Com quantas armas atira o Lira?

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Carlos José Marques: "Lira não se faz de rogado. Avisa que a insatisfação continua generalizada. Aponta o revólver para o adversário Lula e tripudia dele, alegando que falta ao demiurgo de Garanhuns capacidade elementar para articular uma tropa fiel e consistente" (Crédito: Divulgação)

Por Carlos José Marques

O gatilho mais rápido e letal do faroeste brasiliense está com o cartucho cheio. É bala para todo lado. O deputado Arthur Lira, presidente da Câmara, realmente não economiza munição. Vai fazendo vítimas aos montes, rendendo inimigos e agindo como uma espécie de xerife.

Dominou geral. Colocou de joelhos até o paladino do Planalto, o destemido Lula da Silva, em um duelo épico que quase levou tudo a perder, paralisando o governo, revendo a estrutura de poder e enterrando as chances de uma gestão minimamente republicana daqui para frente.

Foi por pouco mesmo. Para evitar o pior, a rendição se deu de maneira incondicional. Lira, no comando do Congresso, realizou a jogada que no pôquer é conhecida como “all-in”. Levou tudo.

Quer mais dinheiro, mais emendas, mais cargos. Pede até a cabeça dos ministros resistentes aos seus ditames. O movimento do parlamentar é sólido e repleto de apoios de correligionários e aliados.

Na cruzada de submissão às exigências do vencedor, Lula já pagou mais de R$ 5 bilhões em emendas, quase dois terços delas apenas na fatídica noite do confronto da quarta-feira, 31, em que esteve prestes a depor as armas.

Não há mais quem faça frente ao furor predatório do bando de Lira. Com requintes de maldade, repete-se o enredo assistido na era Bolsonaro, outro franco atirador que teve de entregar o ouro em troca da cadeira e para ter sobrevida política.

O bloco do Centrão, que Lira lidera, ameaça derrubar toda a Esplanada, caso não receba o que pede. No bang-bang, mocinhos e bandidos se misturam para ver quem fica com mais verba.

Lira não se faz de rogado. Avisa que a insatisfação continua generalizada. Aponta o revólver para o adversário Lula e tripudia dele, alegando que falta ao demiurgo de Garanhuns capacidade elementar para articular uma tropa fiel e consistente.

Suprema humilhação para quem se imaginava o delegado da praça, responsável pela ordem. Vai virar pau mandado? Muitos dizem e apostam que sim.

O petista já vem negociando mudanças estratégicas para abrir espaço à cavalaria de Lira. A tensão segue no limite. Derrotas seguidas e atrasos propositais na votação de medidas provisórias viraram uma constante.

A cúpula de Estado acendeu o alerta para um colapso iminente na gestão. Buscou contra-atacar. Escolheu o campo legal. Botou a polícia atrás de auxiliares do congressista. Deixou o adversário fulo de raiva e deve aguardar desconfiado porque vem chumbo grosso de volta.

Isso é certo. Lira, com a habitual desfaçatez de quem prepara armadilhas sorrateiramente, tenta se isentar de culpa pelos futuros fracassos esperados na pauta federal. Avisa que não é com ele – quem diria! – que os assuntos serão resolvidos.

No fogo cruzado das denúncias de corrupção passiva de um lado e de incompetência do outro, perde o Brasil. É preciso calibrar a estratégia do mandatário e conter, na teoria, as manobras do sabotador da República.

Lira, definitivamente, não joga a favor do País. Tem um aparato bélico digno de nota e o usa, invariavelmente, para arrombar cofres públicos e saquear os recursos de projetos prioritários que serão escoados a outros fins menos nobres.

Não resta opção a Lula que não a de reconhecer a capitulação. Celeridade nos desembolsos é agora o único artifício, paliativo, que atenua a voracidade das feras do Parlamento.

O governo está disfuncional. Não sabe para onde correr, nem enxerga com clareza as ameaças a despontar pela frente.

O sufoco das negociações denuncia muito da inabilidade e improviso tático. Lira, decerto, colocou a mão na torneira das reservas e vai controlar o fluxo ao bel prazer. Do jeito que entende, de acordo com as necessidades e vontades pessoais, tomará o protagonismo das decisões e rumo nacionais.

Virou, por assim dizer, um “sócio” do Executivo, sem ter sido eleito ou escolhido para tal. Um intruso incômodo, quase usurpador. E consegue o que quer dada a fragilidade evidente do governo.

A caneta e a cadeira de comando possuem informalmente novo dono e o sentido da palavra governabilidade tomou outra dimensão. O presidencialismo de coalizão chafurdou na lama. Tá na base da cooptação. Vai funcionar segundo ordens de um pistoleiro frio e calculista, o Lira que caça cabeças por recompensa.