Comportamento

Abelhas: como pode um inseto ser tão importante para a economia?

Muito além do pote de mel e em meio à liberação de agrotóxicos letais, projetos lutam pela sobrevivência dos insetos polinizadores, provando sua importância para a biodiversidade e as culturas agrícolas, como a do café especial

Crédito: Acervo Nescafé

Polinização assistida: florada e maturação uniforme dos grãos resultam em bebida com mais dulçor e nuances sensoriais (Crédito: Acervo Nescafé)

Por Ana Mosquera

Responsáveis pela polinização de 85% das florestas e 70% da agricultura (um terço dos alimentos à mesa), as 3.000 espécies de abelhas espalhadas pelo Brasil dão ao País o primeiro lugar em variedade dos insetos no mundo. Ainda muito associados a uma única espécie – a Apis mellifera, ou abelha africanizada, com listras e ferrão -, os polinizadores lutam para alcançar visibilidade e segurança por meio de outros agentes dispersores. São eles ativistas, acadêmicos, produtores rurais, cozinheiros, empresários. Seja em caixas inseridas em cafezais ou espaços urbanos, a presença dos insetos só acarreta benefícios: do aumento da produtividade agrícola à conscientização sobre a preservação da biodiversidade.

“As abelhas ficam em um frenesi quando sai a florada, como o beija-flor, entre uma flor e outra”, diz o produtor de cafés especiais Luís Carlos Gomes, que sentiu as benesses da implantação dos insetos em sua fazenda em Santa Teresa, no Espírito Santo. “Elas são fundamentais, sobretudo para o conilon, que depende da polinização cruzada”, diz ele, referindo-se à variedade do grão típica do estado.

O agricultor integra o projeto Colmeia, de Nescafé Origens do Brasil, que conecta apicultores e cafeicultores do País. Desde 2021, mais de 1.000 caixas com 60 milhões de abelhas já comandaram a polinização assistida executada pela Agrobee, e só em 2024 houve aumento de 6,3% nas fazendas participantes.

“Um dos pilares da agricultura regenerativa é a manutenção da biodiversidade. Quando optamos por ações sustentáveis, aumentamos a produtividade sem a necessidade de incluir defensivos nitrogenados, diminuindo a pegada de carbono”, diz Taissara Martins, gerente de sustentabilidade e coffee expertise da Nestlé. “O produtor precisa ter a responsabilidade de não prejudicar as abelhas. Há relatos de colmeias dizimadas pelo uso inadequado de agroquímicos”, acrescenta Gomes.

A legislação nem sempre contribui: há cerca de um mês a Justiça Federal suspendeu a decisão do Ibama de restringir o uso de agrotóxicos à base de tiametoxam – inseticida muito prejudicial aos insetos, sobretudo os nativos, segundo um estudo da UFSCar, UNICAMP e UNESP.

Em ação conjunta com órgãos ambientais, os pesquisadores agora atuam na criação de um protocolo inédito. “O Ibama tem um sistema de avaliação de risco para abelhas na América Latina, muito similar ao adotado na Europa e nos Estados Unidos para registro de agrotóxicos. A política pública tem de estar baseada em um padrão e isso nós não tínhamos ainda para as espécies nativas”, segundo Roberta Cornélio Ferreira Nocelli, coordenadora do Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento de Métodos para Testes de Toxicidade em Abelhas Nativas Brasileiras junto a órgão internacional.

Faz zumzum, mel e mais

“O que as abelhas fazem de mais importante não é produzir mel e outros produtos, é polinizar e preservar o meio ambiente. Enquanto as africanizadas trabalham mais na agricultura, as nativas são fundamentais para a regeneração da vegetação brasileira”, diz Eugênio Basile, idealizador da MBee, ao lado de Márcia Basile.

A atividade econômica impulsiona a preservação, somada às ações educativas, como a distribuição de caixas de espécies nativas em restaurantes e outros espaços – até agora foram mais de 150. “Elas são colocadas de modo bem visível e as pessoas recebem treinamento para saber que aqueles insetos não representam riscos, por não terem ferrão. É para as crianças se aproximarem”, diz Márcia.

Longe do campo, elas polinizam as ruas e, de uma única colmeia, podem resultar várias, no fenômeno conhecido como enxamear.

Nas cidades, elas ainda lutam contra a poluição e os inseticidas lançados nos chamados “fumacês”. “A jataí é super resistente. Ela tem uma força de vida, apesar de ser minúscula.” São resilientes, as abelhas no Brasil.

(Acervo Nescafé; Mbee; Reprodução/@Jereboas)
(Acervo Nescafé; Mbee; Reprodução/@Jereboas)
(Acervo Nescafé; Mbee; Reprodução/@Jereboas)

Ao alto, apicultor com Apis mellifera, abelha africanizada. Ao centro, a idealizadora da Mbee, Márcia Basile, e a chef Simone Izumi. Acima, mel da nativa da espécie tucano, da Reserva Extrativista Tapajós, do projeto Reenvolver.