Coluna

O jogo das aparências

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Laira Vieira: "A busca pela verdade e pelo amor – por mais desejada que seja – revela-se um caminho de dor e perda" (Crédito: Divulgação)

Por Laira Vieira

Closer – Perto Demais (2004), dirigido por Mike Nichols (A Primeira Noite de um Homem, Ardil 22), e baseado na peça de Patrick Marber, mergulha nas sombras dos relacionamentos humanos, desafiando-nos a encarar nossos próprios desejos e mentiras. O filme é uma radiografia implacável das relações, onde o poder, manipulação
e atração se entrelaçam.

A trama acompanha quatro personagens cujas vidas se cruzam de maneiras inesperadas e destrutivas. Dan (Jude Law), um escritor divorciado, se envolve com Alice (Natalie Portman), uma stripper que representa tudo o que sua ex-esposa, Anna (Julia Roberts), não era. Anna, por sua vez, conhece Larry (Clive Owen), um dermatologista com quem inicia um novo relacionamento. O que começa como uma busca por intimidade e conexão logo se transforma em um jogo de manipulação, onde a sinceridade e a lealdade são substituídas pela vingança emocional e pela insegurança.

A película é uma reflexão pungente sobre as ilusões que criamos sobre nós mesmos e sobre os outros. Cada personagem tenta – em vão – construir uma identidade idealizada, enquanto se perde em relações cada vez mais distorcidas e destrutivas. Eles buscam autenticidade, mas são tragados por uma espiral de mentiras, onde o desejo de amor e aceitação é abafado pelo ego e pela manipulação.

A obra aborda como o poder – ou a falta dele – se manifesta nas relações. Larry, em um dos momentos mais reveladores, expressa sua insegurança e a necessidade de aprovação, algo que todos os personagens compartilham, ainda que de maneiras diferentes. O amor, como eles descobrem, está muitas vezes preso a uma luta constante por controle e validação emocional.

Num mundo onde as redes sociais projetam versões idealizadas de nós mesmos, a obra serve como um lembrete cruel de como a desconexão entre as pessoas se intensifica à medida que tentamos nos conectar. O reflexo que vemos nas telas nunca é a verdadeira imagem de quem somos, e esse abismo entre o real e o imaginado é a tragédia da vida moderna.

“O amor é cego e os namorados nunca vêem as tolices impagáveis que eles próprios praticam.” A reflexão de Shakespeare se materializa na tela, mostrando que, muitas vezes, o desejo de se conectar genuinamente leva a um custo emocional irreparável.

A busca pela verdade e pelo amor – por mais desejada que seja – revela-se um caminho de dor e perda. A grande lição da película é que, muitas vezes, o afastamento, e não a proximidade, é o único caminho para preservar o que ainda resta de nós mesmos. O filme nos obriga a confrontar o quão profundamente nos perdemos nas mentiras que contamos a nós mesmos, e nos deixa com a difícil questão: até onde estamos dispostos a ir para encontrar amor verdadeiro?