Fogo, incompetência e lorota na ONU
Por Carlos José Marques
Com o País ardendo em chamas, não havia mesmo como o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, lograr êxito no périplo de discussões globais na ampla arena da ONU, dias atrás. Ele deixou de entregar o básico, a lição de casa, nesse capítulo. Quem não dá exemplo não pode, decerto, ser levado a sério. E a plateia de líderes cobrou, reclamou do descaso e ineficiência das regras de controle ambiental praticadas por aqui. Foi efetivamente um puxão duro de orelha. E Lula sentiu, acusou o golpe. Pediu mais dinheiro e não levou. Tentou repetir a tática do discurso anterior, na mesma convenção do ano passado, falando da tal urgência climática para a qual alertou, na ocasião ovacionado. A receptividade agora foi outra. Ele perdeu o papel de comando da bandeira. No Brasil, pode até ser derrotado nas eleições por conta disso, porque as consequências, mesmo na plataforma econômica de seus projetos, são enormes. E ele sabe. Vem correndo atrás do prejuízo. O País está com quase 30% do seu território queimando. Boa parte por responsabilidade humana, crimes claros ocorrendo sem qualquer tipo de resistência, por falta de estrutura que Lula não providenciou. A situação é deveras dramática. O BNDES providenciou meio bilhão de reais do fundo do clima para empresas de etanol de milho. Dinheiro para o efetivo combate a devastação é escasso, quase residual. O governo fala em arregimentar mais bombeiros para conter o avanço das chamas. Mas o planejamento estruturado, efetivo, é quase nulo. As medidas emergenciais são insuficientes. Fogo, fumaça e seca vão destruindo tudo. Em São Paulo, com ares de calamidade nunca antes verificada. Neste momento, o Estado registra os piores índices de poluentes inaláveis de toda a história. Recorde sobre recorde entre as cidades classificadas como o pior lugar do mundo para respirar. Onde tudo isso pode acabar? Para driblar as pressões, a equipe de Lula se diz otimista com a coibição sobre os autores de queimadas intencionais. Técnicos do Meio Ambiente garantem que vão reverter a situação. O Planalto baixou uma medida provisória criando o Estatuto Jurídico da Emergência Climática. Que sirva para alguma coisa. No Congresso, que parece de costas para a situação, o tema mal é abordado. Dados e protocolos contra a poluição são defasados e não considerados. As regras para as atividades de exploração não são seguidas. O caos predomina. Os ministros do STF autorizaram um crédito extraordinário, fora da meta fiscal, para fazer frente às queimadas e ao que foi classificado como uma “pandemia de incêndios”. Em muitos casos, na Amazônia e no Pantanal, regiões inteiras já estão em um quadro irremediável e podem virar meras savanas ou desertos.
Inacreditável que tenha se chegado a tal estágio de degradação. O maior pulmão do mundo está tomado de fumaça. Lá fora, Lula resolveu criticar os ricos. Apontou o dedo para acusá-los de não ajudar a remediar o drama. Disse que o mundo está desgovernado, muito embora precisasse, antes, dar demonstrações de como ele próprio sabe governar. A fome, sua crítica mais veemente, estaria no eixo como foco da vergonha global, originada também, em parte, pelo desmonte ambiental. Ele se dispõe a liderar uma reviravolta. Mas a desconfiança que alimentou ainda é grande. Ao desembarcar na ONU com um fabuloso passivo ambiental, o demiurgo de Garanhuns pode almejar, no máximo, o papel de coadjuvante desse processo. Ações de fomento à transição ecológica precisam ser incorporadas à rotina o mais rápido possível. Sair do discurso para a prática (se é que isso ainda é possível). De verdade, ocorreram reduções no desmatamento da Amazônia nos últimos tempos, algo que atraiu a atenção. No atual patamar de aquecimento planetário, o resultado soa, entretanto, pequeno. Não dá mais para esperar. Será necessária uma mobilização diuturna para conter tantos estragos. Incompetência não apaga fogo.