Política

Ter ou não ter armas? A bala esquenta a briga entre Trump e Kamala; entenda

Disputa pela presidência nos EUA tem a segunda tentativa de atentado a Donald Trump e polarização sobre armas mostra potencial de fiel da balança no pleito de novembro

Crédito: Alex Brandon

Donald Trump aumentou a segurança após nova tentativa de atentado (Crédito: Alex Brandon)

Por Luiz Cesar Pimentel

O candidato à presidência dos EUA Donald Trump foi colocado rapidamente em um carrinho de transporte de jogadores no domingo, 15, logo após tiros serem ouvidos enquanto praticava o esporte no campo que leva seu nome, o Trump International Golf Club, em West Palm Beach, na Florida. Na memória, a tentativa de assassinato que sofreu durante comício na Pensilvânia, há dois meses, que terminou com um morto na multidão e ferimentos na orelha do candidato. Logo após o susto, sem vítimas, a intenção do discurso passou a ser política, pois nada polariza mais os norte-americanos do que armas.

A balança é antagonicamente equilibrada até dentro das duas coletividades que dividem politicamente o país:
entre os democratas, 80% são favoráveis à verificação de antecedentes antes da venda de armas;
dos republicanos, 70% são contrários a quaisquer restrições.

Suspeito deixou para trás rifle e câmera que usou nas 12 horas em que ficou em tocaia (Crédito:Joe Raedle)

Tanto que mesmo após o comunicado da rival, a democrata Kamala Harris, após o ocorrido, em que disse estar “profundamente perturbada com a possível tentativa de assassinato do ex-presidente Trump”, o bilionário tentou jogar na conta dela e do atual presidente, Joe Biden, a motivação do ataque frustrado. “A retórica deles está fazendo com que eu seja alvejado, quando sou eu quem vai salvar o país, e são eles que o estão destruindo – tanto por dentro quanto por fora”, disse Trump.

Fato é que ele se mune de lei bicentenária quando há interesse em arrecadar fundos para suas campanhas e eleitores. A tal Segunda Emenda à Constituição dos Estados Unidos, a que todos os armamentistas norte-americanos recorrem por legitimidade, é uma lei aprovada em dezembro de 1791 e que “protege o direito da população e dos policiais de garantia a legítima defesa, seja por meio de manter ou portar armas ou qualquer equipamento”.

Na primeira eleição de Trump, em 2016, o principal grupo de doadores de sua campanha foi a National Rifle Association (NRA), que defende porte tanto para caça quanto para autodefesa, com US$ 30 milhões.

Agentes cercam local onde o suspeito foi visto por meio de cano de rifle nos arbustos (Crédito:Lynne Sladky)

Nos oito anos desde então, Donald Trump só titubeou uma vez em relação a controle mais rigoroso de armamentos.
Foi em 2018, quando um assassinato em massa em Parkland, na Florida, que ficou conhecido como o Massacre da Stoneman Douglas High School matou 17 pessoas, no tiroteio mais mortal em escola do ensino médio nos EUA.
Na ocasião, ele chegou a sugerir verificação de antecedentes para imposição de restrição de porte a pessoas com problemas de saúde mental.
Mas logo ele viu uma chance de acenar aos fiéis doadores e sugeriu armar os professores para “aumentar a segurança nas escolas”.
No seu mandato, ele revogou medida implementada durante o governo de Barack Obama que proibia acesso a armamento a quem possuísse deficiência mental grave, era beneficiário da Previdência Social e incapazes de gerenciar finanças pessoais.

Outro lado

A atual vice-presidente e candidata à cadeira principal na Casa Branca em novembro, Kamala Harris, tem posição divergente e defende controle mais rígido sobre a posse. Na California, quando foi procuradora-geral do estado, ela apoiou medidas como a proibição de armas de assalto, verificações de antecedentes para compradores e a restrição ao porte por indivíduos com problemas de saúde mental e histórico de violência doméstica.

Ryan Routh é detido durante fuga. Ele possui várias condenações na Justiça (Crédito:Martin County Sheriff’s Office via AP)

Nas contas de campanhas, as armas carregam tanta atenção quanto os famosos estados pêndulo, aqueles que são disputados eleitor por eleitor, pois o favoritismo é incerto entre democratas e republicanos.

Os índices armamentistas norte-americanos são irrefutáveis.
Os EUA são a nação mais equipada do planeta, com 393 milhões de armas espalhadas pelo país.
Isso significa 120,5 para cada 100 habitantes – 40% das residências familiares possui pelo menos uma.
Em comparação, os norte-americanos são 19 vezes mais armados do que os franceses e 33 vezes mais do que os australianos, entre cidadãos de países ricos.

Tal quantidade de munição tem consequência óbvia: o número de mortos de maneira violenta. São em média 48 mil pessoas assassinadas por arma de fogo no país a cada ano.

O número de tiroteios em massa (quando quatro ou mais pessoas são feridas ou mortas) não diminui significativamente.
Em 2022, ano que foi o mais violento em um quarto de século no país, aconteceram 645 tiroteios do tipo. Em 2023, aconteceram 627.
Mesmo assim, o percentual de cidadãos que apoiam maior regulamentação para posse não forma maioria esmagadora, oscilando entre 60 e 65%.

Se a restrição fosse maior, casos como o de domingo seriam mais raros. O suspeito, que fugiu depois que os agentes de segurança de Trump viram um cano de rifle no meio de arbustos, a cerca de 450 metros do candidato, tem longo histórico de problemas com armas. Ryan Wesley Routh, de 58 anos, ficou de tocaia no local por quase 12 horas, das 2h da madrugada até 13h30, segundo registros de seu aparelho celular. Há 22 anos, ele foi condenado por posse de metralhadora automática, tida como arma de “morte e destruição em massa”.

Em 2010, foi novamente sentenciado por acusações de roubo. Nove anos depois, foi denunciado ao FBI por posse de armamento perigoso, e há pouco tempo, foi para a Ucrânia e tentou recrutar voluntários para lutarem contra a invasão russa no país.