Comportamento

Substâncias perigosas: os riscos dos tratamentos estéticos sem fiscalização

Duas mortes em procedimentos estéticos envolvendo PMMA e fenol inflamam o debate sobre a proibição de venda desses produtos e a necessidade de aumentar o rigor na fiscalização de clínicas de tratamento de beleza

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PMMA: produto utilizado em situações de restauração óssea (Crédito: Divulgação )

Por Marcelo Moreira

A busca da “beleza perfeita” está levando as pessoas a, cada vez mais, relativizar os riscos de morte. É dessa forma que especialistas em estética e cirurgia plástica observam a explosão de oferta de tratamentos diversos, num mercado em expansão e com dificuldades na fiscalização rigorosa no que é oferecido. Duas mortes recentes em clínicas de tratamento estético — uma em São Paulo e outra em Goiânia — recolocam sob os holofotes os serviços a preços abaixo do mercado, que fazem vítimas ao supostamente colocar à disposição o que há de mais moderno no embelezamento pessoal.

O empresário Henrique Chagas morreu em um estabelecimento que não tinha autorização para trabalhar com fenol (Crédito:Divulgação )

O problema é que não há consenso nem mesmo entre os médicos a respeito de como proceder em relação aos tratamentos realizados com produtos considerados perigosos, cuja manipulação só deveria ser feita por profissionais altamente especializados. É essa a questão de fundo que opõe atualmente o Conselho Federal de Medicina (CFM) e o Conselho Regional de Medicina (Cremesp) sobre o uso do polimetilmetacrilato, o chamado PMMA, substância utilizada no preenchimento corporal.

“Não recomendamos usar o PMMA para fins estéticos. É indicado para restauração óssea.”
Alexandre Kataoka, do Cremesp

O Cremesp enviou à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) uma notificação solicitando a proibição da venda do PMMA em todo o País. Antes disso, havia solicitado a mesma medida sobre a comercialização de produtos que usam o fenol para procedimentos estéticos.

As duas ações irritaram o CFM, que enviou ofício ao conselho paulista solicitando a suspensão dos dois pedidos à Anvisa, que ainda analisa os casos. A alegação inicial é de que tais medidas são da alçada do CFM, por se tratarem de assuntos de âmbito federal.

No fundo, ainda há uma divergência entre as entidades na maneira de tratar o uso das duas substâncias, vendidas livremente pela internet e manipuladas por profissionais sem a qualificação necessária na aplicação de tratamentos estéticos.

O problema mais recente ocorreu em Goiânia no começo de julho e vitimou a modelo e influencer digital Aline Ferreira da Silva, de 33 anos. Ela morreu depois de se submeter a um procedimento para aumentar os glúteos na clinica Amese.

A Polícia Civil investiga se a clínica estava habilitada a realizar a intervenção e prendeu a dona do estabelecimento, a empresária Gracielly da Silva Barbosa.

Em junho, em São Paulo, o empresário Henrique Chagas morreu ao passar por um tratamento no rosto, o peeling de fenol, na clínica Studio Nathalia Becker.

Laudo da polícia técnico-científica do Instituto Médico Legal (IML) concluiu que o empresário morreu por uma “parada cardiorrespiratória” causada por um “edema pulmonar agudo” ao inalar fenol.

• Nathalia Becker não possuía qualificação para fazer o procedimento, assim como sua clínica não tinha autorização para tal.

“Parada cardiorrespiratória causada por edema pulmonar agudo ao inalar fenol.”
Laudo do IML sobre a morte de Henrique Chagas

Qualificação

Oficialmente, CFM e Cremesp evitam divulgar informações sobre os pedidos de proibição dos produtos. À Anvisa, o CFM informou que está fazendo consultas na Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) e na Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) para obter mais informações sobre a aplicação do PMMA, sobretudo para fins estéticos.

Anteriormente, a SBCP informou que não recomenda o uso do produto para fins estéticos, por conta do risco de efeitos colaterais como necroses, cegueira e embolias, que podem levar à morte.

Aline Ferreira da Silva, 33 anos, era modelo e infuencer digital. Morreu em uma clínica em Goiânia (Crédito:Divulgação )

O médico Alexandre Kataoka, diretor de comunicação do Cremesp, alerta que tanto o fenol como PMMA são produtos que só devem ser manuseados e manipulados por profissionais habilitados. “No caso do fenol, que é volátil e pode causar graves problemas pulmonares, é preciso que os locais que ofereçam tratamentos com o produto tenham recursos para fazer a recuperação do paciente em caso de problemas. E isso só é possível se houver um médico no local.”

“Fenol é volátil e pode causar graves problemas pulmonares.”
Alexandre Kataoka, do Cremesp

No caso do PMMA, ele ressalta que é orientação do Cremesp não recomendar o uso para fins estéticos. “É um produto muito utilizado em situações de restauração óssea.”

Kataoka diz que o consumidor precisa ser rigoroso na escolha do local e do profissional quando decidir se submeter a procedimentos estéticos. “O site do Cremesp permite fazer uma busca por médicos e empresas. Lá estão as informações sobre as qualificações de ambos. Também é possível ligar para as Vigilâncias Sanitárias municipais para obter essas informações.”