“Plano do golpe é digno de repulsa. Se for verídico, punição!”, diz Ronaldo Caiado
Por Vasconcelo Quadros
Fundador da União Democrática Ruralista (UDR), que armou fazendeiros na defesa de propriedades a partir da década 1980, e criador da poderosa bancada ruralista no Congresso, o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), um dos candidatos da direita à presidência em 2026, agregou a seu arsenal uma metralhadora giratória com a qual dispara, ao mesmo tempo, contra o presidente Lula e o ex-aliado Bolsonaro. Qualifica de “inaceitável e digno de repulsa” o plano, revelado pela Polícia Federal (PF), para matar Lula, o vice Geraldo Alckmin e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes em meio a um golpe de Estado. “Se tudo for verídico, punição!” Avalia que o atentado a bomba contra o STF é reflexo da falta de preparo do governo e dos órgãos federais, que foram incapazes de prever os riscos. “O autor anunciava os ataques há dias nas redes. Mudou-se para Brasília, fez movimentos de toda ordem e a inteligência não funcionou. Apatia completa”. Brigou com Bolsonaro na eleição deste ano. Afirma que o ex-presidente, ao se envolver na eleição em Goiânia, perdeu a disputa e foi “deselegante e desrespeitoso” com ele. As forças de direita, diz, terão de escolher, em 2026, “um candidato equilibrado para unir o País”.
Que avaliação o senhor faz do plano para matar o presidente Lula e autoridades envolvendo assessores militares do governo Bolsonaro?
Estava acreditando em um novo momento de paz e civilidade na política. É um gesto que me preocupa sobremaneira. O Brasil não suporta mais viver como está vivendo. Tem o descrédito do governo e agora os acontecimentos, baseados na fala da Polícia Federal, de pessoas articulando assassinato de ministros do Supremo. É inaceitável, inadmissível e tem a repulsa de quem quer construir cada vez mais a democracia e consolidar o respeito aos poderes.
Até onde isso poderá chegar?
Não sei para onde caminharemos a continuar uma política de extremos. Jamais imaginei uma situação como essa. É preciso saber quem são mentores e os usados como massa de manobra.
Bolsonaro deve ser responsabilizado?
Depende da veracidade dos fatos. Se houver veracidade, punição! É inadmissível arquitetar plano para matar em meio a golpe.
E o episódio das explosões em Brasília?
Mostra um país à deriva, sem comando. Tenho repetido exaustivamente, inclusive disse ao próprio presidente Lula, que a falta de segurança ameaça a economia, a democracia e o futuro do Brasil. Há um avanço do crime organizado e a ausência de uma política eficaz de segurança. E isso se reflete em assassinatos como o de Guarulhos (de Antônio Vinícius Lopes Gritzbach, delator do PCC) nas mais importantes cidades do País tomadas pelo narcotráfico. A fraqueza do Governo Federal permite que extremistas também se sintam à vontade para agir, como ocorreu na Praça dos Três Poderes. O que impressiona é que não houve uma ação do setor de inteligência. O autor dos atentados estava anunciando os ataques há dias em suas redes sociais. Mudou-se para Brasília, fez movimentos de toda ordem e a inteligência não agiu nem funcionou. É a apatia completa.
O episódio em Brasília trará impacto negativo à direita?
Não vejo isso. Está claro que foi um ato isolado. Mas reforça a necessidade de termos, em 2026, uma candidatura à direita equilibrada, que possa promover a união do País e fazer o Brasil forte e respeitado de novo.
Acha que, mantida a inelegibilidade, Bolsonaro apoiará um nome da direita ou insistirá em indicar alguém do clã, como o deputado Eduardo Bolsonaro?
Não tenho como responder agora. Ainda temos um longo tempo até 2026. Posso reafirmar que vou andar pelo País e apresentar-me como pré-candidato. Mostrar minha trajetória política, as realizações em Goiás e o que podemos fazer pelo Brasil. Uma política séria de segurança, investimentos em Educação, novo rumo aos programas sociais, cuidando de quem precisa mas criando condições de emancipação, para que as pessoas possam romper o ciclo da pobreza. Mostrar como avançar na saúde. É isso que o povo brasileiro anseia: ações concretas que possam resolver os problemas do País.
Qual o reflexo do resultado das eleições municipais para 2026?
A tese é real de que serei candidato em 2026 porque tenho o apoio do partido. Naturalmente, diante da vitória obtida em 2024, vários candidatos vão emergir no processo político de 2026 no primeiro turno. A partir daí aquele que chegar ao segundo turno terá o apoio de todos nós (da direita).
É o que também pensam seus concorrentes na direita?
Sim, porque estarão dois campos ideológicos distantes um do outro. Logicamente, em uma eventual chegada ao segundo turno, a votação absorverá os demais do bloco.
Com tantos governadores presidenciáveis e Bolsonaro insistindo que pode derrubar a inelegibilidade, a direita não tem um grande problema a resolver?
Todos nós temos previsão de candidatura. Tenho um partido (União Brasil), assim como têm os seus o Romeu Zema (Novo), Tarcísio de Freitas (Republicanos), Ratinho Jr (PSD) e Bolsonaro (PL). Não existe atrito interno-partidário e isso pode ser levado no primeiro turno sem que haja desgaste de tentar uma convergência, a menos que ela venha dentro de um diálogo e de uma espontaneidade de um dos lados. No contrário, é melhor não forçar nada, deixar uma convivência respeitosa com todos e, quando chegar o segundo turno, ter exatamente essa condição de poder buscar a convergência desses votos para o candidato que passou para o segundo (turno).
