Grafite no museu: dupla Osgemeos expõe sua street art na capital americana
Após conquistar o público e a crítica com murais espalhados pelo mundo, Osgemeos, expoentes brasileiros da Street Art, exibem suas obras no renomado Smithsonian Museum, nos EUA
Por Felipe Machado
Os irmãos Gustavo e Otávio Pandolfo nasceram e cresceram no bairro paulistano do Cambuci. A região predominantemente residencial, de classe média, sem arranha-céus e com muitos sobrados e galpões abandonados, foi o ambiente perfeito para o passatempo da dupla de gêmeos: colorir os muros com sprays de tinta. O desenho, no entanto, não foi a primeira incursão dos adolescentes pelo mundo artístico. É possível dizer que aprenderam aquela linguagem por acaso — o estímulo inicial era o amor ao hip-hop e ao break, dança em que os dois arriscavam passos coreografados nas festas diante da turma de amigos. O gosto pelo estilo os levou a se apaixonar por Beat Street e Breaking, filmes de 1984 que retratavam a cena emergente de Nova York. Os gêmeos do Cambuci viram que a tribo da qual sonhavam participar tinha um correspondente visual: o grafite. Desde então, Osgemeos se tornaram um dos expoentes da chamada Street Art, que nasceu no final dos anos 1970 nas periferias de metrópoles norte-americanas como Nova York e Chicago.
Embora tenha surgido nas ruas, a Street Art ganhou o reconhecimento da crítica e teve o seu mérito artístico reconhecido. Artistas como Keith Haring, Jean Michel-Basquiat e, mais tarde, Banksy, viraram referência para o mundo das artes por obras que dialogam tanto com as áreas externas quanto com ambientes fechados dos museus.
Depois de fazerem sucesso com murais e painéis espalhados pelo mundo, Osgemeos chegam ao apogeu: o Instituto Smithsonian, uma das organizações culturais mais importantes do mundo. Endless Story (História sem fim) é a primeira exposição dos brasileiros em um museu nos EUA. A mostra ocupará um andar inteiro e também os jardins do Hirshhorn Museum, uma das alas do Smithsonian na capital Washington, D.C.
Mundo de Tritrez
Não será a única mostra da dupla em solo americano: estarão em cartaz também com Cultivating Dreams (Cultivando Sonhos) na galeria Lehmann Maupin, em Nova York, até 16 de agosto. Ali exibirão 13 novas pinturas e uma instalação imersiva que conduzirá o público em uma visita virtual ao “mundo de Tritrez”, como batizaram o universo urbano habitado pelas figuras amarelas que se tornaram sua marca registrada.
Apesar de terem vindo do grafite e da arte de rua, os curadores viram o trabalho de Osgemeos de maneira mais formal, como escultores, pintores e contadores de histórias. “Eles têm o talento para ocupar tanto as ruas quanto a galeria”, afirmou o curador David Maupin ao jornal The New York Times. “Não consigo pensar em muitos artistas que conseguiram ocupar ambos os mundos.”
Osgemeos não são os únicos brasileiros a se destacaram mundialmente no grafite. Eduardo Kobra, que também possui obras espalhadas por todo o mundo, de Abu Dhabi a Tóquio, acaba de inaugurar um enorme mural na cidade de Saint-Ouen, nos arredores de Paris, base do Comitê Olímpico do Brasil durante a Olimpíada que terá início no final de julho.
O trabalho de Kobra ainda não foi parar no museu, mas a influência de um dos maiores pintores franceses já pode ser vista em seu trabalho: o mural ‘A Voz da Liberdade’, que traz a inscrição Somos Nossos Próprios Heróis, foi inspirado no famoso quadro A Liberdade Guiando o Povo — a criação de Eugène Delacroix, datada de 1830, é uma das maiores atrações do Museu do Louvre.
Keith Haring, o pioneiro
Pioneiro no grafite, o nova-iorquino Keith Haring revolucionou a arte de rua e trouxe credibilidade ao movimento. Ao lado de Jean-Michel Basquiat, pupilo de Andy Warhol, ele ajudou a transformar o grafite em uma escola artística reconhecida e respeitada. Surgido na vibrante cena de Nova York do início dos anos 1980, Haring criou imagens icônicas que logo foram parar nas estampas de camisetas e produtos.
Ao abordar temas sociais e políticos, como a conscientização sobre a AIDS e os direitos LGBTQIA+, usou sua popularidade para levar esses assuntos, ainda marginais na época, para as manchetes. Suas obras, vistas em estações de metrô e prédios abandonados, tiveram impacto na sociedade e hoje são exibidas em museus e galerias — onde são avaliadas em altos valores.