Economia

Entenda como as fintechs impulsionam o agronegócio

Estimuladas pelos juros mais baixos, as empresas de inovação tecnológica prometem incrementar o agronegócio e contribuir para que esse setor continue sendo em 2024 o protagonista da economia brasileira

Crédito: Divulgação

Pelo blockchain, ativos do campo poderão ser fracionados e oferecidos a investidores com muita segurança (Crédito: Divulgação )

Por Regina Pitoscia

RESUMO

• Uso de IA, geolocalização e blockchain, além de agilidade e proximidade com o cliente, são diferenciais competitivos
• Confirmada a projeção de queda da Selic, é possível que surjam novos unicórnios
• Agro é aposta de crescimento das fintechs por ser setor de grande capital e altamente tecnológico
• Para consultor, os momentos ruins passados em 2022 e 2023 serviram para fortalecer o segmento
• Fintechs de crédito amadureceram: ficaram mais seletivas para evitar calotes
• Facilitação de pagamentos, movimentações financeiras e pagamento digital são os principais serviços das 36 agfintechs do País

 

As perspectivas são promissoras em 2024 para as fintechs, empresas que usam inovações tecnológicas para oferecer serviços financeiros a diferentes setores da economia. Sustentadas por pilares de agilidade, custos mais baixos e menor burocracia, essas empresas se tornaram competitivas e tiveram um crescimento meteórico em 2021. Nos anos seguintes, no entanto, com a alta dos juros aqui e lá fora, elas viram secar as fontes de financiamento e amargaram tempos de vacas magras, muitas desapareceram.

Atualmente, 1.663 fintechs estão ativas no País e entre elas há também os casos de sucesso, alguns foram de tal ordem a ponto de permitirem o surgimento de unicórnios, quer dizer, de empresas que alcançaram valor de R$ 1 bilhão antes mesmo de abrir seu capital e oferecer ações ao mercado.

Diante de um cenário em que a taxa Selic deve continuar caindo e aquecendo a economia, os investimentos devem aumentar no segmento e empresas dessa magnitude poderão surgir nos próximos meses. A aposta é de que estejam ligadas ao agronegócio, porque, além do protagonismo na economia brasileira, é também um dos setores mais avançados no uso de novas tecnologias.

As fintechs passaram por um processo de amadurecimento, em que foram pressionadas a apresentar resultados e tiveram de abandonar o modelo de crescimento à base de clientes sem retorno aos investidores, explica Willer Marcondes, sócio da Strategy&, braço de consultoria estratégica da PwC (Pricewaterhousecoopers).

De acordo com pesquisa feita pela consultoria em parceria com a Abfintechs, associação que representa o setor, “as empresas foram desafiadas entre 2022 e 2023, mas mostraram resiliência, se adaptaram, ganharam escala do ponto de vista de tamanho, de receita e funcionários ao mudar para segmentos mais atrativos, mais rentáveis, e se saíram bem. Agora vão colher os frutos”, afirma o consultor.

Na mesma linha de mudanças, outro estudo da PwC revelou que as fintechs de crédito passaram a ser mais seletivas na concessão de financiamentos, além de dar preferência a segmentos de menor risco, como o consignado, ou a operações de correspondência bancária. Apesar de ter sido um ano difícil, as fintechs conseguiram crescer 9% na sua carteira de crédito no ano passado, aponta Marcondes.

(Divulgação)

“Fintechs estão prontas para colher os frutos em 2024.”
Willer Marcondes, sócio da Strategy&

Mais fatores corroboram a ideia de que os ventos vão soprar a favor dessas empresas de tecnologia em 2024. “Possivelmente teremos um retorno mais intensivo dos investidores, condições mais favoráveis para processos de abertura de capital, de refinanciamento ou novas captações, em um cenário econômico mais atrativo”, diz o consultor da PwC.

Na trajetória de crescimento, as fintechs vão poder contar com mão de obra qualificada, decorrente da redução de quadros promovida nos últimos anos pelo setor, para desenvolver novos projetos e intensificar os temas de crescimento com inovações.

