Perspectivas 2025

Educação, um desafio gigante carente de visão, investimentos e dados

Das novas diretrizes para o Ensino Médio à abordagem do tema durante a COP 30, no Brasil, as expectativas para a área passam, sobretudo, pela renovação de plano nacional

Crédito: PHILIPPE LOPEZ

Urgente: atualização e detalhamento dos dados sobre alunos especiais é condição para prever a demanda por Atendimento Educacional Especializado (Crédito: PHILIPPE LOPEZ)

Por Ana Mosquera

Uso de celular, inclusão, políticas afirmativas e mudanças climáticas. Não são poucos os assuntos que permeiam uma das áreas que diz respeito a um dos direitos mais básicos dos cidadãos: a educação. Apesar de alguns resultados, decorrentes de iniciativas de longo prazo, colhidos nas últimas décadas, ainda há muito para ser conquistado para que todas as pessoas tenham acesso a ela, do ponto de vista social e financeiro. A falta de dados atualizados e a ausência de clareza sobre alguns investimentos, são fatores que preocupam especialistas e ativistas quanto à aplicação de legislações e a renovação de importantes planos e programas.

Regulação: uso de celular tramita no Congresso Nacional, mas conectividade significativa e soberania tecnológica também entram em foco (Crédito:IRIS VAN DEN BROEK)

O ano de 2024 foi marcado pelo fim do decênio do Plano Nacional de Educação (PNE) — com 90% das metas não cumpridas, 13% em retrocesso e 30% com lacuna de dados, segundo dados da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.

“É fundamental que o novo plano assegure os 10% do PIB para a educação e que não haja omissões quanto a novas fontes de receita”, diz Andressa Pellanda, coordenadora geral da Campanha.

A garantia de financiamento através do Custo Aluno-Qualidade (CAQ), a articulação com outras políticas sociais e o aumento da participação democrática na gestão e monitoramento do plano são pontos citados por ela. “A nova proposta precisa priorizar a valorização dos profissionais da educação, a infraestrutura escolar adequada e políticas de permanência, sem esquecer as etapas e modalidades mais fragilizadas, como a Educação de Jovens, Adultos e Idosos (EJA), a Educação Escolar Indígena (EEI) e a Educação Quilombola.”

A questão das desigualdades educacionais – de raça, gênero, classe e território, além das relativas a pessoas com deficiência – precisa ser considerada na proposta do MEC para o novo PNE. “O apagamento de temas como gênero, orientação sexual e os direitos de pessoas em situação de migração ou refúgio não pode persistir. A educação deve ser um espaço de combate às discriminações, promovendo a diversidade, os direitos humanos e a inclusão.”

Desigual: população de 11 a 13 anos é a que mais lê, mas só 32% das escolas públicas têm bibliotecas (Crédito:GODONG / BSIP / BSIP via AFP)

Outro tema que estará em foco no próximo ano é o Novo Ensino Médio.

Para Salomão Ximenes, professor de políticas educacionais da UFABC e pesquisador do CNPq, esse é um dos principais desafios do biênio 2025/2026, com a ampliação da carga horária obrigatória e da formação científica de qualidade para os professores das redes de ensino, por exemplo. “Outra abordagem é a regulamentação do Sistema Nacional de Educação (SNE), em discussão na Câmara dos Deputados, no que diz respeito à atuação do setor privado da educação brasileira, sobretudo no ensino superior e na formação de professores, cuja imensa maioria é qualificada em cursos de baixa qualidade e à distância.”

Outro desafio para o ano que se aproxima está no enfrentamento da Proposta de Emenda Constitucional 45/24, que, como parte do pacote de ajustes fiscais, propõe redução de até 20% nos recursos do Fundeb para o ensino integral. “No quinto ano ela seria descontinuada. É necessária a consolidação dessa política que é a mais importante de financiamento do País.”

Em pauta: o ministro Camilo Santana, durante o Encontro sobre o Compromisso Nacional com a Criança Alfabetizada, no Palácio do Planalto (Crédito:MATEUS BONOMI)

Tecnologia, leitura e clima

Quando o assunto é disparidade, o debate sobre a tecnologia deve ir muito além da proibição dos aparelhos celulares nas escolas, em trâmite no Congresso Nacional. “É preciso garantir qualidade de conexão, com banda larga adequada, dispositivos acessíveis e acessibilidade financeira, incluindo programas de uso gratuito”, diz Pellanda.

O foco deve estar na independência das escolas frente às plataformas comerciais, de acordo com ela. “Devemos investir em Recursos Educacionais Abertos (REA), que são gratuitos, adaptáveis e colaborativos, promovendo uma verdadeira educação libertadora.” O uso da plataforma pública MEC-Red deve ser mais bem explorado, inclusive em nome da proteção dos estudantes. “O não cumprimento das exigências da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) por empresas privadas coloca em risco a privacidade e segurança dos dados dos estudantes e profissionais da educação, além de levantar preocupações sobre a soberania nacional, especialmente quando falamos sobre acesso à internet e venda de dados em regiões como a Amazônia.”

Horizonte: regras do Novo Ensino Médio, como o aumento da carga horária obrigatória, serão aplicadas em 2025 (Crédito:Lucas Pannain)

BALANÇO GERAL
Números ganham a atenção de especialistas que buscam melhorias para a área

90% dos dispositivos do Plano Nacional de Educação foram descumpridos em dez anos*

32% diz respeito à quantidade de escolas públicas que possuem bibliotecas no País

20% é o que a União pode retirar da principal política de financiamento, o Fundeb 

*Dado da Campanha Nacional pelo Direito à Educação

A coordenadora da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Andressa Pellanda: incidência no Congresso (Crédito:JOYCE CURY)

Em contraponto, os últimos índices relativos à leitura e ao conhecimento de disciplinas básicas também sinalizam para a necessidade de mudanças em 2025.
● Segundo o recente Estudo Internacional de Tendências em Matemática e Ciências (TIMSS), conduzido pela Associação Internacional para a Avaliação do Desempenho Educacional (IEA), apenas 61% dos estudantes atingem o nível básico de aprendizado em Ciências e 49% em Matemática.
● De acordo com a Pesquisa Retratos da Leitura, o número de leitores do País diminuiu em sete milhões.

Para a coordenadora Andressa Pellanda, alguns aspectos cruciais para a melhora do cenário são:
● a maior valorização dos professores,
● a criação de uma política nacional integrada de incentivo à leitura,
● e o investimento em infraestrutura — caso das bibliotecas, que hoje estão em apenas 32% das escolas públicas do País.

(Divulgação)

“O grande desafio é que se consiga consolidar um modelo de Ensino Médio que respeite a formação básica”
Salomão Ximenes, professor de políticas educacionais da UFABC

Oportunidades iguais: a ampliação de políticas de ações afirmativas é essencial no combate a desigualdades históricas e estruturais (Crédito:SYDNEY BOURNE)

De volta à Amazônia, o Brasil ainda se prepara para receber a COP 30, em Belém do Pará, e a relação entre educação e clima é outra que precisa ser abordada em um futuro bem próximo. “A ausência de políticas voltadas para a justiça climática no novo PNE é um erro grave, especialmente considerando o papel da educação na formação de sujeitos críticos e preparados para enfrentar os desafios do século 21.” E ela finaliza: “O direito à educação não pode ser isolado do direito à alimentação adequada, à saúde, à cultura e a um ambiente sustentável”.