As rusgas entre o senhor e Bolsonaro estão superadas?
Quem tem que responder isso é ele. Dentro dos princípios da livre iniciativa, quem tem condições de nos representar na Prefeitura, na capital do estado, é o candidato que lancei (Sandro Mabel), e não o que ele lançou (Fred Rodrigues), sem nenhum preparo para governar uma capital diante da crise que ela vive. Por que Bolsonaro foi a Goiás três vezes no segundo turno, levando toda a entourage pra ficar lá até o dia da votação, das 8h às 17h do dia? Ele deveria ter ido para Fortaleza ou para qualquer estado onde tivesse um enfrentamento com o PT.
Poderia ter ido apoiar Ricardo Nunes em São Paulo, não?
Exatamente. Mas por que foi a Goiânia? Por que esse direcionamento, sendo que o apoiei em todas as campanhas pelas quais passou no cenário nacional?
Ele fez isso porque teme o senhor?
Não vou afirmar, mas foi um gesto totalmente deselegante e desrespeitoso. Não cabe a mim a responder por ele.
Bolsonaro tem o comando da direita?
Não se pode negar que ele tem uma parcela significativa do apoio da população brasileira. É óbvio que tem capacidade de mobilização por onde anda. Mas a função de um líder é sempre aglutinar, não dispersar suas bases e muito menos confrontar aliados. A política não aceita tutela. É necessário ter respeito aos líderes estaduais, municipais e ao mais forte no cenário nacional. Espero que essa eleição tenha servido de lição para que venha o diálogo em base de sedimentar o processo de 2026.
O senhor e o Bolsonaro foram muito próximos. A eleição deixou sequela?
Sou muito pragmático. Meu foco agora é a gestão do meu estado de Goiás. Vou me preocupar para apoiar o Sandro a governar Goiânia para transformar a capital em uma referência nacional. O processo da discussão política ficará mais para frente, ainda há muito espaço para gente conversar até lá. Agora tenho muito que trabalhar. Se Goiás é o estado mais bem avaliado do Brasil, isso não quer dizer que eu possa, simplesmente, ficar em cima dos louros que obtive. Tenho de continuar trabalhando até o fim do meu mandato.
A sucessão no Congresso e a eleição de 2026 são fatos isolados?
Não, porque o presidente da Casa tem poder. Vejo hoje o Davi Alcolumbre muito consolidado, uma pessoa que tem habilidade política e sabe construir entendimentos no Senado Federal. Ele tem trabalhado e conseguido obter a simpatia e o gesto da ampla maioria dos senadores. Arriscaria um placar no Senado de quase 70 votos. Já na Câmara não estimaria porque os partidos ainda estão se definindo. Não sou o presidente nacional do partido. Aguardarei nossa reunião. Temos conversado bastante e caberá ao Antônio Rueda (presidente do União Brasil) proferir a última palavra em relação à presidência da Câmara.
O PL do Bolsonaro força na Câmara um confronto com o STF. Isso pode desequilibrar os poderes?
Fui o primeiro a alavancar a tese da anistia aos que participaram do ato de 8 de janeiro. Disse que o Lula “deveria se preocupar em governar e deixar esse pessoal ali”, fazer um processo como Juscelino Kubitschek (que anistiou oponentes) e depois governar, mas ele se perdeu nesse debate. O que vai acontecer agora na Câmara é cada um no seu quadrado. Vivi lá por muitos anos. É litúrgico não avançar nas prerrogativas de outros poderes.
O que pensa sobre impeachment de ministro do STF?
Se o Congresso achar que isso deve ser feito deve-se respeitar, mas sabe-se que não existe um poder afastado do outro. Em Goiás, governo com os poderes e as instituições. O que falta no Brasil é um nível de convergência. Uma queda de braço não mostra nenhuma harmonia de poderes.
Com o crescimento nas eleições deste ano, que perfil deve ter a direita nas eleições em 2026?
Deverá ser equilibrada, moderada, uma direita que saiba governar, sentar e conversar com os presidentes da Câmara, Senado, STF e TCU. Uma direita que saiba se reunir todos os dias, falar, levar a realidade de cada poder, discutir, apresentar para a sociedade alternativas conjuntas, assim como fiz no meu estado de Goiás. Nunca tomei uma decisão única e exclusivamente com a prerrogativa que tem o governador. É preciso ter diálogo.
Com Bolsonaro inelegível, como pretende disputar o eleitorado de direita?
Todos nós vamos explorar a urna. Não se deve ter medida seletiva, é preciso jogar o jogo. Não contesto votos, resultado de urna ou de painel. Se ganhei comemoro, se perdi não responsabilizarei os outros pela minha derrota. Isso é democracia.
Na reunião entre Lula com os governadores o senhor afirmou que Goiás havia resolvido os problemas de segurança, mas o presidente ironizou afirmando que se prestasse atenção no “único Estado que não tinha problemas”. Como avalia a crítica?
Vi alguém espantado diante de um tema tão relevante. Ele vem falar de pamonha, de empadão, de que Goiás é a perfeição da segurança pública e que eu, então, era quem deveria chamar os governadores para falar de segurança pública. Foi um descaso, no momento em que se viu desmascarado diante de um fato. Em vez de reconhecer com humildade que os métodos de Goiás podem ser estendidos a outros estados, veio com ironia, mostrando não ter qualificação para governar. É apático, preguiçoso, não sai de Brasília nem tem noção do que ocorre no País. Está totalmente adormecido.