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Lula passa cachimbo da paz entre caciques da Câmara e do Senado. Vai dar certo?

Crédito: Roque de Sá

Lula, Pacheco e Lira: ministérios podem ajudar lideranças em votações de pautas de interesse do Planalto (Crédito: Roque de Sá)

Por Marcelo Moreira

RESUMO

• Na costura de um pacto para melhorar a governabilidade, presidente Lula acena com ministérios para Arthur Lira e Rodrigo Pacheco
• Ele quer futuros chefes na Câmara e no Senado que sejam palatáveis ao Planalto
• E que não coloquem obstáculos aos temas de interesse do governo

Um grande acerto político que promete resolver quase todos os problemas. Para garantir a tranquilidade nas votações do Congresso e ajudar a manter a boa relação com as principais lideranças parlamentares, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva agiu intensamente na busca de um amplo acordo que permita que os caciques da Câmara dos Deputados e do Senado mantenham sua influência. A contrapartida? Atuar com mais ênfase nas pautas de interesse do governo. O acordão que está sendo negociado passa por promessas de vaga no ministério e atuação para que não ocorram grandes mudanças nas regras de aplicação das chamadas “emendas impositivas” do Orçamento.

● O entendimento que envolve Lula, Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara dos Deputados), e Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado, tem ligação direta com as decisões recentes do Supremo Tribunal Federal (STF) que exigem mais transparência no mecanismo de definição das emendas e com as dificuldades inesperadas de Lira para fazer o seu sucessor na presidência da Casa.
● Também mira um entendimento para encaminhar alianças mais robustas na eleição presidencial de 2026, na qual Lula deverá ser candidato à reeleição.
● Se concretizado, o acordo será o desfecho de uma sequência longa de entreveros entre Congresso e Planalto desde o final do ano passado, entremeados por decisões da Suprema Corte que foram consideradas interferências no funcionamento do Parlamento.

Após idas e vindas, com atritos severos com o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, Lira baixou o tom e percebeu que precisaria de Lula para manter a sua influência na Câmara. Experiente, o presidente se dispôs a ajudar nas iniciativas de Lira para, em troca, ter mais tranquilidade ao apresentar as pautas de interesse do governo. A troca de afagos recentes envolve uma promessa de vaga no ministério para Lira e outra para Pacheco. Com isso, os parlamentares fariam seus sucessores no comando das Casas Legislativas e o governo teria uma influência maior no Parlamento.

No varejo, a questão mais premente é a sucessão na presidência da Câmara.
Lira sonhava em colocar na cadeira o deputado Elmar Nascimento (União-BA), liderança ativa do Centrão e pessoa de sua confiança.
Entretanto, não contava com a resistência de Lula e de boa parte dos colegas da Câmara.
O Planalto identificava o pretendido como uma liderança identificada demais com a oposição e mais independente que o desejado.
A atuação de Lula esvaziou o nome de Nascimento e descartou outro candidato, o paulista Marcos Pereira, presidente do Republicanos. Ele desistiu da disputa e deve ser recompensando pelo governo de alguma forma.

Sem opção e caminhando para um impasse, Lira e os principais nomes do Centrão chegaram a um nome de consenso. Hugo Motta (Republicanos-PB) agrada a Lula e poderia ter o seu apoio, segundo declarou Marcos Pereira em discurso na noite de terça-feira 3.

Como candidato de consenso, Motta praticamente recebe a chancela de principal candidato à presidência da Câmara, e sem grandes objeções do mundo bolsonarista. No Senado é dada como certa a eleição de Davi Alcolumbre (União-AP), ex-presidente da Casa e com total apoio de Pacheco.

Sucessão desimpedida

As intensas negociações provocaram reações diversas entre os parlamentares. Os governistas ressaltam a busca pela governabilidade e a habilidade de Lula em buscar um “entendimento amplo” para tramitação mais serena das pautas de interesse do Planalto. A oposição reclama da virada de jogo que rifou Nascimento e diz que Lira não teve pudores de mudar de posição em troca da promessa de um ministério.

O movimento também isola Antonio Britto (PSD-BA), outro postulante à presidência da Câmara. União e PSD, com ministérios no governo, planejam manter candidaturas na expectativa de obter algumas vantagens, como explicou um parlamentar que pediu para não ser identificado.

Em relação às emendas impositivas, o governo também ganhou fôlego para dar as explicações necessárias ao STF e, ao mesmo tempo, tentar uma solução com o Congresso para atender às necessidades de transparências exigidas pela Corte.

O STF estendeu em mais alguns dias o prazo para que a CGU (Controladoria Geral da União) esclareça a tramitação das emendas e informe o estágio atual das obras ou ações financiadas. Também deve informar os procedimentos de rastreabilidade, comparabilidade e publicidade adotados. Após a entrega do relatório pela CGU, a Câmara, o Senado e o autor da ação, o PSOL, terão prazo de dez dias para se manifestar.

Hugo Motta: nome de consenso do Executivo e Legislativo (Crédito:Zeca Ribeiro)

O herdeiro de Lira?
Admirado por sua astúcia, Lira pode facilitar o caminho para o jovem deputado Hugo Motta

Esperto e ardiloso, Arthur Lira ganhou poder nos últimos anos, principalmente pelo controle e manipulação do Orçamento. Tornou-se o Todo-Poderoso da Câmara dos Deputados e agora faz de tudo para escolher seu sucessor. Lira surpreendeu a todos ao indicar o jovem deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) como seu herdeiro.
Descartou sem pena Elmar Nascimento e bancou a ascensão de Motta, político com bom trânsito no Parlamento.
Ligado ao ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, afastado e preso por corrupção, Motta é maleável e de fácil adaptação.
 Tem apenas 34 anos, mas se elegeu deputado federal aos 21, aproveitando uma longa linhagem de políticos paraibanos.
Foi filiado por anos ao MDB, mas migrou para o Republicanos em 2018.
Se vencer o pleito, será o mais jovem presidente da Câmara, superando Luis Eduardo Magalhães, eleito aos 39.