Do Morro do Livramento às páginas da The New Yorker
Por Antonio Carlos Prado
Intelectuais, poetas e críticos literários norte-americanos continuam maravilhados com a obra de Machado de Assis — alias, deixe-se claro, se ele agora é bem lido no próprio Brasil, trata-se da influência de autores dos EUA e estudiosos britânicos, a exemplo do ensaísta John Gledson. A mais recente homenagem a Machado de Assis, no âmbito internacional, acaba de vir justamente dos norte-americanos, nada mais nada menos que pelas mãos do poeta David Lehmann — ele relembra o nosso “Bruxo do Cosme Velho” (apelido dado a Machado por Carlos Drummond de Andrade), nascido preto, pobre e epilético no Morro do Livramento, no Rio de Janeiro, em 1839. Lehmann escreveu cinco poemas, intitulou-os In praise of Machado de Assis (Em louvor a Machado de Assis) e os publica agora na sofisticada e tradicional revista The New Yorker. Os poemas (e nem poderiam ser diferentes) guardam considerável dose da ironia e do pessimismo machadiano. Hoje extremamente estudada, a situação da obra de Machado nem sempre esteve em alta. Durante décadas, era lida somente nas universidades. Por isso, não houve intelectual, lá e aqui, que não ficasse perplexo quando Machado foi elogiado pela pensadora pop Susan Sontag — a mesma que inspirou o dramaturgo Nelson Rodrigues a criar o pseudônimo de Suzana Flag.
JUSTIÇA
A saúde do País na modernidade
Na semana passada tornou-se oficial. O STJ deu importante passo para trazer o Brasil à modernidade no campo da saúde pública: autorizou, para uso medicinal, a importação de sementes e cultivo de cânhamo. Trata-se de uma variedade da Cannabis, mas com ínfimos níveis de THC — esse, sim, um composto psicoativo. Muitos confundem o cânhamo, equivocadamente, com a maconha que se fuma como droga. A ministra do STJ Regina Helena Costa afirmou que a “falta de regulamentação (virá da Anvisa) impõe restrições ao direito fundamental à saúde”. França, Alemanha, Países Baixos e China são grandes produtores de cânhamo, vital à indústria farmacêutica. Segundo a ministra, ter de importá-lo faz com que as “pesquisas cheguem a valores proibitivos”.
HISTÓRIA
Reabre no Recife a relíquia do cinema São Luiz
Acaba de ser reaberta no Recife uma relíquia: o histórico cinema São Luiz. Na tela, nada poderia ser melhor: exibiu-se Ainda estou aqui, sobre a tortura e o assassinato, pela ditadura militar, do engenheiro e deputado federal Rubens Paiva (ele preferia que o chamassem de engenheiro). Na platéia, lá estava o diretor Walter Salles. A emoção no São Luiz foi mais tocante ainda, pois a cercava os vitrais dourados de 1952, ano em que se inaugurou a “sala de projeção”. Ano, na verdade, muito agitado no Recife, com eleição antecipada para governador de Pernambuco devido à vacância no cargo pela morte de Agamenon Magalhães. Venceu Etelvino Lins, do PSD. É o São Luiz uma das salas de cinema de rua mais antigas do Brasil (contam-se meia dúzia, ainda em funcionamento). Nos shoppings, os sofisticados e moderníssimos cinemas se multiplicam, mas o São Luiz resiste. E agora restaurado. Segundo o seu programador, Luís Fernando Moura, o público se convence de que a “experiência de ver um filme na sala é diferenciada”. Há algo de lúdico, como, por exemplo, sentir-se em um local com setenta e dois anos de história — a tela do São Luiz atraiu atenções pela primeira vez com o filme O canto do mar (Alberto Cavalcanti, José de Souza Alencar e Hermilo Borba Filho). Um de seus altos momentos deu-se em 1981 com a comédia Os Saltimbancos – Trapalhões (adaptação da peça de Chico Buarque por Renato Aragão; o original é de Sergio Bardotti com músicas de Luiz Henrique Bacalov). A restauração e reabertura do São Luiz valorizam Recife e Pernambuco. Homenageia-se o Brasil. E a própria arte do cinema.