O que o Brasil deve fazer para ser forte em lítio, essencial para carro elétrico
Por Mirela Luiz
RESUMO
● Mineral estratégico para baterias recarregáveis e carros elétricos, o lítio é chamado de “ouro branco” do século 21
● América Latina possui 68% das reservas globais e o Brasil tem grande potencial, mas ainda precisa se estruturar
A crescente demanda global por veículos elétricos tem colocado o lítio em destaque como um dos minerais mais estratégicos para a indústria contemporânea. Essencial para a fabricação de baterias — que podem representar até 30% do custo de um veículo elétrico — o material é fundamental para a transição energética que o mundo está experimentando. Com suas vastas reservas, o Brasil possui um potencial imenso, mas ainda enfrenta desafios significativos para se tornar um player relevante na cadeia produtiva global de lítio. Vinícius Alvarenga, CEO da Companhia Brasileira de Lítio (CBL), sinaliza que a produção no Brasil é dominada por empresas nacionais, como a própria CBL, a MG em Minas Gerais e a Sigma Lithium.
Enquanto a CBL se destaca por sua capacidade de produzir compostos de alta pureza, tais como o carbonato de lítio, a MG e a Sigma concentram-se na extração de concentrados de espodumênio.
A importância desse mineral é corroborada por previsões da Agência Internacional de Energia (IEA), que estima um aumento da demanda de lítio para veículos elétricos de 22 mil toneladas, em 2020, para mais de um milhão de toneladas até 2040.
Com 68% das reservas globais localizadas na América Latina, o Brasil ocupa uma posição estratégica, mas ainda enfrenta sérios desafios em infraestrutura, logística e na industrialização de sua cadeia produtiva.
Ricardo Balistiero, economista e coordenador do curso de Administração do Instituto Mauá de Tecnologia, alerta que a desaceleração na demanda por veículos elétricos tem gerado consequências negativas para os preços. “A produção global não atingiu as expectativas, resultando num excedente significativo de lítio no mercado”, diz. Essa realidade é especialmente preocupante para grandes produtores, como a Austrália, que lidam com estoques elevados.
Robson Costa, engenheiro ambiental, ressalta que, apesar de uma procura crescente, a volatilidade nos preços do lítio permanece como um entrave. “A demanda pelo lítio está em ascensão, mas a oferta, especialmente para as baterias de carros elétricos, tem superado as expectativas”, afirma Costa. Ele aponta que o preço do carbonato de lítio na bolsa de Xangai subiu 875% entre 2021 e 2022, reflexo do boom da indústria de veículos elétricos.
No entanto, essa oscilação se dá em um mercado que apresenta excesso de oferta, enquanto a demanda não cumpre as projeções. “Se há uma exigência por mais lítio o preço aumenta, já que é um metal também escasso”, afirma Leonardo Calicchio, professor de Engenharia de Materiais do Mackenzie.
Reservas
A exploração de lítio no Brasil está concentrada, em sua maioria, no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, e na Província de Borborema, no Nordeste.
● Segundo levantamento da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, os pedidos ao Governo Federal para explorar o mineral em Minas Gerais aumentaram quase 18 vezes, passando de 45 em 2021 para 851 em 2023.
● O Ceará, por sua vez, é responsável por 50% da extração no Nordeste.
● Essas regiões têm se beneficiado da exploração mineral, que atrai investimentos e gera empregos, mas também enfrentam desafios logísticos e preocupações ambientais.
Gerhard Ett, professor de veículos elétricos e híbridos do Instituto Mauá, destaca a importância de superar gargalos estruturais e investir em reciclagem de lítio para tornar a indústria brasileira competitiva. “Parcerias público-privadas e práticas sustentáveis na extração são essenciais”, afirma Ett, alertando para os impactos ambientais da mineração.
A descoberta de uma grande reserva de 5 a 19 milhões de toneladas de lítio no Arkansas, nos EUA, chamada de Formação Smackover, pode alterar o equilíbrio global do mercado, hoje dominado pela Austrália, China e o “triângulo do lítio” na América do Sul, entre Argentina, Bolívia e Chile, onde está metade das reservas do planeta.
Se for confirmado, o estoque do Arkansas pode ser suficiente para atender à demanda global até 2030, tornando os EUA o produtor número 1 do metal no mundo. Nos anos 90, os EUA eram o maior produtor do mundo, mas, hoje em dia possuem cerca de 1% da produção global tendo que importar mais de 1/4 do que precisam.
Para que o Brasil se torne uma potência nesse setor, será fundamental investir em tecnologia, sustentabilidade e infraestrutura. O potencial é imenso — o que falta é a estratégia adequada para aproveitá-lo ao máximo.