Brasil

Enfim, suas comprinhas no site chinês serão taxadas; saiba quanto

Crédito: Ton Molina

Haddad consegue vitória silenciosa no Congresso (Crédito: Ton Molina)

Por Mirela Luiz

RESUMO

• Depois de muita discussão e embates na Câmara, o Congresso aprovou o projeto de lei das ‘bugigangas’
• Parlamentares fizeram acordo com governo para cobrar taxa de 20% sobre importação de mercadorias do exterior de até US$ 50
• Lula era contrário à taxação – é uma medida impopular -, mas cedeu diante de um imposto pequeno

 

Nesta terça-feira, 28, a Câmara encerrou uma polêmica que colocou em rota de colisão os parlamentares e o presidente Lula, ao aprovar o projeto de lei que acabou com a isenção de impostos para compras internacionais em valores de até US$ 50. O presidente queria que os consumidores pudessem continuar comprando “bugigangas” de até R$ 250 em sites chineses como Shopee, Shein e AliExpress, sem taxação nenhuma, o que agradava aos brasileiros de baixa renda, mas os deputados, aliados dos empresários do comércio varejista, queriam que a taxa chegasse a 60% para que tivessem condições de competir com os produtos estrangeiros. Após um acordo entre Arthur Lira e Lula, o impasse terminou com a aprovação de uma taxa de 20% sobre essas vendas, estabelecendo-se um meio termo na queda de braço entre os dois.

Os debates sobre a taxação de compras internacionais vêm ocorrendo desde o ano passado e, mais recentemente, chegaram até a gerar um bate-boca entre parlamentares e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. A inclusão do fim da isenção para importações de até US$ 50 foi feita pelo relator do projeto, deputado Átila Lira (PP-PI), dentro de uma proposta do Governo que busca incentivar a indústria de veículos sustentáveis.

Inicialmente, o relator propôs a incidência do imposto de importação federal, que é de 60%.
Atualmente, as compras do exterior abaixo de US$ 50 são taxadas apenas pelo Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) estadual, com alíquota de 17%.
A mudança, por outro lado, não altera a isenção para viagens internacionais, que permite que quem viaje para fora do País compre uma variedade de produtos isentos de qualquer imposto no valor total de R$ 5 mil a cada 30 dias.

“Isso é uma injustiça social, o fato de viajantes terem isenção de até US$ 2000 por mês, enquanto quem não pode viajar e compra pela internet será taxado por comprar até US$ 50”, avalia Jackson Campos, especialista em Comércio Exterior.

fotos: Ton ; Lula Lopes/divulgação
Atila Lira (PP/PI) tem vitória parcial na ‘PL das blusinhas’ (Crédito:Câmara dos deputados)

O presidente da Câmara, Arthur Lira, se reuniu com o presidente Lula para discutir a proposta. O presidente havia manifestado sua posição contrária à taxação, mas se mostrou aberto a negociações. Parlamentares defendem a medida como forma de proteger a indústria nacional, e líderes do Congresso chegaram a considerar que, apesar de impopular, o fim da isenção era necessário para estimular o comércio interno.

Após semanas de negociação entre o governo e o Congresso, o relator chegou a um acordo e definiu a taxação, que conseguiu a aprovação em votação simbólica. Os detalhes finais foram acertados em reuniões entre a equipe econômica e os parlamentares.

“A taxação e a busca pela isonomia tributária permitem que o consumidor faça escolhas baseadas em suas preferências, levando em consideração todas as condições de mercado”, argumenta Fernando Valente Pimentel, diretor-superintendente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit).

Fernando Pimentel, diretor da ABIT, considera um avanço a taxação de 20% (Crédito:Lula Lopes)

Para Murillo Torelli, professor de Ciências Contábeis do Mackenzie, a isonomia tributária só será alcançada quando houver redução da carga tributária tanto para os produtos importados quanto para os produtos nacionais de baixo valor agregado, até o limite de US$ 50.

“Ao diminuir a tributação, haveria uma competição mais justa. Proteger demasiadamente um dos lados não auxilia no desenvolvimento e ainda pode causar distorções no mercado”, explica.

Na justificativa do projeto, Átila Lira afirmou que a isenção tem preocupado a indústria nacional e propôs a revogação dessa possibilidade de importação via remessa postal para evitar desequilíbrio fiscal em relação aos produtos fabricados no Brasil, que pagam todos os impostos e sofrem com a concorrência desleal de produtos isentos do exterior.

A medida seria referendada no Senado na sexta-feira, 31.

“Frente à decisão tomada na quarta-feira, a Shein vê como um retrocesso o fim da isenção, uma vez que as vendas nunca tiveram função arrecadatória. A decisão de taxar remessas internacionais não é a resposta adequada por impactar diretamente a população brasileira.”, manifestou-se a fabricante chinesa, em nota.

“Proteger demais um dos lados não auxilia no desenvolvimento e ainda pode causar
distorções no mercado.”
Murillo Torelli, professor do Mackenzie

Divergências

A plataforma de compras AliExpress informou que foi surpreendida com a decisão da Câmara dos Deputados. “Se convertido em lei, o fim da isenção impactará de forma muito negativa para a população brasileira, principalmente aqueles de classes mais baixas, que deixarão de ter acesso a uma ampla variedade de produtos internacionais a preços acessíveis. A decisão desestimula o investimento internacional”, declarou.

A Secretaria da Receita Federal informou que a manutenção da isenção para compras internacionais de até US$ 50 resultaria em uma perda potencial de arrecadação de R$ 34,93 bilhões até 2027.

“Neste sentido, entendo que a taxação de compras em sites internacionais deveria abranger compras de qualquer quantia”, declara o economista Ricardo Rodil.

O Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (CIESP) ainda considera injusta a decisão dos parlamentares. Para a entidade, mantém-se grande desigualdade tributária em relação à indústria e ao varejo brasileiro, resultando em concorrência desleal, que tem provocado queda de produção e perdas de postos de trabalho.

“No Brasil estamos sempre contando com migalhas, como esse pequeno avanço representado pela alíquota de 20%. Evitamos vergonhosamente atacar o problema em sua origem e em sua totalidade”, enfatiza Rafael Cervone, presidente do CIESP, afirmando: “Privilegiar empresas estrangeiras, que geram emprego, renda e impostos lá fora, não tem lógica alguma”.