como profissional no time espanhol, com 18 anos.
Mas a mágoa por insultos e ataques transbordou em lágrimas durante coletiva da Seleção Brasileira em março deste ano, em Madri, antes de amistoso contra a Espanha. Se fosse só por ele, disse, teria desistido de enfrentar os racistas, mas decidiu continuar na luta para que “pessoas negras possam ter uma vida normal”, como destacou.
E que luta.
• impossível não se chocar com a cena do boneco enforcado em uma ponte da capital espanhola, em janeiro deste ano, com a camisa 20 do brasileiro.
• As manifestações de ódio contra ele se intensificaram em 2023, à medida que o jogador seguiu reagindo aos gestos de torcedores e criticando a contemporização do mundo do futebol em relação ao racismo.
• Em 21 de maio do ano passado, na partida em que o Real Madrid enfrentou o Valencia no estádio de Mestalla, torcedores chamaram Vini Jr. de macaco e outras ofensas desde a chegada do ônibus e durante todo o primeiro tempo, como relatou o goleiro Courtois, até o momento em que a emissora DAZN mostrou quem xingava o jogador.
• Em campo, Vini Jr. denunciou os insultos ao árbitro e recebeu apoio do técnico Carlo Ancelloti, que reclamou de falta de atitudes severas de dirigentes contra o racismo. De maneira surpreendente, o jogador que havia sido vítima é quem foi expulso, acusado de reagir a um adversário.
• Em março deste ano, quando voltou ao estádio do Valencia, Vini Jr. foi ostensivamente insultado, mais uma vez.
Fora da prisão
Três dos racistas flagrados pela câmera da DAZN foram sentenciados por crime de racismo na segunda-feira, 10, e condenados a oito meses de prisão. No entanto, a pena será cumprida em liberdade, pois são “primários com menos de dois anos de sentença”, segundo o código penal espanhol. Foram mantidas as multas e a proibição de entrar em estádios por dois anos. Vini Jr. disse que “muitos pediram que ignorasse” a situação, que “sua luta era em vão”, e que “deveria se limitar a jogar futebol”.
Ele não desistiu — e não está sozinho.
Na semana passada, quando já estava com a Seleção Brasileira em Orlando, nos EUA, para a Copa América (de 20 de junho a 14 de julho), Vini Jr. recebeu a homenagem de um clipe de 17 minutos lançado no dia 4, no Youtube — Os Pretos no Devido Lugar. O vídeo teve mais de um milhão de visualizações em apenas 24 horas. Ludmilla, MC Ryan SP, MC Hariel e Ice Blue, dos Racionais, contam a vida de Vini Jr., da infância até agora.
Essa não é a história apenas de Vini Jr. na Espanha. Vem de anos e é recontada por jogadores de várias origens e nacionalidades, no Brasil, na Itália, na França, no norte da África, na Austrália. Ele sabe bem disso.
Daí a declaração, após a inédita condenação dos torcedores do Valencia pelos ataques de ódio: “Não sou vítima de racismo. Sou algoz de racistas. Essa primeira condenação penal da história da Espanha não é por mim. É por todos os pretos”.
Estava falando de Grafite, Aranha, Rafael, Richarlison, Roberto Carlos, Hulk, Ronaldo Fenômeno, Webó, Koubaly, Balotelli, Sterling, Hudson-Odoi, Rose, Gouano, Osei-Tutu e Eto’o — entre tantos outros.