Biografia investiga a morte de Edgar Allan Poe, seu maior mistério
Como morreu o grande mestre do suspense? Ao longo dos anos foram apresentadas 27 teorias sobre a causa de sua morte, mas uma nova biografia promete apresentar uma resposta definitiva para um dos maiores enigmas da história da literatura
Por Felipe Machado
É uma das grandes ironias da história da literatura. O mestre do suspense teve uma vida tão enigmática quanto suas obras, mas sua morte permanece envolta em circunstâncias ainda mais estranhas, atraindo especulações que se multiplicam ao longo dos anos. A biografia O Mistério dos Mistérios — A Morte e a Vida de Edgar Allan Poe, do jornalista Mark Dawidziak, nos leva a uma investigação fascinante sobre os últimos momentos de Poe e as inúmeras teorias que tentam explicar o fim de sua vida. A obra convida o leitor a desconstruir o mito e a enfrentar o desafio de desvendar o homem por trás da lenda.
Há muitas biografias de Poe, mas o ponto alto do livro de Dawidziak é a nova perspectiva que ele traz sobre a causa da morte do autor de O Corvo, O Gato Preto, A Queda da Casa de Usher e tantos outros clássicos. Ao adotar uma narrativa no melhor estilo “true crime”, o biógrafo recorre a um formato original: traça duas linhas do tempo que se alternam entre os últimos dias e os episódios mais marcantes da vida de Poe.
Dawidziak explora as diversas teorias existentes sobre as possíveis causas de sua morte:
• suicídio,
• assassinato,
• sífilis,
• alcoolismo,
• infarto,
• tumor cerebral,
• raiva
• e até encefalite causada pela exposição ao frio.
Para sustentar sua explicação, entrevista especialistas do FBI, médicos legistas, historiadores e até arqueólogos. A cada depoimento, surgem aspectos da vida pessoal de Poe que ajudam a explicar o desenlace misterioso.
Os últimos dias de poe
O que aconteceu de tão estranho com Poe em seus últimos momentos de vida?
• Ele morava em um modesto chalé no Bronx, em Nova York, com a sogra, Maria “Muddy” Clemm.
• Estava desolado desde a morte da mulher, Virgínia, em 30 de janeiro de 1847.
• Embora o dinheiro fosse escasso, estava tentando se reerguer.
• No início de outubro de 1849, embarcou em um navio a vapor rumo a Richmond, no estado da Virgínia, cidade onde havia feito seu nome como editor e crítico literário.
• Ele planejava se encontrar com possíveis investidores que financiariam a sua revista literária, projeto com o qual sonhava há tempos.
Mas como, então, poucos dias depois, Poe foi encontrado vagando sozinho pelas ruas de Baltimore, no estado de Maryland? Por que vestia roupas que não eram suas e delirava, falando coisas sem nexo? E por que ninguém nunca foi capaz de identificar quem era “Reynolds”, o homem por quem ele chamava desesperadamente antes de morrer no Washington University Hospital, para onde havia sido levado por estranhos que o encontraram na rua?
Apesar dessas incertezas, Dawidziak mostra que o Poe da vida real era diferente da caricatura criada ao longo dos anos, o gênio depressivo, melancólico e dependente de álcool. Embora parte desses aspectos tenha sido verdadeiro, o livro defende que Poe era, na verdade, um artista versátil. Publicou sátiras, peças humorísticas e críticas literárias. Essa figura complexa e talentosa, porém, acabou suprimida pelo mito do gênio atormentado, que se popularizou após sua morte. A culpa, em parte, é de Rufus Griswold, crítico que publicou seu obituário, um texto ofensivo e degradante. Griswold foi o primeiro a propagar essa imagem sombria de Poe. Após expor as suspeitas sobre cada teoria, Dawidziak dá o seu veredito sobre a causa da morte: a tuberculose. Mais especificamente, a meningite tuberculosa. Para ele, suas condições de vida — pobreza, saúde precária e alcoolismo — o tornavam vulnerável à doença que, em meio a tantos mistérios, lhe acompanhou até o fim.
Uma biografia investigativa
Mark Dawidziak, autor
“Agi como um detetive para descobrir a causa da sua morte”
Quando se interessou pela vida e a trajetória de Poe?
Vi meu primeiro filme de horror aos sete anos. Quem se interessa pelo tema logo descobre que existe um autor que exerce enorme influência sobre o gênero. Aos vinte anos, decidi ler toda a sua obra. Aos trinta, li todo o trabalho crítico sobre ele. Carrego Poe por toda a minha vida.
Por que acredita que a sua versão sobre a morte dele é a correta?
Não é possível ter certeza absoluta. Poucos médicos faziam autópsias no século 19. Certificados de óbito não eram comuns e não há elementos que possam ser submetidos à medicina forense moderna.
O mestre do suspense nos deixar essse mistério que dura até hoje é algo poético.
Há 27 teorias sobre sua morte. Agi como um detetive para descobrir qual é a mais provável.
Qual o impacto de Poe na indústria do horror atual?
Stephen King disse uma vez: “somos todos influenciados pelo mesmo avô esquisito”. Ele se referia, obviamente, a Poe. Todos que trabalham nessa área devem muito a sua obra.
Por que seus livros foram tão importantes? O que ele tinha de diferente em relação a outros autores do gênero?
Ele morreu em 1849, mas há uma razão para continuarmos a ler e adaptar seus textos para o cinema e a TV. Ele era muito bom, melhor que os seus concorrentes. Havia muita gente escrevendo histórias de terror na época, não apenas nos EUA, mas no mundo inteiro. Suas histórias eram simplesmente melhores.
Sua produção era apenas voltada para o terror?
Não, ele escreveu sátiras, poemas, críticas. Viveu 40 anos e, quando foram levantar toda a sua obra, esse conteúdo chegou a 17 volumes. É impressionante. Uma parte pequena foi dedicada ao horror, mas é por ela que ele ficou famoso.
Ele era mesmo uma figura triste e depressiva?
Pelo contrário. Era atlético, um excelente boxeador. Tinha uma postura militar. Foi um ótimo soldado, logo promovido a sargento. Nos últimos anos sua saúde piorou. Mesmo o famoso bigode, ele só deixou crescer no final da vida. Mas a cultura pop gosta dessa caricatura.