Economia

Analistas veem queda preocupante dos investimentos no Brasil

Recursos destinados à infraestrutura e à compra de máquinas e equipamentos caíram no último ano e permanecem em níveis historicamente baixos. Financiamentos do BNDES darão alívio, mas a solução depende da retomada do setor privado e da volta do dinheiro estrangeiro

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Setor da indústria de máquinas e equipamentos ficou defasado e perdeu competitividade (Crédito: Divulgação)

Por Regina Pitoscia

Não é de hoje que os investimentos destinados ao crescimento do País estão em trajetória de queda. Especialistas já consideram os últimos dez anos como uma “década perdida” na tentativa de aumentar a capacidade produtiva nacional e fazer a economia engrenar em uma recuperação sustentada. Em 2023, o Indicador Ipea apontou um investimento líquido negativo pela segunda vez, desde que foi criado em 1947, e retração de 3,4% até outubro.

Resultado de investimentos brutos insuficientes para cobrir a depreciação dos chamados bens de capital, quer dizer, bens usados na criação de outros bens como máquinas e equipamentos das fábricas, estruturas de prédios comerciais e residenciais e até o gado, pelo fornecimento de leite e carne.

São, portanto, propulsores no processo de desenvolvimento econômico, mas que estão sem fôlego dada a escassez de recursos tanto do setor público como do privado, ou que chegam do exterior.

Para este e os próximos anos, projeções da Tendências Consultoria mostram algum avanço, mas nada que indique ou suporte uma recuperação mais expressiva da economia nos próximos dez anos.

Depois de alcançar em 2013 o pico equivalente a 21% do PIB, os investimentos passaram a minguar.

“Em 2013, havia uma política de incentivos públicos, do BNDES em muitos setores, com investimentos na área de petróleo, complexos petroquímicos, construção de navios, que depois se mostraram inviáveis economicamente sem a ajuda do governo. Por isso, foram aos poucos sendo atrasados, paralisados, abandonados”, lembra a economista e sócia da Tendências Alessandra Ribeiro.

A partir de 2014, refletindo a forte recessão que atingiu o País, crises políticas e impactos da Operação Lava Jato, os indicadores de investimentos entraram em uma descendente.

Júlia Braga, do Ipea (Crédito:Divulgação)

“Queda dos juros reduz o custo e facilita o crédito.”
Júlia Braga, coordenadora de Acompanhamento e Estudos da Conjuntura do Ipea

O pior desempenho foi registrado em 2017, quando o total resvalou para 14,7% do PIB. No final desse ano, ressalta Alessandra, foi aprovado um teto para os gastos públicos com uma queda nos investimentos do governo.

Já a reação positiva em 2020 e 2021 esteve ligada diretamente à queda dos juros, que tornaram o crédito mais acessível, inclusive para o setor imobiliário, e permitiram uma reação da construção civil e a renovação de frotas no setor agrícola.

“A economia, que vinha crescendo até 2014 acima da média mundial, a partir de 2015 passa a crescer em ritmo inferior ao resto do mundo” afirma Julia Braga, coordenadora de Acompanhamento e Estudos da Conjuntura do Ipea.

Ambiente hostil

A projeção de queda dos investimentos em bens de capital, ou em linguagem mais técnica, Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), em 2023 é de 2%, segundo a Tendências.

As incertezas em relação à mudança de governo, à Reforma Tributária e à insegurança jurídica sobre sua regulamentação tiraram a competitividade do Brasil diante de outros países, constata Paulo Vicente, professor da fundação Dom Cabral.

Mas não são apenas esses os motivos. “Pela perspectiva de crescimento, o Brasil não é um local que mais está crescendo. Se você olhasse para as nações que mais crescem, muito provavelmente investiria em países como a Tailândia, Vietnã, Malásia ou México, que estão se beneficiando da fuga de investimentos da China.”

Mas, além disso, há problemas estruturais, destaca o professor, como:
• falta de logística,
• de mão de obra qualificada em todos os níveis,
• e a questão trabalhista, que é vista como um risco, com uma legislação “excessivamente” favorável ao empregado, gerando processos judiciais.

A economista Zeina Latif, sócia da Gibraltar Consulting, afirma que o ambiente de negócios é muito hostil no País, que além da questão tributária passa pelos desafios ambientais, com várias camadas de insegurança.

Para Gustavo Cruz, economista e estrategista-chefe da RB Investimentos, a desconfiança fiscal e o rebaixamento no grau de investimento do País também contribuem para retrair e afugentar os investidores externos.

O estrategista cita a pesquisa feita pela PwC e apresentada no Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, que corrobora o desinteresse de executivos pelas oportunidades de negócios no Brasil, que ficou fora da lista dos dez países preferidos para investimentos ao redor do mundo.

“Entre os emergentes, só o Brasil caiu, chegou a estar na quarta e agora está na 14ª posição.”

O setor mais castigado na última década por falta de investimentos foi a indústria de bens de capital, afirma Júlia Braga, do Ipea. “O que mais caiu foi o segmento de máquinas e equipamentos nacionais, então a indústria brasileira de bens de capital vai muito mal e perde espaço para equipamentos internacionais. O processo vai piorando, porque se essa indústria não se renova, fica defasada e perde produtividade e competitividade para o concorrente internacional.”

“Para 2024, os investimentos vão voltar um pouco, mas não se espera uma arrancada”, avalia Zeina. As linhas de financiamento do BNDES já aprovadas para infraestrutura, serviços de água, energia, esgoto, e ainda não desembolsadas devem ingressar no mercado este ano e contribuir para melhora de desempenho, lembra a coordenadora do Ipea.

No entanto, isso pode ser insuficiente para dar tração à economia, diante da pouca margem de manobra que o governo tem para investimentos. E principalmente pela aparente falta de apetite dos investidores estrangeiros, que ainda não estão se sentindo suficientemente seguros com a agenda econômica do País.