Comportamento

‘En qué puedo ayudarle?’

Com aumento de 53% nas admissões entre janeiro e agosto de 2024, imigrantes, especialmente venezuelanos e cubanos, estão preenchendo posições escassas, aquecendo a economia e promovendo uma maior integração social e econômica nas regiões Sul e Sudeste do País

Crédito: Rogério Albuquerque

Mileidis, venezuelana, atua como analista de RH ajudando refugiados no Brasil (Crédito: Rogério Albuquerque)

Por Mirela Luiz

O Brasil está passando por uma significativa transformação em seu mercado de trabalho, refletida no aumento da contratação de imigrantes. Atualmente, cerca de 1,5 milhão de estrangeiros residem no País, sendo aproximadamente 650 mil refugiados ou solicitantes de refúgio. Dados recentes mostram que, entre janeiro e agosto de 2024, houve crescimento de 53% nas admissões de imigrantes, especialmente vindos da Venezuela e de Cuba. Esses profissionais frequentemente ocupam posições que não atraem trabalhadores brasileiros, promovendo mudanças nos padrões de emprego.

Conforme indicado pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), as regiões Sul e Sudeste do Brasil têm se beneficiado dessa nova dinâmica, com um aumento na oferta de oportunidades. Estudo da LCA Consultores revela que, até agosto de 2024, o Brasil acolheu 321 mil imigrantes com contratos formais de trabalho, representando o maior índice desde janeiro de 2020. Apesar de representarem apenas 0,6% do total de trabalhadores formais no País, o crescimento desse grupo é digno de atenção.

Marina Prieto, coordenadora do curso de Ciências Contábeis da Estácio, destaca que o Brasil possui políticas inclusivas que favorecem os imigrantes. Um exemplo é a Operação Acolhida, uma iniciativa do governo que, com o apoio de organizações internacionais, facilita o reassentamento e a integração dos migrantes, oferecendo abrigos temporários e orientações para a inserção no mercado de trabalho.

Organização apoia refugiados, conectando talentos estrangeiros ao mercado brasileiro (Crédito:Rogério Albuquerque)

A travessia até o Brasil representa uma oportunidade de recomeço para muitos imigrantes, como é o caso de Mileidis Alfonzo, que deixou a Venezuela em busca de melhores condições. “Cheguei ao Brasil no final de 2018, fugindo da crise em meu país”, relata. “Minha chegada foi desafiadora; passei um mês em Pacaraima, em Roraima, e foi um período complicado, cheguei a dormir na rua. Tudo mudou quando encontrei alguém da ACNUR, que me ajudou. Sou formada em Administração e isso me permitiu ser encaminhada para São Paulo, por meio de um programa de apoio.”

A chegada à capital paulista trouxe novos obstáculos, como a adaptação à língua e ao ambiente profissional. “Em São Paulo enfrentei uma nova fase de desafios. Sem domínio do português, precisei me adaptar rapidamente. Consegui emprego em uma fábrica, e com o que economizei durante esse período, fui buscar meus filhos.”

Hoje, Mileidis se sente mais estabilizada. “Depois de deixar a fábrica, trabalhei no Centro de Imigrantes por quatro anos. Meus filhos, que não são brasileiros, estão se adaptando bem. O mais velho já concluiu o ensino médio e o mais novo está prestes a terminá-lo.”

Apesar das dificuldades enfrentadas, Mileidis encontrou um amor e novas oportunidades. “No ano passado consegui uma bolsa e decidi retomar meus estudos. Sou graduada em Administração e, como não consegui validar meu diploma, escolhi começar de novo e me especializar em Recursos Humanos. Hoje atuo como analista de RH na ONG Estou Refugiado, ajudando justamente imigrantes e refugiados.”

Mileidis e família supera desafios e constrói um novo começo no Brasil com resiliência (Crédito:Rogério Albuquerque)

Marina Prieto também destaca que o Brasil possui políticas inclusivas que beneficiam os imigrantes, garantindo acesso universal à saúde, educação e proteção social.

A advogada Claudia Abdul Ahad Securato ressalta as desigualdades salariais que permanecem: “O salário médio dos refugiados venezuelanos é de R$ 1.905,30, ainda abaixo do salário médio nacional.” Ela enfatiza a importância da eliminação de práticas de subvalorização para garantir condições de trabalho justas.

1,5 milhão de estrangeiros residem no País atualmente

Além de promover a inclusão, a presença de imigrantes gera um impacto positivo na economia local. “Esses trabalhadores aumentam o consumo e impulsionam o desenvolvimento econômico das comunidades onde se estabelecem”, complementa Securato. O setor da construção civil, por exemplo, tem se destacado pela alta demanda por mão de obra estrangeira. O advogado Daniel Toledo explica: “No setor da construção, a necessidade por mão de obra tem crescido, e esses profissionais são fundamentais para a execução das construções.”

A trajetória de Mileidis e de muitos outros imigrantes reflete um panorama de resiliência e esperança em um Brasil que, lentamente, se transforma pela diversidade e pela força de trabalho trazida pelos novos fluxos migratórios. Essa transformação não apenas enriquece o mercado de trabalho, mas também contribui para o fortalecimento da sociedade brasileira como um todo.