Brasil vira polo de turismo médico e atrai milhões de dólares
Excelência em vários setores, tecnologia de ponta, atendimento humanizado e preços competitivos, se comparados aos dos países ricos, atraem estrangeiros e brasileiros que vivem no exterior para tratamentos no País
Por Maria Ligia Pagenotto
Preços competitivos, qualidade no tratamento, bons profissionais, atendimento humanizado e infraestrutura. Esses motivos, por ordem de importância, transformaram o Brasil em um dos destinos importantes para a prática do chamado turismo médico internacional. Esse mercado movimenta US$ 100 bilhões (R$ 561,2 bilhões) anuais no mundo e está em plena expansão. De acordo com o Medical Tourism Association (MTA), organização americana criada em 2007 para agregar empresas do setor, ele cresce em torno de 15% ao ano – e até 25% em algumas especialidades. Na América Latina, estimam os especialistas da MTA, ele movimentou US$ 7 bilhões (R$ 39,3 bilhões) em 2022.
A cidade de São Paulo, com seus centros de excelência, concentra a maior quantidade de turistas da saúde. Eles chegam para se submeter a cirurgias variadas (ortopédicas, bariátricas, estéticas) e a tratamentos complexos (oncológicos, neurológicos e cardíacos). O Hospital Sírio-Libanês, um dos mais qualificados do País, realiza em média 14 mil atendimentos internacionais por ano. “Esperamos fechar 2024 com um número ainda maior”, revela o gerente de Relações Internacionais e Corporativas Felipe Kaneno.
Para oferecer mais conforto aos pacientes, familiares e acompanhantes que atravessam fronteiras, o Sírio inaugurou, em abril, um escritório de recepção e encaminhamento no Aeroporto Internacional de Guarulhos.
Outro hospital top de linha, o Albert Einstein, também em São Paulo, dispõe de uma equipe exclusiva voltada a pacientes estrangeiros desde 1998. O acolhimento é feito nas línguas nativas dos clientes. “Oferecemos suporte sobre documentações e apoio para a realização de tratamentos”, explica o médico Eliezer Silva, diretor executivo de Sistemas de Saúde. Nos últimos cinco anos, houve um aumento médio de 35% no volume de pacientes estrangeiros que buscaram a excelência da estrutura e dos profissionais do Einstein.
Interessados no nicho, os gestores do Hospital Alemão Oswaldo Cruz lançaram recentemente um manual, em inglês e espanhol, com orientações sobre exames, cirurgias e consultas para estrangeiros. A publicação traz dicas de serviços como hotéis e casas de câmbio. “Fechamos uma parceria com uma empresa de saúde do Paraguai e passamos a ter muita procura”, diz o gerente de Inteligência de Dados e Negócios, Douglas Felipe.
“Esse mercado tem muito a crescer. Deveria ser sancionado e patrocinado pelo próprio governo. Gera muito dinheiro.”
Valéria Salles, coordenadora do Núcleo Internacional da Amil
A Rede D’Or , com 75 unidades no País, interna cerca de 1,1 mil estrangeiros por ano e atende mais 1,8 mil em emergências e áreas de exames. “No nosso setor Rede Star, esses atendimentos chegam a representar até 5% da receita anual”, contabiliza Jamil Muanis Neto, vice-presidente comercial da rede.
Definitivamente, não é pouco. “Essa é uma indústria gigantesca, que movimenta muitos dólares no mundo”, aponta Valéria Salles, médica coordenadora do Núcleo Internacional da Amil, presente em 11 hospitais no Brasil. O mercado, acrescenta ela, ainda tem muito a crescer e deveria ser sancionado e incentivado pelo governo.
Na rede Amil, o tratamento a estrangeiros é voltado a situações de emergências. “Fazemos todo o atendimento, do contato com a seguradora ao processo de retorno do paciente ao seu país em condição de segurança após a alta”. A empresa fez 65 repatriações para cinco continentes em 2024.
Marca da Hospitalidade
Brasileiros que vivem no exterior também se beneficiam dessas estruturas. A psicanalista Thatiana Redrado e o marido, Eduardo Nogueira, moram há mais de dez anos no exterior, mas desembarcam no País ao menos uma vez por ano para fazer check-up. Hoje vivem na Inglaterra. “A saúde fora do País é mais imediatista”, explica ela. “Se você tiver uma emergência será bem atendido, mas se precisar de um tratamento eletivo ou acompanhamento preventivo, vai esbarrar em dificuldades”.
Nogueira busca o País também para um acompanhamento com a nutróloga Ana Luisa Vilela. Há mais de 15 anos à frente de um consultório em São Paulo, Ana é procurada por estrangeiros e brasileiros que moram no exterior e querem envelhecer bem. “Eles buscam aqui uma abordagem preventiva”, conta a médica. Seus principais clientes estrangeiros são americanos, europeu e angolanos. “Faço tratamento humanizado. Isso lá fora é raro e caro”.
Quando estava na Itália, Thatiana precisou passar por uma cirurgia e escolheu fazer o tratamento no Brasil. Sua opção se deu por base em critérios afetivos, mais do que técnicos. “Em um momento de vulnerabilidade é importante ser bem acolhida e estar com quem partilha com você a mesma cultura”, afirma.
Esse vínculo humanista é bastante estimulado nos hospitais de ponta e se consolidou como a cereja do bolo do turismo médico no Brasil, somado à qualidade dos especialistas e à alta tecnologia. “O cuidado humanizado faz a diferença quando comparamos o serviço prestado no Brasil aos de outros lugares. O paciente se sente acolhido, mesmo distante de seu país”, pontua Kaneno, do Sírio-Libanês. São momentos em que a fama de um Brasil hospitaleiro se dá na prática e contribui para melhores resultados na recuperação do paciente.