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A guerra dos coronéis: PT e PDT se engalfinham pela prefeitura de Fortaleza

A disputa pela prefeitura de Fortaleza esquentou com acusações de coronelismo entre grupos políticos que dominam o estado. Para provocar o PT, Ciro Gomes aceitou até mesmo apoiar bolsonaristas contra os lulopetistas

Crédito: Márcia Foletto

No vale-tudo contra o PT, Ciro Gomes percorre o interior do Ceará e bairros da capital dando apoio a bolsonaristas e acenando a antigos desafetos (Crédito: Márcia Foletto)

Por Marcelo Moreira

Do isolamento ao desespero de um lado; da revolta e preocupação, de outro, os adversários do PT em Fortaleza (CE) estão recorrendo a denúncias de que os petistas estariam adotando práticas do “coronelismo” para abusar na “cooptação e assédios” a políticos de outros partidos para enfraquecer a candidatura do atual prefeito, José Sarto (PDT), que busca a reeleição com o apoio de Ciro Gomes. Ex-governador e ex-candidato a presidente da República, ele perdeu bastante espaço no estado, principalmente após ter rompido com o irmão, o também ex-governador Cid Gomes, e vem entrando em rota de colisão com os petistas. No passado recente, era o PT que acusava Ciro de ser o coronel do estado.

A disputa pela prefeitura de Fortaleza é vista pelo PT e pelo presidente Lula como um dos grandes trunfos dessa eleição, já que, ao lado de Teresina (PI), é uma das capitais onde o partido tem grandes chances de vitória.

O governador Elmano Freitas e o ministro da Educação, Camilo Santana, outro ex-governador, são as maiores lideranças petistas no Ceará e elaboraram uma intrincada estratégia política para as próximas eleições, que inclui o convite ao presidente da Assembleia Legislativa, Evandro Leitão, para trocar o PDT pelo PT para ser o candidato deste a prefeito da capital.

O movimento irritou Ciro, mas também a muitos petistas, como aqueles que integram o grupo político da ex-prefeita Luizianne Lins, que pretendia a vaga.

O ministro Camilo Santana (à esq) e o governador Elmano de Freitas são os artífices da estratégia petista para vencer em Fortaleza (Crédito:Divulgação )

A poderosa movimentação petista levou Ciro a buscar apoio nas hostes bolsonaristas, algo impensável tempos atrás.

Ciro elegeu o PT como o grande inimigo de seu esvaziado grupo político e culpa o PT e Lula pelas manobras atuais e também por um suposto “torpedeamento” de suas candidaturas a presidente desde 2018.

Em uma convenção política na cidade de Crato, no interior do Ceará, Ciro Gomes anunciou o apoio ao partido União Brasil local, que tem também o endosso do ex-presidente Jair Bolsonaro.

A postura adotada por Ciro, de “vale tudo contra o PT”, foi vista com deboche em Fortaleza, mas que começa a preocupar as lideranças petistas.

“Estamos sendo submetidos a uma espécie de ditadura”, disparou o ex-candidato presidencial pelo PDT. “O Ceará está sendo destruído pela incompetência, pela corrupção, pelo mandonismo. Há uma ditadura tentando ser construída, tirando os direitos das pessoas de escolher suas candidaturas. Tudo armado para que o novo ditador do Ceará não tenha sequer contrastes”, afirmou Ciro em discurso em apoio ao ex-deputado estadual Aluísio Brasil (União), candidato à prefeitura do Crato, insinuando que o “ditador” seria Camilo Santana.

Observadores do cenário político local já identificam um aceno de Ciro e seu grupo para uma eventual união em um hipotético segundo turno para a prefeitura de Fortaleza com candidatos ligados a Boslonaro. O PL, do ex-presidente, apoiará como seu candidato André Fernandes, de apenas 26 anos, mas a candidatura da direita que desponta com mais chances é Capitão Wagner (União), que aparece com maiores índices de vitória nas pesquisas em disputa acirrada com o prefeito José Sarto (PDT).

Mudança sentida

Sarto não engoliu a debandada de Evandro Leitão para o PT, mas vinha sendo comedido nos ataques às práticas petistas. Decidiu mudar de tática no fim de julho, quando voltou as baterias contra o partido de Lula.

Não teve pruridos em qualificar a movimentação do PT como “um novo coronelismo”, alinhando-se ao discurso de Ciro Gomes. Em declarações recentes, Sarto acusou o governador Elmano de Freitas de retornar ao coronelismo, denunciando uma conivência com o crime organizado e a falta de espaço para opiniões divergentes na política. Segundo ele, Lula teria culpa neste cenário: “Ele não faz autocrítica e estimula a polarização política que prejudica o desenvolvimento do país, levando a uma dogmatização da política cearense”.

O discurso de Sarto segue a mesma cartilha do candidato Capitão Wagner, a principal aposta do bolsonarismo em Fortaleza. Os dois miram a gestão de Elmano de Freitas, que enfrentou picos de aumento de violência urbana desde 2023, e a influência do ministro Camilo Santana. São apontados pelos candidatos como os líderes da “volta do coronelismo”. Essa ”coincidência” de discursos ressalta uma outra curiosidade na campanha local: Wagner e Ciro são desafetos históricos, mas estão agora, oportunisticamente, do mesmo lado nos ataques ao PT. Como Ciro apoia Sarto, está se colocando em uma situação que pode causar constrangimentos durante a campanha.

Os petistas mais radicais começaram a revidar, lembrando do domínio político que Ciro Gomes e seus aliados impuseram ao estado nas últimas décadas, mas estão sendo obrigados a amenizar o tom dos ataques por conta de um fator importante no cenário atual: Cid Gomes, o irmão de Ciro, é hoje um dos maiores aliados do PT no Ceará, sendo o principal articulador da ida de Evandro Leitão para o PT – e também de alguns deputados estaduais, prefeitos e vereadores de várias cidades do interior cearense.

O cientista político Cleyton Monte, professor da Universidade do Ceará (UFC), entende que a movimentação de Ciro é consequência dos problemas políticos que ele enfrenta no estado desde 2022, quando rompeu com irmão Cid e com familiares, que dominam a cidade de Sobral, seu berço político. “Essas divergências políticas o fizeram perder espaço no Ceará e o PT, que governa o estado desde 2014, é a grande força do momento. Ciro vai antagonizar o PT para se manter politicamente relevante.”