Nesse sentido, a atuação do Banco Central é também motor propulsor para a evolução do segmento com a consolidação do Pix, do open finance e uma agenda acelerada para a Drex, a moeda digital do País, que ainda este ano deve entrar em operação-piloto. “Algumas fintechs se posicionaram em consórcio junto com grandes bancos para explorar essas oportunidades” afirma Marcondes.

Para Eduardo Fuentes, diretor de Research da plataforma de inovação Distrito, setores relacionados à tecnologia verde, como greentechs, biotechs e agtechs (fintechs especializadas no agronegócio), devem ganhar destaque este ano, diante da crescente urgência de conciliar eficiência e sustentabilidade.

“As fintechs surgiram como resposta às lacunas deixadas pelos bancos tradicionais, especialmente na oferta de crédito. Sua evolução fica evidente pela crescente rapidez e eficiência na concessão de crédito, algo que os bancos tradicionais podem levar até quatro meses para realizar, enquanto algumas agfintechs conseguem concluir o processo em até 48 horas.”

O uso de tecnologias avançadas, como inteligência artificial, geolocalização e blockchain, tem sido um diferencial. “Essas tecnologias possibilitam uma análise de crédito mais rápida e precisa, democratizando o acesso ao crédito para os produtores rurais e permitindo que startups surjam com soluções competitivas”, ressalta o diretor.

Marcondes, da Strategy&, também aposta suas fichas em surgimento de unicórnios no segmento agro, especialmente entre fintechs focadas na tecnologia blockchain, que traz mais segurança às operações.

Seguro em alta

Mesmo com essas vantagens exibidas pelas fintechs, alguns dados comprovam a força que ainda tem o Banco do Brasil, tradicional e uma referência com operações no setor.

• Informações do Banco Central dão conta que, em setembro de 2023, o BB detinha 51% de participação nos financiamentos destinados ao agronegócio.

• Nos créditos direto ao produtor rural (crédito agro à Pessoa Física), a participação de mercado estava em 57,2%.

• Também no ano passado, o BB apresentou o maior desembolso de crédito rural da história: foram liberados R$ 195 bilhões em mais de 612 mil operações, sendo que desse total R$ 22 bilhões foram destinados à agricultura familiar.

Para se contrapor a essa liderança do banco público, as fintechs do agro avançam com parcerias e plataformas de conexão.

A PwC AgTech Innovation, situada na cidade de Piracicaba, interior de São Paulo, é o maior hub de inovação aberta do agronegócio no Brasil e um dos maiores do mundo, com mais de mil empresas conectadas e mais de 100 empresas corporates que atuam em toda a cadeia do agro.

Habituado a lidar com as fintechs diariamente, Michel Franco, coordenador na AgTech, aponta diferenciais competitivos das empresas de tecnologia na conquista dos clientes. Entre os principais estão:
a velocidade com que atuam, o que permite também mudar rapidamente de rota, assim que a situação exigir;
capacidade de estarem mais próximas do cliente, identificar seus problemas e, com isso, oferecer soluções personalizadas a custos mais baixos.

Uma movimentação que é percebida pelos bancos tradicionais: “Alguns bancos têm se posicionado na inovação e olhado com atenção para o esquema de colaboração com as fintechs, e isso pode ser um diferencial de mercado”.

Fuentes, da Distrito, informa que existem hoje no País, 36 agfintechs, que juntas receberam pouco mais de US$ 96,6 milhões em investimentos. Segundo ele, os principais serviços oferecidos são facilitação de pagamentos, movimentações financeiras e plataformas de pagamento digital.

Mas é o setor de seguros agrícolas que se mostra em expansão. Produto que ganhou relevância devido às mudanças climáticas, condição que permite o desenvolvimento de produtos inovadores. “As agfintechs podem utilizar dados meteorológicos e informações de cultivo para criar apólices de seguros sob medida, proporcionando assim estabilidade financeira aos agricultores frente a imprevistos”.