Geral

Democrática e terapêutica, corrida vira febre entre os que buscam bem-estar

A atividade física mais acessível não para de ganhar adeptos desde o pós-pandemia. Atletas amadores correm atrás de socialização, rotina, saúde física e mental

Crédito: Marco Ankosqui

A treinadora Juliana Vieira afirma que as pessoas buscam treinar para alcançar a distância mínima das corridas de rua, de 5 km, e que após atingir essa distância, é inevitável pensar em percursos maiores (Crédito: Marco Ankosqui)

Por Bruna Garcia

Um par de tênis e motivação. Isso é o bastante para se iniciar na corrida, o mais democrático dos esportes. A atividade vem ganhando cada vez mais adeptos nos últimos anos, impulsionada pelas redes sociais e pelo pós-pandemia, que mudou a relação das pessoas com a saúde. Além de trazer benefícios como socialização, a prática cria rotina, turbina a imunidade e traz até maior controle emocional. Gráficos de busca no Google mostram um crescimento vertiginoso desde a metade de 2022, dado que acompanha o aumento de até 50% dos inscritos em provas de rua, principalmente para iniciantes.

A curva permanece apontando para cima e estima-se que hoje sejam 5 milhões os brasileiros praticantes. Em 2018, quando a EQ Performance Assessoria Esportiva foi fundada, em São Paulo, atendia 30 pessoas. Hoje, assessora 400 atletas de corrida e triathlon. “Observamos um crescimento grande na empresa e no mercado em geral a partir do segundo semestre de 2022”, disse Roy Siqueira, head coach da EQ.

A equipe tem atletas de todas as distâncias e níveis, e hoje os homens são 60% e as mulheres, 40%, de faixa etária média entre 35 e 45 anos. “O principal motivo por que as pessoas têm procurado nossos serviços, hoje, é a saúde em todos os aspectos, física, mental e emocional. Um ambiente em que você sai do virtual e tem uma conexão maior com o próprio corpo e emoções, que resulta em autoestima, felicidade, satisfação e acaba extrapolando para outras áreas da vida, além de ser um clima super saudável e social, onde se consegue fazer bons amigos”, disse Siqueira.

(Divulgação)

“Muitas corridas foram meu motivo de paz no meio de um monte de caos.”
Rafaela Morozetti, jornalista

O empresário e atleta Flávio Guimarães trabalha com treinamento de corredores há dez anos, quando fundou a equipe Super Time, em Brasília. No início, eram 10 atletas. Hoje, são 350 corredores na equipe, principalmente mulheres entre 30 e 45 anos. “Em 2022, a equipe dobrou de tamanho e desde então só cresce a cada mês”, disse Guimarães. O crescimento da procura pela corrida, para ele, acontece por ser um esporte acessível e porque as pessoas vêm buscando mais saúde e qualidade de vida, além da oportunidade de socialização.

O Super Time também tem um grupo de 30 corredores em São Paulo, entre o Museu do Ipiranga e o Parque Ibirapuera, gerido pela treinadora Juliana Vieira. No Ipiranga, há mais alunos da faixa dos 60 anos. “Uma aluna começou a treinar aos 62 anos, nunca correu, nunca fez atividade física. Depois de fazer a primeira prova de 5 km, não parou mais”, disse Juliana.

Já no Ibirapuera, a demanda está na faixa dos 23 a 35 anos. Para a treinadora, as pessoas vêm sendo motivadas umas pelas outras. “Os parques estão cheios e elas buscam treinar para alcançar a distância mínima das corridas de rua, de 5 km. Após atingir essa distância, é inevitável pensar em percursos maiores. É aí que entra a nossa orientação sobre o desempenho e o foco em melhorar capacidades, como o ritmo ideal, coordenação motora e movimento ideal”, disse.

Roy Siqueira, head coach da EQ, diz que o principal motivo por que as pessoas têm procurado a corrida é a saúde física, mental e emocional (Crédito:Divulgação )

“O importante é seguir uma linha de treinamento, fazer os ciclos e entender a corrida como algo que devolve resultados grandiosos no sentido físico, emocional e social”, disse Juliana.

Guilherme Celso, presidente da Associação dos Organizadores de Corrida de Rua e Esportes Outdoor (Abraceo), confirma o crescimento. “A procura por saúde no pós-pandemia aumentou, hoje é uma necessidade, houve uma mudança de mindset”, disse. “Logo após a pandemia, as provas com mais corredores eram as longas, meia maratona, 15 km, 10 km. Agora, são as provas de 5 km que têm o maior público. Isso mostra que tem muita gente nova iniciando no esporte”, declarou.

Redes sociais

O grande crescimento do número de influenciadores de corrida nas redes sociais, segundo ele, também contribui para levar mais pessoas a treinar. “Quase todo mundo que corre tem a prerrogativa de postar que correu. Parece que é uma lei, mostrar que correu. Isso acaba promovendo a saúde, não existe um biotipo nem uma idade melhor pra correr”, disse.

A nutricionista especializada em esporte Marcela Worcemann corre há 21 anos. A maioria de seus pacientes corre e ela vem acompanhando o crescimento da procura pela atividade. “Acho que vem aumentando por ser um esporte muito acessível. As redes sociais também deram uma alavancada nisso, as pessoas veem outras correndo, as provas, os grupos de corrida e dá essa sensação de comunidade, de conhecer gente. Mas é preciso tomar cuidado para a rede social não virar uma coisa competitiva, de comparação, para não pular etapas”, disse. Outro motivo é o barato da corrida.

“A vibe, a endorfina da corrida é diferente de todos os outros esportes. Eu nado, pratico outras atividades, mas o que você sente com a corrida é bem diferente e isso é muito gostoso, dá até uma viciada”, disse Marcela.

A jornalista Rafaela Morozetti começou a correr há um ano. No início, ela queria experimentar um novo exercício, e continua até hoje porque encontrou na corrida uma válvula de escape para a mente. “Parece muito clichê e talvez seja, mas a corrida me ajuda em todos os aspectos da vida. Superar os limites do meu corpo me dá a sensação de ser mais forte para superar os problemas da vida. Muitas vezes eu nem estou a fim de ir, mas muitas corridas já foram meu motivo de paz no meio de um monte de caos”, contou.

“O bacana da corrida é que, fora todas as endorfinas e serotoninas, dizemos que não é terapia, mas é terapêutico. A cada metro, a cada quilômetro, cada um com seu limite, conforme vai vencendo, a pessoa se autovalida”, disse Celso.