Cultura

É hitmaker que chama? Série conta história de Sullivan e Massadas

Acostumados aos bastidores, Michael Sullivan e Paulo Massadas, uma das mais bem-sucedidas duplas de compositores no Brasil, ganha os holofotes em série espetacular

Crédito: Divulgação

Michael Sullivan (à esq.) é de Pernambuco, Paulo Massadas, do Rio de Janeiro: combinação perfeita de estilos do País (Crédito: Divulgação )

Por Felipe Machado

Se fosse realizada uma pesquisa hoje no Brasil, a maioria das pessoas não saberia dizer quem são ou o que fazem Michael Sullivan e Paulo Massadas. Bastaria assobiar algumas de suas melodias, no entanto, para que os dois fossem imediatamente identificados. Reis absolutos das paradas de sucessos nos anos 1980, a dupla de compositores teve canções gravadas por artistas de todos os gêneros, de Xuxa a Roberto Carlos, de Tim Maia a Gal Costa. Ao todo, escreveram mais de 700 músicas, trinta delas para trilhas sonoras de novelas da TV Globo.

Pois esses grandes personagens, até hoje confinados aos bastidores da fama, são os protagonistas de Sullivan & Massadas: Retratos e Canções, série com direção de André Barcinski e argumento de Pedro Bial, disponível no streaming Globoplay.

A linha mestra da produção de cinco episódios é a entrevista com os músicos, mas há depoimentos de “clientes” como Roberto Carlos, Xuxa e Fagner, além de personalidades da TV, como José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, da Globo.

Se fosse lembrar aqui de todas as canções de Sullivan e Massadas que chegaram às paradas, essas páginas seriam espaço insuficiente. Mas impossível não citar pérolas como “Um Dia de Domingo”, gravada por Gal Costa e Tim Maia; “Deslizes”, cantada por Fagner, “Talismã”, com Leandro e Leonardo, “Joga Fora”, interpretada por Sandra de Sá, “Estranha Loucura”, com Alcione, “Me dê Motivo”, com Tim Maia.

“Whisky a Go Go”, verdadeiro hino pop na voz do Roupa Nova, serviu de inspiração para a novela Um Sonho a Mais, de 1985. O fenômeno não parou aí: com hits como “É de Chocolate” e “Lua de Cristal”, para Xuxa, e “Uni-duni-tê”, do Trem da Alegria, a dupla revolucionou o potencial da música infantil, que inexistia em termos de mercado.

Xuxa encomendava letras sobre sonhos, amor e amizade: “As pessoas achavam que as músicas eram minhas” (Crédito:Divulgação )

Para o diretor André Barcinski, o maior desafio foi justamente escolher quais, entre tantas músicas, mereceriam abordagens detalhadas.

“Foi muito complicado definir o que entraria na série. Esse tributo vai mostrar ao público a importância que eles tiveram e ainda têm nessa indústria”.

Com o projeto, Barcinski se consolida como porta-voz de um lado menos glamouroso da música brasileira. Lançou biografias do Sepultura e do cantor Nelson Ned, além da obra Pavões Misteriosos, com os bastidores da MPB e do rock nas décadas de 1970 e 1980.

Lançou ainda A História Secreta do Pop Brasileiro, que narra a saga de grupos como o Carbono, músicos de estúdio que gravaram com os maiores artistas do País e nunca haviam sido reconhecidos.

Com a nova série, Barcinski promove justiça ao direcionar o holofote sobre essa dupla que deixou a marca na cultura brasileira — e que continua a emocionar multidões com suas canções.

Michael Sullivan e Paulo Massadas
Compositores

“A canção cria asas e não é mais sua”

Como é a dinâmica da dupla? Um escreve a letra e o outro faz a música, ou o processo depende da canção?
Massadas Os dois faziam letra e música, mas logo percebemos o lado mais forte de cada um. As melodias do Sullivan acertam no alvo, trazem uma energia muito forte. Em 95% dos casos, ele fez a melodia e eu, a letra.

As melhores músicas são aquelas que saem de uma vez só? Ou vocês gostam de ficar burilando, aperfeiçoando, durante muito tempo?
Sullivan A melodia tem que sair naturalmente. Às vezes vem uma ideia, pensamos no cantor e vamos em frente. Foi assim com “Me dê Motivo”. Tim Maia tinha ouvido “Frente a Frente”, nossa primeira música, e pediu algo bem emotivo, com sofrimento. Dois dias depois mandamos a fita para ele. Foi bem no início da nossa carreira. Ganhamos todos os prêmios do ano.

Como conseguem compor em estilos tão ecléticos, do sertanejo ao rock?
Sullivan Acho que é uma ligação direta com Deus, só isso explica. Tocávamos de tudo nas bandas de baile, por isso essa pluralidade.

Faz diferença compor para um artista famoso ou isso não importa?
Massadas A gente ouve, conhece o artista, analisa. E incorporamos o seu estilo. Temos muito carinho pelos artistas, queremos sempre fazer a melhor música possível para eles.
Sullivan Às vezes fazíamos a música para um cantor, mas ia para outro. Deslizes era para o Roberto Carlos, mas o disco já estava pronto. Quatro anos depois, o Fagner gravou e entrou para o “clube do milhão”, foi um sucesso.

Acreditam em inspiração? Ou o que importa é sentar e realizar o trabalho?
Sullivan Compor é um exercício diário. Faço isso até hoje, pego o violão e fico imaginando melodias.
Massadas A inspiração já está com você 24 horas por dia, é só apertar um botão. Não é mágica, é um processo de aprendizado que você desenvolve ao longo da vida. Como um atleta, que sente que pode ganhar uma corrida. Aí ele treina até ganhar. Quando há autoconfiança, você simplesmente faz. Já fizemos três músicas em uma noite. Não é genialidade, é experiência.

Já tiveram medo de não conseguir atender a alguma encomenda?
Massadas Ficamos com medo por dez segundos, depois vamos para cima e resolvemos. Dá sempre certo.
Sullivan O primeiro minuto é o pior, mas logo vem a melodia, o tema. É uma questão de tempo. O juiz apita o início, mas sabemos que vamos ser vitoriosos no final. Mas não gosto da palavra encomenda, ninguém sabe qual é o segredo do sucesso.

Quem são os maiores compositores?
Massadas Somos fãs dos Beatles.
Sullivan Amo Vicente Celestino, Angela Maria, Altemar Dutra, Cauby Peixoto, Little Richard, Chubby Checker. Mas somos mesmo Beatlemaníacos. Sei todas as músicas, ouço todo dia pelo menos uma canção dos Beatles.

Massadas é do Rio de Janeiro e Sullivan, de Pernambuco. A origem influenciou no trabalho?
Sullivan Como viemos de lugares diferentes, foi uma combinação perfeita. Fizemos todos os estilos, do xote ao rock. Minha base é Luiz Gonzaga e Dorival Caymmi.

Nunca tiveram ciúmes dos artistas?
Massadas Os cantores faziam coisas tão lindas que ficávamos apaixonados.
Sullivan O ciúme é normal, mas é da vida. Você tem que entregar. A canção, quando você compõe, cria asas e ganha o seu destino. Não é mais sua.