Conheça o alto custo da família Bolsonaro
Os gastos com os Bolsonaro para a democracia se estendem também às finanças do Erário: Mas despesas com o clã passam de R$ 270 mil mensais, sem contar os pesados privilégios que a lei garante ao ex-presidente
Por Vasconcelo Quadros
Mesmo com restrições impostas pelo judiciário como investigado, o ex-presidente Jair Bolsonaro atuou com ampla liberdade na campanha e até esbanjou dinheiro público no custeio de viagens pelo País para subir em palanques, sem ser importunado pela Polícia Federal. Mas o cessar fogo se encerra na segunda-feira,27, quando os órgãos de controle, depois de uma trégua adotada para não tumultuar o período eleitoral, voltam às ruas para cumprir as últimas diligências nos quatro inquéritos policiais que cercam os Bolsonaro.
O procurador-Geral da República, Paulo Gonet desmentiu rumores de que estaria preparando um pedido de prisão do ex-presidente ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, mas passou os últimos meses analisando as investigações para decidir em qual dos casos o ex-presidente será denunciado primeiro.
O mais provável, segundo fontes da PF e da PGR, é que a primeira denúncia seja pelo desvio e venda das joias doadas por autoridades da Arábia Saudita ao governo brasileiro, crimes pelos quais Bolsonaro já foi indiciado pela PF por peculato, lavagem de dinheiro e associação criminosa, e para os quais o Código Penal prevê uma pena entre dez e 32 anos em regime fechado.
Delito grave praticado por servidor público que se utiliza do cargo para obter vantagens, o peculato revela um elo perdido na trajetória de Bolsonaro que, como militar e principalmente como político, sempre “empreendeu” para garantir privilégios econômicos a ele e ao clã que passou a construir desde que se elegeu vereador, em 1988.
O mais novo dos filhos, Jair Renan, eleito vereador em Camboriú (SC), que terá salário de R$ 12 mil, completa a família política acomodada em cargos públicos e garante à linhagem uma vida de privilégios que ele perseguiu desde os anos de 1980 quando, como capitão do Exército, chegou a ser repreendido por superiores por buscar renda com plantação de melancias e garimpo.
Bolsonaro é um dos ex-presidentes da República que mais consome dinheiro público para se manter.
• No ano passado gerou despesas de R$ 1.851.716,26, valor contabilizado pela Secretaria Geral da Presidência da República no custeio de viagens e manutenção dos seis servidores e dois carros blindados que, pela lei, é uma regalia que ele e os demais ex-presidentes têm direito.
• O que garante a sombra e água fresca que desfruta são, no entanto, a renda que o ex-presidente e seus quatro filhos homens recebem do erário, um total estimado em cerca de R$ 270 mil por mês.
• Como chefe do clã, o ex-presidente recebe mais de R$ 100 mil: são R$ 46,3 mil como deputado federal aposentado, R$ 12,3 mil como capitão reformado do Exército e R$ 41,6 mil por ter se tornado “presidente de honra” do PL.
• Essa é uma concessão excepcional feita pelo presidente do partido, Valdemar Costa Neto em agradecimento ao papel do “mito” como líder da extrema direita e o sucesso financeiro que rende a maior fatia do fundo partidário à agremiação, exatos R$ 886.839.487,85.
Gastos de Michelle
Generoso com dinheiro público, Costa Neto ainda incluiu na folha de pagamento do partido a ex-primeira dama Michelle Bolsonaro, que tem salário mensal igual ao do marido: R$ 41,6 mil. Os dois filhos mais bem colocados na política, o senador Flávio Bolsonaro, e o deputado Eduardo Bolsonaro, passarão a receber nas duas Casas do Congresso salários idênticos a partir de janeiro: R$ 46,3 mil.
Eduardo deve engordar a conta ao assumir no PL, depois das eleições, os cargos de secretário internacional e de relações institucionais, resultado de acordo entre o pai e Costa Neto para evitar o agravamento de uma crise pelo comando do partido.
O cargo de relações institucionais está vago desde fevereiro, com o afastamento do ex-ministro da Casa Civil, general Walter Braga Neto, enrolado com os atos golpistas. Já o vereador Carlos Bolsonaro, o 02 da sequência numérica até 04 que o ex-presidente usa para identificá-los, como vereador reeleito no Rio de Janeiro, continuará com um rendimento de R$ 24,7 mil.
A trajetória de 36 anos na política transformou o ex-presidente numa espécie de midas: basta uma postagem pelas redes sociais e o dinheiro verte como água de nascente.
• Ao deixar a presidência, alegando despesas que não teria condições de bancar, recebeu via PIX dos apoiadores cerca de R$ 17,7 milhões, uma bolada bem superior aos rendimentos salariais cujo destino estava envolto em mistério.
• Ao Metrópoles, o ex-presidente deu uma explicação simplória em abril deste ano. Disse que R$ 5,7 milhões usou para pagamento antecipado de honorários para garantir sua defesa nos processos, porque temia que o ministro Alexandre de Moraes bloqueasse suas contas. Os outros R$ 12 milhões, disse que estão aplicados.
Como se vê, a extrema direita gosta de dinheiro e descobriu na política, bem antes de Pablo Marçal, a estratégia de empreender.
Bolsonaro vai precisar de dinheiro. Encerrada a trégua adotada pelos órgãos de controle, ele e seus principais ex-assessores militares, entre os quais o coronel Mauro Cid, que o delatou, devem ser alvos de denúncias em série.
No caso das joias sauditas, a Polícia Federal apontou que as peças colocadas à venda no mercado internacional equivaliam a R$ 6,8 milhões.
O outro inquérito praticamente encerrado é o da falsificação dos cartões de vacina. A previsão da PF é concluir, até o final do ano, todas as diligências de investigações que cercam o ex-presidente, inclusive a mais importante delas, que é a tentativa de golpe de Estado através de preparativos colocados em curso nos dois meses depois da eleição de 2022 e que terminaram nos ataques de 8 de janeiro.
Ligações com o golpe
Fontes da PF ouvidas por ISTOÉ sustentam que as principais linhas adotadas pela investigação ligam concretamente o ex-presidente aos golpistas, o que deve ser considerado no relatório final como indício material para incriminá-lo. O trecho de um despacho do procurador- geral Paulo Gonet, encaminhado ao ministro Alexandre de Moraes, demonstra que a PGR e a PF encontraram o chamado “nexo causal” entre a atuação das forças especiais do Exército, sob o comando dos principais assessores do ex-presidente, e a invasão e depredação das sedes dos Três Poderes com o objetivo de gerar fatos que pudessem atrair as Forças Armadas para o golpe.
O acerto de contas de Bolsonaro com a Justiça começará, portanto, em breve, assim que o STF aceitar uma das prováveis denúncias da PGR, o que o tornaria réu logo no início do ano que vem, dando início a um roteiro que, até uma sentença definitiva, demora cerca de seis anos e deve consolidar sua condição de inelegível.
Na avaliação de juristas, ao abrir mão da defesa técnica e tentar responder as acusações pela política, com frequentes ataques aos ao STF, Bolsonaro criou condições para uma eventual prisão. A PF pode até pedir sua prisão no relatório final do inquérito, mas não há sinais de que a PGR reforcará a necessidade e nem que Alexandre de Moraes possa atender eventual pedido.
A estratégia política do ex-presidente é tentar virar o jogo pela política, estimulando seus apoiadores na Câmara a votar um projeto de anistia a seu favor, o que é improvável de produzir resultados porque ele sequer foi condenado ainda. O mais provável é que o ex-presidente “sangre” até uma sentença.