Camiseta branca, a versatilidade sedutora que não sai de moda
Camiseta que nasceu como underwear se torna símbolo de rebeldia e independência feminina ao longo dos anos. Ao vestir personagens do cinema, perpetua caráter de peça versátil, que transmite poder e sensualidade
Por Ana Mosquera
Quem nunca utilizou uma camiseta branca na vida que atire a primeira pedra. Do guarda-roupas de operários aos de astros do rock, como Elvis Presley, o item já representou a independência feminina, foi símbolo de rebeldia e virou objeto de desejo ao vestir personagens do cinema mundial. Foi o que Ellen Mirojnick abordou em um artigo recente para o The New York Times. Figurinista de produções recentes como o vencedor do Oscar Oppenheimer e a série Bridgerton, também vestiu, no passado, Glenn Close, em Atração Fatal, e Keanu Reeves, em Velocidade Máxima, com a peça-chave.
A comprovar por Marlon Brando em Uma rua chamada pecado, James Dean em Juventude Transviada, Kevin Bacon em Footloose e Jeremy Allen White na atual série The Bear, não restam dúvidas de que cada um que veste a tal camisa esteja fadado a algum tipo de sedução — seja pelo fato de salvar passageiros de um ônibus desgovernado ou por enfrentar uma cidade inteira em nome do direito de dançar. “Ela está ligada à sensualidade por estar junto à pele, pela transparência e por, antes de tudo, ter sido considerada uma underwear”, diz Silvia Scigliano, professora do Curso de Consultoria de Imagem e Coolhunting do Istituto Europeo di Design São Paulo.
Muitas Tramas
• É como roupa de baixo que a camiseta neutra começa sua história ainda no Antigo Egito, época em que parecia uma túnica e se alongava até os joelhos.
• Quando já havia se firmado como uniforme de trabalhadores e marinheiros, no início do século XX, é que a estilista francesa Coco Chanel inseriu a peça no vestuário feminino, de modo a transmitir elegância.
“A moda é releitura e homenagem”, diz a consultora de imagem Silvia Henz. Ela cita como a observação de pessoas e grupos sociais ditam as tendências. “Theodore Roosevelt quis fazer parte da ‘vibe’ local usando um chapéu Panamá, em visita à construção do Canal naquele país. Os gringos vêm para o Brasil e usam Havaianas.”
Assim como essas peças, a calça jeans dos trabalhadores das minas e a jaqueta de couro dos pilotos de avião, a camiseta branca é representativa do movimento conhecido como trickle up (ou gotejamento para cima). “Ele acontece quando a tendência surge em uma subcultura ou nas classes mais baixas e sobe para a elite”, diz Scigliano.
Superadas as décadas de oscilação social, o item não perdeu a característica de ser básico — um aliado diário da população em geral — e versátil, quando combinado a roupas e acessórios mais ousados. “Ele tem a função de ‘aliviar’ a informação de um look carregado de muitas estampas e texturas, mas também é perfeito para um visual despretensioso, pois dá um ar de despreocupação”, diz Henz.
As possibilidades que a camiseta branca permite surpreendem. Se na Semana de Moda da moderna Nova York fashionistas combinaram a peça com alfaiataria, jeans e outras cores neutras, como bege e preto, no mesmo evento da área na capital dinamarquesa — conhecida pelo minimalismo —, ela dividiu espaço com brilhos, em estilos arrojados.
Em seu artigo de opinião, a figurinista Ellen Mirojnick compara a camiseta à tela em branco do cinema: “Podemos projetar nela quaisquer que sejam nossos sonhos”. No livro Vento Vazio, da escritora mineira Marcela Dantès, o personagem Miguel encontra poesia na roupa comum, recém-pendurada no varal: “É bonita a camisa nova branquinha, e branco é uma cor tão bonita que parece que faz carinho no olho da gente”.