Brasileiros do Ano 2023

Brasileiros do Ano/ Segurança: Flávio Dino, a democracia contra o crime

Além de se contrapor à investida golpista, Flávio Dino costurou o diálogo institucional com os estados para se contrapor à violência e ao crime organizado

Crédito: Sérgio Lima

Flávio Dino: ideais republicanos e democráticos que demonstrou no Ministério serão levados ao STF, como membro da Corte (Crédito: Sérgio Lima)

NA SEGURANÇA PÚBLICA – Flávio Dino, Ministro da Justiça e da Segurança Pública

Por Marcos Strecker

Quando assumiu o Ministério da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino sabia que ocuparia um cargo estratégico. A pasta faz a interlocução do Executivo com todo o sistema judiciário e abriga em sua estrutura a Polícia Federal (PF) e a Polícia Rodoviária Federal (PRF), tendo a função de interligar as ações de Segurança Pública com todos os entes federativos. Nada disso intimidou esse maranhense de 55 anos, nascido em São Luís, que formou-se em Direito pela Universidade Federal do Maranhão.

Flávio Dino ingressou na magistratura após passar em primeiro lugar no concurso para juiz federal no Maranhão e presidiu a Associação Nacional de Juízes Federais (Ajufe). Ainda no Judiciário, exerceu a função de secretário geral do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e foi assessor da presidência do Supremo Tribunal Federal (STF), antes de seguir a vocação política.

Tornou-se deputado federal em 2006, pelo PCdoB (havia sido filiado ao PT). Em 2011, foi indicado por Dilma Rousseff para presidir a Embratur. Em 2014 e 2018, foi eleito e reeleito governador do Maranhão em primeiro turno.

Transferiu-se em 2021 para o PSB e, no ano passado, venceu a disputa para ocupar uma vaga no Senado pelo seu estado, transição que adiou para entrar no governo Lula. Por seu papel destacado no Ministério, recebeu uma nova missão: ocupará o posto mais elevado da Justiça, o de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).

“O slogan do governo federal é ‘União e Reconstrução’, mas se trata de construir o que efetivamente nunca existiu no Brasil”, afirma Flávio Dino sobre a tarefa hercúlea que recebeu para lidar com a sensível área do combate à violência e ao crime organizado.

À frente do Ministério da Justiça e Segurança Pública, ele começou sua gestão liderando a resposta enérgica, mas equilibrada, contra a invasão das sedes dos Três Poderes no 8 de janeiro.

Passada essa crise, precisou se deparar com outra emergência: os ataques a escolas que causaram comoção nacional. Em seguida, cresceram os episódios de violência em estados como Rio de Janeiro, Bahia e São Paulo. Ele acelerou o Plano de Ação e Segurança (PAS), lançado em julho.

Entre suas prioridades, estão:
• o combate à violência no ambiente escolar,
• o controle de armas,
• a proteção da região amazônica,
• a valorização dos policiais,
• e o endurecimento de leis envolvendo ataques à democracia. A nova prioridade fez o ministro declarar que “90% do seu tempo ministerial era dedicado à Segurança”.

O trabalho foi paciente e diligente. A comunidade de Segurança havia sofrido grande influência do bolsonarismo nos últimos anos.

O armamentismo havia sido estimulado, assim como a visão puramente repressiva. O ministro, ao contrário, priorizou o fortalecimento da prevenção, investigação e da atividade de inteligência. Foi uma aposta correta, mas que dependia de convencimento.

Ele não tinha dúvidas de que conseguiria a adesão para seu plano. Sua longa experiência no governo estadual, assim como seu traquejo no Congresso, ajudaram. “É um trabalho sério, com ações cotidianas, articuladas e publicizadas, mostrando a importância da descapitalização financeira das organizações criminosas, além do seu enfraquecimento bélico.”

O agravamento do quadro também o fez solicitar o auxílio das Forças Armadas, por meio de uma operação de Garantia da Lei da Ordem (GLO) em portos e aeroportos do Rio de Janeiro em São Paulo – uma medida que o presidente Lula tinha rechaçado anteriormente. “O objetivo é reforçar a Segurança Pública e atacar o poderio financeiro de organizações criminosas. O decreto de GLO vai valer até maio de 2024 e poderá ser prorrogado”, defende.

“Em função do princípio federativo, não é possível haver uma centralização, e, sim, uma coordenação baseada no diálogo”

Para coordenar as ações a nível nacional, o ministro recorreu ao seu poder de articulação. O objetivo foi fortalecer o Sistema Único de Segurança Pública (Susp), que, como ele aponta, induz ao modelo de compartilhamento de decisões, de investimentos recíprocos e, sobretudo, das operações com envolvimento de forças federais e estaduais.

Trata-se de uma tarefa delicada que exigiu muita negociação, já que a prerrogativa constitucional na área é dos estados. “A coordenação das ações é um grande desafio na medida em que existe a autonomia dos estados. Em face do princípio federativo, não é possível haver propriamente uma centralização nacional, e, sim, uma coordenação baseada no diálogo”, esclarece.

Por sua atuação, foi considerado um dos dois ministros mais fortes do governo. Flávio Dino diz que a resposta positiva da sociedade é fundamental, por isso ficou feliz com a homenagem. “Agradeço à ISTOÉ pelo reconhecimento, que compartilho com toda a equipe do Ministério da Justiça, assim como com todos os profissionais de Segurança Pública. É um trabalho diário, árduo, em um País marcado por uma violência estrutural derivada das desigualdades sociais e regionais. Esse tipo de homenagem ajuda a que toda a equipe fique motivada”, afirma.

Para ele, não há solução simples para um problema dificílimo que integra a cena brasileira há décadas. A afirmação ganha relevância porque o ministro foi alçado a desafios ainda maiores.

Indicado pelo presidente para ocupar uma vaga no STF, foi aprovado no plenário do Senado na quarta-feira, dia 13. Na Corte, ele reafirma que manterá o embate pelos ideais republicanos e democráticos que demonstrou no Ministério. “Esses valores são permanentes na minha vida. Contudo, é claro que o papel de ministro do STF tem muitas diferenças em relação a uma função política. Ou seja, a forma de atuação vai mudar”, disse.