Internacional

Rússia: poder de Putin pode durar mais que o de Stalin na URSS

No comando da Rússia desde 2000, com duas mudanças na Constituição para possibilitar novos mandatos, o presidente ‘disputa’ a eleição de março para se manter na chefia do governo até 2036

Crédito: Sergei Guneyev

Putin: de agente da KGB, a polícia secreta da União Soviética, a espécie de 'czar' na Rússia (Crédito: Sergei Guneyev)

Por Denise Mirás

Com controle absoluto sobre o país, Vladímir Putin confirmou: tentará seu quinto mandado nas eleições de 17 de março, o que na prática equivale a uma presidência vitalícia da Rússia, porque ainda poderá concorrer a um sexto mandato, de acordo com a Constituição reformada em 2021. Assim, conseguiria se manter no cargo até 2036, quando estaria com 84 anos. O “czar” russo pode até ter adversários nominais, mas poucos acreditam que haverá outro nome na cédula eleitoral além de “Vladímir Putin”, com potencial para ultrapassar o recorde de 29 anos de poder do ditador Josef Stalin.

Em 2017 já se especulava que o presidente russo havia se tornado o homem mais rico da Europa, com fortuna estimada em torno de US$ 200 bilhões, entre contas bancárias e bens como superiates e mansões.

Denúncias sobre corrupção foram coletadas pela equipe de Alexei Navalny, líder da oposição que seria candidato nas eleições de março, mas que hoje segue preso em uma colônia remota no Ártico. O advogado foi detido em 2021, quando voltou à Rússia saído da Alemanha, onde se recuperou de tentativa de assassinato que sofreu por envenenamento, durante voo em 2020.

Vladímir Putin (acima) mantém seu principal adversário, Alexei Navalny (aqui), preso em condições extremas no Ártico (Crédito:Divulgação)

A jornalista Ekaterina Duntsova apresentou-se como candidata à presidência, defendendo o fim da guerra na Ucrânia e a libertação de presos políticos, mas viu sua candidatura impugnada por “irregularidades” em documentos.

• Evgueni Prigozhin, que comandou os mercenários do Batalhão Wagner na guerra na Ucrânia e se considerava candidato à sucessão de Putin, se viu frustrado e partiu com tanques e soldados marchando em direção a Moscou em 23 de junho de 2023. Desistiu do golpe de Estado acreditando em um acordo, mas dois meses depois estava morto, vítima de acidente aéreo. Foi mais um no rastro de sangue deixado por opositores de Putin, assassinados em circunstâncias nebulosas.

Sem adversários ‘disponíveis’, Putin deve levar a eleição de 17 de março

O “czar” Vladímir Putin comanda o país desde 2000 – apenas trocou de lugar com Dmitri Medvedev entre 2008 e 2012, mas seguiu governando, então como primeiro-ministro. Ex-agente da KGB e depois diretor desse serviço secreto, Putin entrou para o mais fechado círculo de poder russo em 1996, a convite do então presidente Boris Yeltsin. Mas esse sucessor de Mikail Gorbachov (o artífice da “abertura” do país) anunciou inesperadamente sua renúncia no discurso de 31 de dezembro de 1999, e Putin — seu primeiro-ministro — tornou-se presidente interino, depois referendado para o cargo em 2000.

Em 2012, Putin estava de volta à presidência. E como seus mais dois mandatos consecutivos se encerrariam em 2024, conseguiu um “acerto” com parlamentares e aprovou nova mudança da Constituição em 2021, para “zerar” sua permanência no cargo e poder concorrer a outros dois mandatos.

Com o início da guerra na Ucrânia, em fevereiro de 2022, Putin validou seu argumento de que era preciso manter a “estabilidade” no país. E, assim, anunciou sua candidatura à eleição presidencial de 17 de março de 2024, pelo quinto mandato.

Carlo Cauti, membro do IFL-SP e professor de Relações Internacionais, destaca: “O Putin tem o controle geral do país, da economia à imprensa, da segurança às Forças Armadas. Mas como são várias as etnias, línguas, religiões, os russos sabem que Putin é o menos pior, para manter a Rússia unida, sem se desmanchar”.

Além de autoritário, foi de dinástico a comunista e agora é personalista, observa, mas a Rússia resistiu às sanções ocidentais pela invasão da Ucrânia, sua economia da vida cotidiana não foi abalada e o país segue exportando petróleo. “Se Putin perder a guerra, a Rússia acaba, e a população russa é muito nacionalista. A democracia lá não é uma questão.”

Ditadores querem a eternidade

Aos 10 anos, Kim Ju-ae começa a aparecer ao lado do pai, o ditador norte-coreano Kim Jong-un (Crédito:AFP)

Não apenas Vladímir Putin deseja a ‘imortalidade’. Ao longo da história, muitos foram os que se valeram da força para permanecer no comando de seus países, com privilégios reservados a poucos.

Tradicionalmente corruptos e sanguinários, garantem o poder por décadas, como:
 Benito Mussolini na Itália,
Francisco Franco na Espanha,
e António Salazar em Portugal.

Ou contemporâneos do presidente russo, como:
Recep Erdogan, presidente da Turquia,
Aleksandar Lukashenko, presidente da Bielorrússia,
ou o primeiro-ministro Viktor Orbán na Hungria.

Outro representante da extrema-direita, encarregado de manter a dinastia, é Ferdinand Marcos Jr., o “Bongbong”, herdeiro de um dos facínoras mais conhecidos do Oriente.

Mas nada supera a excêntrica família Kim, 75 anos à frente da Coreia do Norte, com relatos de desaparecimentos e assassinatos de parentes como tios a irmãos, em circunstâncias ocultas sob notas oficiais. Kim Jong-un, no cargo herdado do pai Kim Jong-il desde 2011, no momento se mostra disposto a passar o bastão à filha Kim Ju-ae, que hoje estaria com 10 anos.